sábado, 30 de novembro de 2019

ENTREVISTA – Para onde vai América Latina?




Para o americano Scott Mainwaring, as recentes turbulências são um teste para a democracia na região, após anos seguidos de mau desempenho na economia

Considerado um dos políticos mais renomados no estudo dos sistemas políticos na América Latina, o americano Scott Mainwaring tem acompanhado com perplexidade a sequência de acontecimentos na região nos últimos meses.

Para ele, a instabilidade política no Peru, as manifestações no Chile e no Equador, além da conturbada saída do agora ex-presidente boliviano Evo Morales do poder são exemplos dos desafios que a democracia ainda enfrenta em países dessa parte do planeta décadas após a redemocratização.

Em entrevista a EXAME, concedida por telefone de seu escritório na Universidade de Notre Dame, em Indiana, nos Estados Unidos, ele afirma que desempenho econômico ruim, problemas sociais não resolvidos, além de escândalos de corrupção e violência do crime organizado estão por trás de uma insatisfação que leva a essa instabilidade. “Ter instituições sólidas é um antídoto contra uma erosão democrática. E é especialmente importante ter partidos políticos sólidos e um sistema judiciário que trabalhe bem”, diz Mainwaring.



O senhor vê razão para os países da América Latina estarem vivenciando turbulências políticas em sequência nos últimos meses?

Há um efeito em cascata das manifestações. O que acontece em um país afeta a percepção pública de outro país e aumenta a possibilidade de uma ação coletiva. Mas também temos de considerar o fator econômico.



Em que sentido?

Varia muito de país para país, mas, em geral, desde o fim do boom de commodities, as democracias da América Latina não tiveram um bom desempenho econômico. Agora já faz cinco ou seis anos que aquele ciclo de bonança se encerrou. E o cenário econômico tornou mais difícil para os governos ter sucesso. O exemplo do Brasil, claro, mostra como o fim do superciclo de commodities e má gestão da economia levaram a uma recessão longa e aprofundada, e a um grande desencantamento não só com o antigo establishment mas também com o Partido dos Trabalhadores. Isso levou à eleição de um presidente com um discurso claramente autoritário. Na Argentina, em 2019, o desempenho econômico ruim do governo de Maurício Macri levou a uma alternância de poder. A economia continua sendo um ingrediente importante. Além disso, no mundo todo vêm crescendo uma insatisfação com a democracia e um questionamento de sua legitimidade. Não é algo que ocorre em todos os países, claro. Mas países importantes passam por isso.



Como explicar o caso do Chile, que teve um desempenho melhor na economia?

A democracia chilena teve muitos sucessos. Crescimento econômico, redução de pobreza, estabilidade do governo, múltiplas alternâncias de poder. Mas há também déficits. A participação eleitoral declinou com o tempo. A identificação com os partidos políticos caiu profundamente. Os mais jovens não estavam votando. O fato de a democracia ser tão centrada na elite e não ter tido sucesso em reduzir a desigualdade, em melhorar a educação pública, em reformar um sistema de pensões disfuncional contribui para a insatisfação. Lembrando o que o economista Albert Hirschman argumentava: num país como o Chile, em que a democracia solucionou muitos problemas, é fácil se acostumar com o fato de que agora todos têm água encanada, ruas pavimentadas e empregos melhores do que nos anos 80. Mas a democracia, quando tem sucesso, gera novas expectativas e demandas. Isso é parte do que ocorre hoje no Chile e, provavelmente, no Peru e em outros países.



Há semelhanças no caso da Bolívia, que destituiu o presidente Evo Morales?

Não acho que esse seja bem o caso na Bolívia. Porque na Bolívia a divisão está muito concentrada entre os manifestantes pró-Evo e os manifestantes anti-Evo. No Chile, os protestos não têm seguido uma linha partidária clara. Não são manifestantes partidários. Por esse ângulo, os protestos no Chile são mais parecidos com os que ocorreram no Brasil em 2013 do que com os da Bolívia em 2019. Reúnem pessoas que estão cansadas do sistema e querem mudança.



Olhando para os acontecimentos na história da América Latina, o senhorvê algo parecido com o que está ocorrendo atualmente?

