quinta-feira, 31 de março de 2011

Terra!, minha terra.

Quiseram emoldurar a terra
Confiná-la num redoma concêntrica
Aprisioná-la numa esfera perfeita
Desejaram fazê-la anel de raio exato.
E enquanto tergiversavam sobre a precisão matemática da esfera
A terra - traquina - se fartava de rir, gargalhando: extase e loucura
 pois sabia que de exata e perfeita só tinha a curva sinuosa
a forma arisca, rebelde, indomável da minha juventude, da minha adolescência.
Rodoux Faugh



Cientistas elaboram mapa da gravidade da Terra

A Agência Espacial Europeia (ESA) divulgou, nesta quinta-feira (31), o mapa mais preciso já feito até hoje da gravidade da Terra. As informações foram coletadas durante dois anos pelo satélite Goce. O modelo, chamado de geoide, mostra minunciosamente que a Terra não é completamente redonda.

domingo, 27 de março de 2011

João Cabral de Melo Neto



João Cabral de Melo Neto (Recife, 9 de janeiro de 1920 — Rio de Janeiro, 9 de outubro de 1999) foi um poeta e diplomata brasileiro. Sua obra poética, que vai de uma tendência surrealista até a poesia popular, porém caracterizada pelo rigor estético, com poemas avessos a confessionalismos e marcados pelo uso de rimas toantes, inaugurou uma nova forma de fazer poesia no Brasil.

Irmão do historiador Evaldo Cabral de Melo e primo do poeta Manuel Bandeira e do sociólogo Gilberto Freyre, João Cabral foi amigo do pintor Joan Miró e do poeta Joan Brossa. Membro da Academia Pernambucana de Letras e da Academia Brasileira de Letras, foi agraciado com vários prêmios literários. Quando morreu, em 1999, especulava-se que era um forte candidato ao Prêmio Nobel de Literatura.

Foi casado com Stella Maria Barbosa de Oliveira, com quem teve os filhos Rodrigo, Inês, Luiz, Isabel e João. Casou-se em segundas núpcias, em 1986, com a poeta Marly de Oliveira. Mais, aqui.
Tecendo o amanhã
1.
Um galo sozinho não tece uma manhã:
ele precisará sempre de outros galos.

De um que apanhe esse grito que ele
e o lance a outro; de um outro galo
que apanhe o grito de um galo antes
e o lance a outro; e de outros galos
que com muitos outros galos se cruzem
os fios de sol de seus gritos de galo,
para que a manhã, desde uma teia tênue,
se vá tecendo, entre todos os galos.

2.
E se encorpando em tela, entre todos,
se erguendo tenda, onde entrem todos,
se entretendendo para todos, no toldo
(a manhã) que plana livre de armação.

A manhã, toldo de um tecido tão aéreo
que, tecido, se eleva por si: luz balão.



Poema(s) da Cabra

Nas margens do Mediterrâneo
não se vê um palmo de terra
que a terra tivesse esquecido
de fazer converter em pedra.

Nas margens do Mediterrâneo
Não se vê um palmo de pedra
que a pedra tivesse esquecido
de ocupar com sua fera.

Ali, onde nenhuma linha
pode lembrar, porque mais doce,
o que até chega a parecer
suave serra de uma foice,

não se vê um palmo de terra
por mais pedra ou fera que seja,
que a cabra não tenha ocupado
com sua planta fibrosa e negra.

1

A cabra é negra. Mas seu negro
não é o negro do ébano douto
(que é quase azul) ou o negro rico
do jacarandá (mais bem roxo).

O negro da cabra é o negro
do preto, do pobre, do pouco.
Negro da poeira, que é cinzento.
Negro da ferrugem, que é fosco.

Negro do feio, às vezes branco.
Ou o negro do pardo, que é pardo.
disso que não chega a ter cor
ou perdeu toda cor no gasto.

É o negro da segunda classe.
Do inferior (que é sempre opaco).
Disso que não pode ter cor
porque em negro sai mais barato.

