segunda-feira, 2 de julho de 2018

OS HERDEIROS DOS CRIMINOSOS


Filhos de políticos hoje atrás das grades entram na campanha de olho nos espólios eleitorais dos pais. Verba eles têm. Resta saber o quanto que a herança política, maculada pela corrupção, vai atrapalhar

Se políticos de grosso calibre encontram-se atrás das grades, arrastados pela implacável Lava Jato, o mesmo não se pode dizer de seus rebentos. Livres e soltos, os filhos das “excelências” presas foram encarregados de garantir a manutenção do poderio político da família. Para cumprir a tarefa a contento, entraram de corpo e alma na campanha eleitoral deste ano – mesmo sob o risco de serem contaminados pela imagem manchada dos pais. Recursos para gastar no pleito eles têm. De sobra (não é difícil imaginar a origem). Encabeçam a fila Marco Antônio Cabral (MDB-RJ) e Zeca Dirceu (PT-PR), filhos de Sérgio Cabral e José Dirceu, respectivamente. Ambos são deputados federais e decidiram se candidatar à reeleição. A filha mais velha de Eduardo Cunha, a publicitária Danielle Dytz Cunha, integra o time. Será candidata pela primeira vez. Assim como o pai, ela se filiou ao MDB-RJ e disputará uma vaga na Câmara. É o quem vem sendo chamado nos bastidores de Brasília de a nova geração dos presidiários da Lava Jato.

Mesmo que não tenham sido condenados, não seria injustiça dizer que eles herdaram um DNA com inclinação para os malfeitos. Alguns foram investigados junto com os pais. Danielle Cunha, por exemplo, chegou a ser denunciada junto com Eduardo Cunha, acusada de ser beneficiária de uma conta na Suíça abastecida com propina destinada ao ex-presidente da Câmara. Segundo o Ministério Público Federal, ela teria gasto mais de US$ 40 mil em compras no exterior, entre 2012 e 2014, feitas em lojas de luxo, como Chanel e Prada. Na ocasião, ela negou envolvimento em atos ilícitos e disse ter apenas um cartão de crédito vinculado a uma das contas do pai na Suíça. O juiz Sérgio Moro acabou rejeitando a denúncia. Embora Danielle não possua experiência política e carregue a nódoa do pai preso, por incrível que pareça, ela se tornou uma das grandes apostas do MDB do Rio.

Fio de esperança

O padrinho do ingresso de Danielle ao partido foi Marco Antônio Cabral e é aqui que duas faces da mesma moeda se entrelaçam. O deputado federal Marco Antônio Cabral é presidente interino do MDB no Rio e filho do recordista de processos da Lava Jato, Sérgio Cabral. Como Danielle, Marco Antônio já trabalha ativamente em sua própria campanha. Neste caso, à reeleição. Em 2014, recebeu 119.584 votos. Neste ano, aliados reconhecem que será difícil repetir a marca. Mesmo assim, apostam em vitória nas urnas. Ele constitui o último fio de esperança para manter a relevância política da família Cabral. Aos 27 anos, insiste que Cabral não roubou dinheiro público, apesar da fartura de provas em contrário. Admite apenas que o pai errou ao “usar sobras de campanha para despesas pessoais”. Marco Antônio fala de cátedra sobre encrencas. É alvo de uma ação por atos de improbidade administrativa.

O MDB-RJ é pequeno para tanto rolo. Nas fileiras do partido há outro filho de investigado da Lava Jato tentando manter o nome da família no jogo. Trata-se do deputado federal Leonardo Picciani, ex-ministro do Esporte, filho do presidente afastado da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), Jorge Picciani. Jorge ficou cerca de quatro meses na cadeia, e desde março, cumpre prisão domiciliar em razão de problemas de saúde. É acusado, junto com outros deputados estaduais do MDB, de ter recebido propina para favorecer empresas de ônibus por meio da aprovação de projetos de lei na Alerj. Leonardo chegou a cogitar uma candidatura ao Senado, mas sabe que a prisão do pai poderia influenciar negativamente na campanha. Por isso, resolveu trilhar caminho mais modesto: a reeleição à Câmara. Depois da prisão de Jorge, Leonardo passou a atuar de forma mais ativa no diretório estadual.

Em nome do pai

Zeca Dirceu também ingressou cedo na política graças à influência do pai e se elegeu pela primeira vez na mesma época em que José Dirceu virou alvo do mensalão. Foi prefeito de Cruzeiro do Oeste, no Paraná, por dois mandatos consecutivos. Desde 2011, é deputado federal e tentará a reeleição em outubro. Assim como o pai, Zeca também foi investigado na Lava Jato. Ele respondia a dois inquéritos no Supremo que apuravam crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. Um deles foi arquivado em 2017. Outro ainda está em tramitação. Zeca foi citado por delatores da Odebrecht como beneficiário de propinas de R$ 850 mil.

Ainda no rol de herdeiros dos presidiários da Lava Jato figura Aline Corrêa, filha do ex-deputado Pedro Corrêa, delator hoje em prisão domiciliar. Ela já foi duas vezes deputada federal pelo PP-SP, mesmo partido do pai, entre 2011 e 2015. Depois de quatro anos submersa, resolveu disputar a próxima eleição. Agora, filiada ao PR de Pernambuco, onde concorrerá a deputada estadual. Aline terá o pai por perto durante a campanha. Pedro Corrêa, também preso no mensalão, mora em Recife. Aline também está familiarizada com as páginas policiais, Em novembro de 2017, foi indiciada pela Polícia Federal. O doleiro Alberto Youssef relatou repasses mensais de até R$ 30 mil para a ex-deputada. Tal pai, tal filha.
Por Tábata Viapiana, na Revista Isto É

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