Há muitas diferenças, mas talvez a fase mais parecida seja o período entre o começo e a metade dos anos 2000. O que era semelhante naquela época é que havia insatisfação com os resultados medíocres de políticas econômicas direcionadas ao mercado. Especialmente entre 1998 e 2003, em média, as economias da América Latina não tiveram nenhum crescimento. A promessa era que, se os países adotassem políticas favoráveis ao mercado, a economia cresceria e a vida da população melhoraria. No entanto, isso não aconteceu. Naquele tempo, não houve muitas manifestações massivas, com exceção da Bolívia e do Equador. Mas havia uma grande inquietação. E, claro, ela levou ao que se tornou a “onda da esquerda” da América Latina, começando com a eleição de Hugo Chávez em 1998 e sua posse em 1999, na Venezuela. As similaridades entre hoje e o início dos anos 2000 são a sensação de insatisfação e a demanda por algo diferente e melhor.



O que estamos vendo agora é um fortalecimento ou um enfraquecimento da democracia na América Latina?

Essa é uma questão completamente em aberto. Minha visão pessoal é que no caso do Brasil houve uma erosão da democracia. Certamente ela não se rompeu. No entanto, as profundas insatisfações levaram à eleição de um presidente que não é um democrata. Mas esse não é um desfecho inevitável para os demais países da América Latina. Em minha visão, é perfeitamente possível que, no Chile, as manifestações levem a reformas que fortaleçam a democracia no sentido de torná-la mais inclusiva, abrindo as portas para uma nova Constituição democrática. E, no melhor cenário, também leve a uma democracia que seja socialmente mais responsável e mais eficaz em reduzir a desigualdade, em melhorar a educação, em aprimorar o sistema de aposentadorias. Mas o desfecho dessas manifestações é algo em aberto. O lado oposto desse espectro seria o surgimento de um líder autoritário demagogo que se aproveite da agitação provocada pelas manifestações para vencer as eleições e, em seguida, presidir um governo que enfraqueça a democracia. Não acho que seja muito provável isso ocorrer no Chile, mas é possível.



O que é necessário fazer para evitar esse segundo cenário?

Ter instituições sólidas é um antídoto contra uma erosão democrática. E é especialmente importante ter partidos políticos sólidos e um sistema judiciário que trabalhe bem. E a última coisa absolutamente indispensável — e isso é onde o Brasil falhou — é ter políticos que governem decentemente. Se isso não ocorre e as instituições se tornam mais fracas, está pronta a receita para uma erosão democrática. O Chile tem seguido bem essa fórmula. Ainda é um país de sucesso, mas em algumas dimensões fundamentais — educação, aposentadoria, desigualdade social — não tem se saído bem. Uma óbvia lição do caso do Brasil é que corrupção maciça e má gestão econômica enfraquecem a democracia. E, se o país elege alguém com um discurso autoritário, está vulnerável a uma erosão da democracia. Se voltarmos e olharmos o discurso e o comportamento de Hugo Chávez no início, em 1999, já era possível identificar que esse homem era um autoritário. A mesma coisa se dá com o presidente Donald Trump. O que salvou os Estados Unidos até agora é o fato de que temos instituições fortes.



Há instituições sólidas como as dos Estados Unidos em algum país na América Latina?

O Uruguai, a Costa Rica e, eu diria também, o Chile são, de longe, os países que se destacam como aqueles que possuem as instituições mais sólidas na América Latina. E, portanto, eles são os países em que uma erosão da democracia é menos provável que ocorra. Dito isso, também é possível dizer que, com exceção de paí-ses como Venezuela, Nicarágua, obviamente Cuba e, em alguma extensão, a Bolívia, a democracia de fato sobreviveu nestas últimas décadas na América Latina. Felizmente, até o momento não houve tantos casos assim de uma erosão profunda da democracia.



O que manteve essa estabilidade?

Uma razão é que as pessoas tinham vivido sob a ditadura e sabiam como ela era um regime ruim. O que ajudava muito também era que os Estados Unidos apoiavam a democracia no mundo de uma forma contínua. A ajuda nunca foi completamente consistente, mas bastante contínua, do fim da Guerra Fria até Trump ser eleito presidente. E certamente o período do boom das commodities ajudou a fortalecer a democracia porque permitiu um bom desempenho econômico e social. Essas são algumas das coisas que ajudaram a democracia a sobreviver.