2

Se o negro quer dizer noturno
o negro da cabra é solar.
Não é o da cabra o negro noite.
É o negro de sol. Luminar.

Será o negro do queimado
mais que o negro da escuridão.
Negra é do sol que acumulou.
É o negro mais bem do carvão.

Não é o negro do macabro.
Negro funeral. Nem do luto.
Tampouco é o negro do mistério,
de braços cruzados, eunuco.

É mesmo o negro do carvão.
O negro da hulha. Do coque.
Negro que pode haver na pólvora:
negro de vida, não de morte.

3

O negro da cabra é o negro
da natureza dela cabra.
Mesmo dessa que não é negra,
como a do Moxotó, que é clara.

O negro é o duro que há no fundo
da cabra. De seu natural.
Tal no fundo da terra há pedra,
no fundo da pedra, metal.

O negro é o duro que há no fundo
da natureza sem orvalho
que é a da cabra, esse animal
sem folhas, só raiz e talo,

que é a da cabra, esse animal
de alma-caroço, de alma córnea,
sem moelas, úmidos, lábios,
pão sem miolo, apenas côdea.

4

Quem já encontrou uma cabra
que tivesse ritmos domésticos?
O grosso derrame do porco,
da vaca, do sono e de tédio?

Quem encontrou cabra que fosse
animal de sociedade?
Tal o cão, o gato, o cavalo,
diletos do homem e da arte?

A cabra guarda todo o arisco,
rebelde, do animal selvagem,
viva demais que é para ser
animal dos de luxo ou pajem.

Viva demais para não ser,
quando colaboracionista,
o reduzido irredutível,
o inconformado conformista.

5

A cabra é o melhor instrumento
de verrumar a terra magra.
Por dentro da serra e da seca
não chega onde chega a cabra.

Se a serra é terra, a cabra é pedra.
Se a serra é pedra, é pedernal.
Sua boca é sempre mais dura
que a serra, não importa qual.

A cabra tem o dente frio,
a insolência do que mastiga.
Por isso o homem vive da cabra
mas sempre a vê como inimiga.

Por isso quem vive da cabra
e não é capaz do seu braço
desconfia sempre da cabra:
diz que tem parte com o Diabo.

6

Não é pelo vício da pedra,
por preferir a pedra à folha.
É que a cabra é expulsa do verde,
trancada do lado de fora.

A cabra é trancada por dentro.
Condenada à caatinga seca.
Liberta, no vasto sem nada,
proibida, na verdura estreita.

Leva no pescoço uma canga
que a impede de furar as cercas.
Leva os muros do próprio cárcere:
prisioneira e carcereira.

Liberdade de fome e sede
da ambulante prisioneira.
Não é que ela busque o difícil:
é que a sabem capaz de pedra.

7

A vida da cabra não deixa
lazer para ser fina ou lírica
(tal o urubu, que em doces linhas
voa à procura da carniça).

Vive a cabra contra a pendente,
sem os êxtases das decidas.
Viver para a cabra não é
re-ruminar-se introspectiva.

É, literalmente, cavar
a vida sob a superfície,
que a cabra, proibida de folhas,
tem de desentranhar raízes.

Eis porque é a cabra grosseira,
de mãos ásperas, realista.
Eis porque, mesmo ruminando,
não é jamais contemplativa.

8

O núcleo de cabra é visível
por debaixo de muitas coisas.
Com a natureza da cabra
outras aprendem sua crosta.

Um núcleo de cabra é visível
em certos atributos roucos
que têm as coisas obrigadas
a fazer de seu corpo couro.

A fazer de seu couro sola,
a armar-se em couraças, escamas:
como se dá com certas coisas
e muitas condições humanas.

Os jumentos são animais
que muito aprenderam com a cabra.
O nordestino, convivendo-a,
fez-se de sua mesma casta.

9

O núcleo de cabra é visível
debaixo do homem do Nordeste.
Da cabra lhe vem o escarpado
e o estofo nervudo que o enche.