É possível esperar que essas características voltem a existir?

Não há nenhuma indicação de um novo boom de commodities. Pelo contrário. Parece que a economia internacional está muito lenta. Nunca sabemos quando a situação vai mudar para melhor. Mas não há indicação desta vez de que isso deve ocorrer no curto prazo. Outro ponto é que, em muitos países latino-americanos, a corrupção e o crime organizado são fatores que deslegitimam a democracia. Descobrir medidas efetivas para combater o crime e a corrupção é parte importante da agenda democrática, além da agenda tradicional — social e econômica.
Por Filipe Serrano, na Revista Exame

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DESIGUALDADE - Luta contra o preconceito
Empresas e instituições financeiras se unem à Faculdade Zumbi dos Palmares para assegurar maior acesso dos negros a empregos de alta qualidade

Para um sonho se tornar realidade, em primeiro lugar, obviamente, é preciso sonhar. Depois, faz-se necessário lutar por esse sonho com seriedade e persistência. Há dez anos, o reitor da Faculdade Zumbi dos Palmares, o advogado e professor José Vicente, sonhou com uma bem sucedida inclusão profissional do negro nas grandes empresas. Desde então, dedicou-se a isso com afinco e esmero. Na terça-feira 19, véspera do Dia da Consciência Negra, foi realizada a sétima edição do evento Jornadas da Diversidade. Reuniu, no Hotel Maksoud Plaza, em São Paulo, instituições financeiras, como o Banco Bradesco, e empresários para discutir e promover a mesma causa de José Vicente. As 70 empresas signatárias desse projeto de inclusão atuam na expansão da contratação e na retenção de pessoas negras em seus quadros de funcionários.

Para José Vicente, o acesso dos negros aos empregos de alta qualidade em empresas de grande porte, é condição indispensável para que a democracia avance de forma significativa no País. “Isso tem importância extraordinária. Coloca na agenda esse tema estruturante da nossa sociedade”, diz ele. A iniciativa pela equidade e diversidade dentro das corporações tem dado bons frutos. No evento, presidentes e diretores dessas empresas engajadas na luta contra o preconceito deixaram claro que têm o objetivo de superar obstáculos para incluir os negros no topo das corporações. “Quando o indivíduo é valorizado, ele se sente seguro, respeitado e vai apresentar o que tem de melhor”, diz a empresária Claudia Pohlmann, vice-presidente da Corteva.

Políticas públicas

A iniciativa empresarial é de suma importância para mudar a realidade do negro no mercado de trabalho. Segundo o Instituto de Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 65% dos desempregados no Brasil são pretos ou pardos. “Nas cinco mil maiores empresas brasileiras não encontramos negros no primeiro, segundo ou no terceiro escalão da hierarquia de comando”, diz José Vicente. A Faculdade Zumbi do Palmares se propõe a cumprir esse papel aglutinador e estimular a reflexão, o debate e a qualificação profissional para mudar essa dura realidade do mercado de trabalho. A capacidade do reitor para unir corporações empresariais e propor políticas públicas e ações afirmativas em torno da causa tem sido notável. “Na Coca-Cola damos força ao Comitê de Diversidade”, afirma o presidente da multinacional no Brasil, Henrique Braun. É importante que, cada vez mais, empresas se juntem a essa luta inclusiva e humanizadora.
Por Fernando Lavieri, na revista Isto É

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sexta-feira, 29 de novembro de 2019

Termina amanhã prazo para renovar contratos do Fies feitos até 2017



Estudantes que têm contratos do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) firmados até o segundo semestre de 2017 têm até amanhã (30) para renovar o financiamento. O pedido de aditamento é feito inicialmente pelas instituições de ensino e, em seguida, os estudantes devem validar as informações inseridas pelas faculdades no Sistema Informatizado do Fies (SisFies)
Os contratos do Fies devem ser renovados a cada semestre. O prazo, que terminaria no dia 31 de outubro, foi prorrogado pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), que é responsável por esses contratos.
No caso dos chamados aditamentos simplificados, sem alterações no contrato, a renovação é formalizada a partir da validação do estudante no sistema. Quando há mudanças nas cláusulas do contrato, como mudança de fiador, por exemplo, o aluno precisa levar a documentação comprobatória ao agente financeiro - Banco do Brasil ou Caixa Econômica Federal - para finalizar a renovação.
Em 2018, o Fies foi reformulado e passou a vigorar o chamado Novo Fies. Os contratos firmados a partir desse ano têm outros prazos definidos pela Caixa.
Da Agência Brasil


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Um aperitivo de Lava Toga



A operação que expôs o balcão de sentenças montado no TJ da Bahia e o avanço da investigação sobre a família de Asfor Rocha, ex-presidente do STJ, mostram que, sim, é possível combater a corrupção no Judiciário


Por muito tempo, desde o surgimento das grandes operações de combate a desvios de dinheiro público e corrupção na primeira década dos anos 2000, o Judiciário foi o único poder a manter-se intocável. Com raras exceções, quando uma investigação avançava sobre possíveis crimes praticados por magistrados, em especial aqueles envolvendo cortes superiores e tribunais de Justiça estaduais, o caso era direcionado para alguma gaveta ou crivado pela anulação. Mas esse cenário aparenta passar por uma mudança. Nas últimas semanas, ao menos duas operações da Polícia Federal, a Appius e a Faroeste, investiram contra possíveis crimes praticados por servidores públicos que, em tese, deveriam ser os defensores da lei. A Appius, em São Paulo, promoveu busca nos imóveis do ex-presidente do Superior Tribunal de Justiça César Asfor Rocha, suspeito de receber 5 milhões de dólares para paralisar a Operação Castelo de Areia, em 2010. Já a Faroeste afastou quatro desembargadores baianos, incluindo o presidente do Tribunal de Justiça da Bahia, e dois juízes suspeitos de venderem sentenças de interesse de um grupo de grileiros de terras.

Mais do que essas investidas já realizadas, assombra alguns gabinetes de magistrados de renome os desdobramentos da Lava Jato no Rio de Janeiro. Como mostrou Crusoé, a delação de Lélis Teixeira, ex-presidente de dois dos principais sindicatos de ônibus do estado, cita a atuação de escritórios de advocacia na intermediação de compra de decisões judiciais e denuncia um caso concreto em que um desembargador teria recebido 6 milhões de reais para sentenciar de acordo com os interesses dos empresários de ônibus. Uma das consequências das revelações de Teixeira é a pressão para que eles revelem o alcance da corrupção no Judiciário praticada por eles. Para se ter uma ideia, um desses donos de frota de ônibus, José Carlos Lavouras, negocia uma delação em que estariam detalhados práticas ilícitas de quase uma dezena de magistrados fluminenses. Não bastasse, o ex-presidente da Fecomércio, Orlando Diniz, outro alvo da filial da Lava Jato no Rio, também almeja revelar seus crimes e o motivo de ter gastado mais de 180 milhões de reais com escritórios de advocacia, entre eles, alguns ligados a ministros do STJ e, também, a integrantes de tribunais federais.

Em todos os casos o modus operandi é parecido. Sempre há um empresário interessado em decisões favoráveis, um juiz disposto a assiná-las e escritórios de advocacia, muitas vezes ligados a parentes dos magistrados, envolvidos na intermediação entre as duas partes. Nas recentes operações da PF, outra característica fica evidente: a atuação de integrantes da cúpula de tribunais na indicação de magistrados aliados para julgar processos em que haja a negociação ilícita de sentença. Na Operação Faroeste, o alvo da PF são grileiros interessados em comprar decisões favoráveis numa disputa de terra que se arrasta desde a década de 80. Durante a investigação, a PF descobriu que os criminosos pagaram propina por sentenças de magistrados da 1ª e 2ª instâncias estaduais que concluíam que o dono de uma propriedade de 366 mil hectares no oeste baiano seria o borracheiro José Valter Dias e não os agricultores que ocupam a terra há anos. Para obter êxito, diz a PF, o grupo corrompeu quatro desembargadores e dois juízes. Entre eles, o atual chefe do Tribunal de Justiça, Gesivaldo Britto, e sua antecessora, a desembargadora Maria do Socorro Barreto Santiago.