Se adivinha o núcleo de cabra
no jeito de existir, Cardozo,
que reponta sob seu gesto
como esqueleto sob o corpo.

E é outra ossatura mais forte
que o esqueleto comum, de todos;
debaixo do próprio esqueleto,
no fundo centro de seus ossos.

A cabra deu ao nordestino
esse esqueleto mais de dentro:
o aço do osso, que resiste
quando o osso perde seu cimento.

*

O Mediterrâneo é mar clássico,
com águas de mármore azul.
Em nada me lembra das águas
sem marca do rio Pajeú.

As ondas do Mediterrâneo
estão no mármore traçadas.
Nos rios do Sertão, se existe,
a água corre despenteada.

As margens do Mediterrâneo
parecem deserto balcão.
Deserto, mas de terras nobres
não da piçarra do Sertão.

Mas não minto o Mediterrâneo
nem sua atmosfera maior
descrevendo-lhe as cabras negras
em termos da do Moxotó.

sábado, 26 de março de 2011

Apague as luzes para ver um mundo melhor



Milhões de pessoas estão prontas para desligar as luzes e ir além da hora


Dentro de algumas horas, um número recorde de pessoas em mais de 130 países ao redor do globo irá desligar as luzes durante uma hora, demonstrando apoio a ações por um futuro sustentável.

Centenas de monumentos, outras edificações e residências em milhares de cidades ficarão às escuras entre as 20h30min e 21h30min deste sábado (26) - hora local, quando milhões de pessoas se unirem a um dos maiores atos voluntários em prol do meio ambiente no globo. Indivíduos, organizações e governos estão comprometidos em levar a ação além da hora, pois o compromisso não termina com o reacender das luzes.

"Ao entrarmos na quinta edição mundial da Hora do Planeta, com a participação de um número recorde de países e de territórios, é inspirador vermos o que se pode conseguir quando nos unimos em torno de um objetivo comum", afirmou Andy Ridley, co-fundador e diretor-executivo da Hora do Planeta. "Imagine o que poderemos obter se formos além da hora", ressaltou.

O evento irá percorrer o globo ao longo de 24 horas, desde o momento em que as primeiras luzes forem apagadas nas ilhas Fiji e na Nova Zelândia, até o reacender das luzes no arquipélago de Samoa. A trajetória mais longa será na Rússia, onde a Hora do Planeta atravessará 11 fusos horários.

O secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, também apoiará à Hora do Planeta. "Vamos celebrar juntos e buscar ações para proteger o planeta e assegurar o bem-estar da humanidade. Vamos usar esses 60 minutos de escuridão para ajudar o mundo a encontrar a luz", disse.

No sábado, monumentos e outros pontos de referência bem conhecidos no mundo ficarão às escuras em todo o mundo durante uma hora. Entre eles, a Torre Eiffel (Paris); a roda gigante London Eye e o relógio Big Ben (Londres); o edifício do Empire State (Nova Iorque); o prédio em formato de vela gigante do hotel Burj Al Arab (Dubai); o castelo da Alhambra (Granada/Espanha); a estátua do Cristo Redentor e os Arcos da Lapa(Rio de Janeiro); a Acrópole de Atenas (Grécia); o Portal da Índia (Nova Délhi); a Grande Mesquita do Sheik Zayed (Emirados Árabes Unidos); e o teatro da Ópera de Sydney (Austrália).

Quatro dos cinco edifícios mais altos do mundo também terão suas luzes apagadas. Só a Torre do Califa (Dubai) tem meio milhão de pontos de luz.

Durante a Hora do Planeta, também serão apagados os holofotes de monumentos naturais espetaculares, como as cataratas do Niágara (entre Canadá e Estados Unidos) e as cataratas de Vitória (entre Zâmbia e Zimbábue, na África), e a barragem de Itaipu (Brasil) assim como a Montanha da Mesa (Cidade do Cabo/África do Sul).