De acordo com a PF, os dois, além de venderem sentenças próprias, atuaram para viabilizar o sucesso dos empresários corruptos. Britto teria indicado ao menos dois juízes suspeitos para comarcas na região das terras em litígio. Sempre segundo a PF, as nomeações impulsionaram o esquema. Da mesma forma, Maria do Socorro, enquanto comandou o tribunal baiano, designou um juiz para a cidade de Formosa do Rio Preto, onde fica a propriedade em disputa, com o propósito, diz a PF, de cumprir o cancelamento de todas as matrículas dos proprietários de terra da região e beneficiar os criminosos. Para se ter uma ideia do tamanho do esquema, a quebra de sigilo dos investigados mostra que os quatro desembargadores citados como integrantes do esquema – e afastados dos cargos pelo STJ – movimentaram em seis anos cerca de 77 milhões de reais. No caso do presidente do TJ-BA, o inquérito mostra que a prática de venda de decisões pode ter ido muito além do episódio dos grileiros. Em interceptação telefônica, o magistrado aparece em conversa com um deputado estadual da Bahia falando sobre a nomeação de um juiz no Tribunal Regional Eleitoral baiano. Depois de falarem sobre a necessidade de indicar o juiz, Britto encerra a conversa com a seguinte frase: “Mas no que depender da gente aqui, já viu, né? Pode mandar brasa”.

Em São Paulo, a Operação Appius avançou sobre dois influentes juristas do país. Além do ex-presidente do STJ César Asfor Rocha, o ex-ministro da Justiça de Lula Márcio Thomaz Bastos (morto em 2014), com direito à quebra de sigilo bancário e fiscal de contas pessoais e dos respectivos escritórios, entre março de 2009 e dezembro de 2011. Baseada na delação do também ex-ministro petista Antonio Palocci, a ação apura se Asfor recebeu 5 milhões de dólares de propina da Camargo Corrêa, depositados numa conta na Suíça por meio do filho Caio César Rocha, para paralisar e depois sepultar a Operação Castelo de Areia, que apurava pagamentos ilícitos da empreiteira a diversos políticos de diferentes partidos, em troca de contratos públicos. O próprio Palocci admitiu ter recebido 1,5 milhão de reais de propina por meio de Thomaz Bastos para fazer lobby junto a Asfor pela anulação da operação. O plano inicial era “suborná-lo” com uma nomeação ao STF, na vaga deixada por Eros Grau, mas Dilma Rousseff acabou indicando Luiz Fux em fevereiro de 2011. Nessa operação, o ex-ministro da Justiça teria recebido 40 milhões, sendo 15 milhões em honorários. Em uma variação do que teria ocorrido na Bahia, a PF suspeita que o ex-presidente do STJ tenha usado sua influência na corte para manipular o julgamento, indicando ministros substitutos alinhados a sua conveniências.

Ele paralisou a Castelo de Areia no dia 14 de janeiro de 2010, em pleno recesso forense, concedendo uma liminar inédita a pedido da defesa da Camargo Corrêa, coordenada por Thomaz Bastos. O argumento foi não ser possível autorizar grampos telefônicos em uma investigação baseada apenas em uma denúncia anônima. Quinze dias depois, ele indeferiu um pedido semelhante feito por advogados de funcionários do Incra e despachantes do Mato Grosso acusados de corrupção. Sobre o julgamento dessa liminar que resultou na anulação da operação, em abril de 2011, reside a segunda suspeita da PF. Isso porque dois dos quatro ministros que analisaram o caso haviam sido convocados por Asfor para assumir uma cadeira no STJ. Quando há uma vacância temporária, o presidente da corte tem a prerrogativa de fazer esse movimento. Um deles foi Celso Luiz Limongi, ex-presidente do TJ paulista, que assumiu em fevereiro de 2009, um mês antes da operação, o lugar da desembargadora mineira Jane Ribeiro Silva. Dois anos antes, Limongi já havia criticado publicamente o uso de grampos telefônicos em fase inicial de investigação. Ele morreu em setembro do ano passado. Outro a quem Asfor recorreu foi Francisco Haroldo Rodrigues de Albuquerque, do TJ do Ceará, seu conterrâneo. Em delação, Palocci afirma que se encontrou em 2010 com Limongi, com quem mantinha relação pessoal, para falar sobre a necessidade de paralisar a Castelo de Areia. Segundo o delator, o magistrado disse que, como havia sido convocado por Asfor, iria votar conforme o interesse do então presidente do STJ.