Residências reais e presidenciais, castelos e palácios no Peru, Tailândia, Suécia, Madagascar e Honduras também terão suas luzes desligadas. A maior unidade residencial africana, uma propriedade conhecida como Gwarimpa Housing Estate, em Lagos (Nigéria), também participará.

Este ano, o apoio ao evento cresceu na África, Oriente Médio, Ásia Central e nas Américas, onde um grande número de países aderiu pela primeira vez à Hora do Planeta. Entre eles estão a Jamaica, Uganda, Suazilândia, Irã, Tadjikistão, Chade, Azerbaijão, Palestina, Suriname, Gibraltar, Uzbequistão, Trinidad & Tobago, Lesoto e Líbano.

Mídias online irão, mais uma vez, desempenhar um papel fundamental na Hora do Planeta, unindo a comunidade global. O YouTube, por exemplo, exibirá uma página personalizada da Hora do Planeta, onde se poderá clicar em um interruptor e escurecer a página.

Além da Hora

Este ano, a Hora do Planeta pede aos indivíduos, empresas e governos para ir além da hora. Isso requer um comprometimento com uma ação duradoura que se estenda após o evento de desligamento das luzes. Para isso, foi criado um programa online em www.earthhour.org/beyondthehour, onde serão registradas e mostradas ações com as quais as pessoas e organizações de todo o mundo se comprometeram.

Em Uganda, vários indivíduos e organizações que prometeram ir além da hora vão plantar mais de 16 mil árvores. Em Lumbini, no Nepal, será feito o plantio de 108 mil árvores.

Na China, todas as 83 cidades da parte continental do país que participam da Hora do Planeta prometeram ir "além da hora" e fazer "uma mudança" em prol do planeta. A cidade de Xangai vai criar mil hectares de novos espaços urbanos verdes. Em Chengdu, o governo municipal distribuirá 60 mil bicicletas nas áreas centrais da cidade e criará mais de mil estações para aluguel de bicicletas.

26 de março de 2011, de 20h30 as 21h30, apague as luzes para ver um mundo melhor. Cadastre-se no hotsite Hora do Planeta 2011: www.horadoplaneta.org.br

domingo, 6 de março de 2011

Pai, afaste de mim este cálice


De Sérgio Roxo, em Globo Online:
A volta de personagens envolvidos em escândalos de corrupção aos holofotes da cena política é um atentado à ideia de República, para Roberto Romano, professor de ética e filosofia política da Unicamp. Ele atribuiu o fato ao “anacronismo absolutista” da sociedade brasileira, em que há diferenças de direitos entre o cidadão comum e os ocupantes de cargos públicos.
Nos últimos dias, réus em processos foram nomeados para comissões na Câmara . João Paulo Cunha (PT-SP), acusado no mensalão, foi eleito presidente da Comissão de Constituição e Justiça , uma das mais importantes da Casa. Paulo Maluf (PP-SP), procurado pela Interpol, Valdemar da Costa Neto (PR-SP), também réu no mensalão, e Eduardo Azeredo (PSDB-MG), réu no processo do mensalão mineiro, foram escolhidos para integrar a comissão da reforma política. “Quem faz a lei não pode responder por uma acusação de desrespeitar a lei”, afirma Romano.
Tais nomeações, diz, geram uma “ameaça ao Estado democrático de direito”: “A situação mostra a fragilidade da nossa República. É uma República quase de fachada.” Para o cientista político Cláudio Couto, professor do Departamento de Gestão Pública da Fundação Getúlio Vargas, essas nomeações mostram que os partidos “estão se lixando” para a opinião pública: “É uma conduta comum a todos os partidos, tanto de oposição como situação. Não sobra ao eleitor escolher alguém que não esteja envolvido nesse tipo de situação.” Couto acredita que episódios como os das nomeações já foram banalizados pela avalanche de escândalos: ” É até difícil dizer que é um escândalo, porque se tornou algo tão rotineiro essa desfaçatez da classe política com a população. Escândalos, por definição, não podem ser coisas rotineiras. “