Asfor era o decano do STJ quando surpreendeu parte do mundo jurídico ao antecipar em seis anos sua aposentadoria, para voltar a atuar na advocacia, em setembro de 2012. Em duas décadas, sua atuação discreta foi permeada por estreitas relações com empresários renomados, como Alexandre Grendene e Carlos Jereissati, e caciques políticos, como Fernando Collor, responsável por sua nomeação em 1992, José Sarney e Renan Calheiros. Dono da fabricante de calçados que leva seu sobrenome, Grendene já emprestou seu jatinho para o ex-ministro fazer turismo no Uruguai. No Carnaval do ano passado, Asfor e a mulher Magda foram recebidos pelo bilionário gaúcho em sua mansão em Punta del Este, para comemorar o 13º aniversário de Kate, a cadela bichon frisé de quem o jurista cearense é considerado padrinho. Atualmente, Asfor defende a empresa Grendene em processos no STJ. Ele afirma que “Palocci é um delinquente condenado que está usando o instituto jurídico da delação para manter milhões roubados dos cofres públicos”.

A pedido do ex-ministro, foi o empresário gaúcho quem fez a ponte com o cartola Fábio Koff, com quem integrava o conselho deliberativo do Grêmio, para que o então presidente do Clube dos 13 indicasse o filho Caio Rocha a uma vaga de auditor do Superior Tribunal de Justiça Desportiva, o STJD, reduto marcado pelo histórico de filhotismo, em 2006. O perfil político herdado do pai o levou à presidência da corte que julga os processos do futebol brasileiro, em 2014, por indicação do ex-presidente da CBF Marco Polo Del Nero, banido pela Fifa por corrupção. Em julho do ano seguinte, conversas encontradas pela PF no celular do advogado Tiago Cedraz, filho do ministro Aroldo Cedraz, do Tribunal de Contas da União, mostram o advogado Flávio Horta Jardim, dirigente do Volta Redonda e enteado do ex-governador do Rio Luiz Fernando Pezão, pedindo a Cedraz ajuda para falar com Caio Rocha, a fim de obter um “efeito suspensivo” no STJD, que é quando um auditor suspende uma punição dada a um clube ou jogador. As mensagens não indicam algo de ilícito, mas revelam a proximidade dele com Tiago Cedraz, suspeito de praticar tráfico de influência nos tribunais e desviar recursos do Ministério do Trabalho. A Crusoé, Caio Rocha disse que foi indicado ao STJD por um professor que conheceu em seu mestrado, em 2004, e que nunca recebeu nenhum dos citados para tratar de efeito suspensivo.

Ao mesmo tempo em que construía uma carreira independente no mundo desportivo, Caio Rocha acumulava clientes no escritório que montou em sociedade com um ex-procurador e ex-juiz do Ceará em 2002, logo após se formar em Direito. Só na corte presidida por Asfor, ele figurava em quase 3 mil processos defendendo os interesses de empresas como Bradesco, Oi, Arena Castelão e a Rodopetro Distribuidora de Petróleo, implicada na Lava Jato por integrar o esquema de corrupção da Petrobras. Outra cliente de Caio Rocha é a construtora Marquise, que hospedou como cortesia os convidados do casamento do advogado em um hotel em Fortaleza. Em 2010, a empresa foi citada em uma operação da Polícia Federal contra sonegação fiscal e corrupção, que prendeu o cunhado de Asfor, o também advogado Armando Campos Junior. Ele foi solto e nenhuma denúncia foi oferecida até agora. No TCU, um consórcio formado por Andrade Gutierrez, Odebrecht e Queiroz Galvão, todos elas devassadas e denunciadas pela Lava Jato, também figura entre os clientes de Caio Rocha, que hoje conta com nove filiais pelo país. A Lava Jato paulista suspeita que Rocha tenha sido o operador do pai enquanto Asfor esteve no STJ. O filho é sócio de oito das nove empresas da família que tiveram o sigilo bancário e fiscal quebrado pela Justiça Federal, conforme revelou Crusoé. Uma delas, a CCVR Participações, foi aberta em dezembro de 2010, para administrar imóveis da família e hoje acumula capital de 26,9 milhões de reais. Da sociedade também consta a mulher Tatiana, filha do empresário do setor de transportes Francisco Feitosa e sobrinha da mulher do ministro Gilmar Mendes. Advogada atuante nos tribunais superiores de Brasília, Guiomar teria ficado incomodada com o uso da influência política de Asfor no Judiciário para angariar clientes e, segundo pessoas próximas, chegou a enviar uma mensagem a ele reclamando da prática.

Feitosa é sócio de Jacob Barata, empresário conhecido como o “Rei do ônibus” no Rio e acusado de corrupção na Lava Jato. Ao menos duas empresas de Barata são defendidas pela família Rocha no Ceará. Em 2017, Feitosa filiou o genro Caio Rocha ao DEM, com o intuito de lançá-lo candidato ao governo do Ceará. O plano contava com o apoio do amigo e presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, mas não evoluiu porque o partido decidiu se aliar ao grupo do governador Camilo Santana, do PT, e dos irmãos Ciro e Cid Gomes, do PDT. No mesmo período, o filho do ministro tentou ampliar seus negócios se associando à desconhecida empresa BRfoot Mídia, para abocanhar um contrato de 550 milhões de reais junto a CBF e ter exclusividade nos direitos de transmissão dos jogos do Campeonato Brasileiro no exterior por quatro anos. Ele chegou a ser o avalista do aporte de 150 milhões de reais que uma holding americana faria na empresa vencedora, mas o contrato não foi adiante porque, segundo um ex-funcionário, a exclusividade não foi garantida pela CBF.

Embora Caio Rocha tenha processado uma terceira empresa envolvida na transação, cobrando uma dívida de cerca de 1,2 milhão de reais, o fracasso da empreitada não arranhou seu patrimônio. Em fevereiro deste ano, ele comprou um apartamento de 720 mil dólares no distrito de Sunny Isles Beach, em Miami. Teria sido este o destino da última viagem que a família Asfor Rocha fez à Flórida, no início deste mês, na véspera da operação de busca e apreensão da PF nos imóveis de São Paulo, Brasília e Fortaleza. As Operações Faroeste e Appius mostram que é possível investigar os desvios dos togados e que a blindagem aos magistrados pode estar com os dias contados. Trata-se de um bom aperitivo para a Lava Toga.
Por FABIO LEITE e FABIO SERAPIÃO, na Revista Crusoé


quinta-feira, 28 de novembro de 2019

Reminiscências do teatro brasileiro – de Anchieta ao Oficina



O teatro brasileiro por séculos se comportou como mero reprodutor do teatro europeu e posteriormente, do norte americano. Vejamos como a história registra esta estreita relação.

Tão logo os missionários católicos chegaram ao Brasil, deram início a um processo de conhecimento sobre a vida e o comportamento dos autóctones. Era a premissa básica para proceder a catequização.

O caráter libertário dos indígenas, expresso nas mais variadas de suas manifestações, como a dança, o canto, as festas e ritos, despertou nos missionários a utilização do teatro enquanto instrumento de aculturação e dominação.

José de Anchieta, no século XVI, através de alguns autos, transforma-se na mais proeminente figura deste tipo de teatro. O cerne da proposta dessa manifestação consistia, resumidamente, em impor a “salvação” dos indígenas para Deus, o que se daria a partir da assimilação dos valores cristãos. Era, portanto, um teatro de propaganda religiosa. Os textos estruturalmente simples representavam sempre o índio sendo vítima das investidas de Deus e do diabo, culminando com a vitória do primeiro sobre o segundo.

No afã da Companhia de Jesus transformar os “selvagens” em “civilizados”, os “perdidos” em “salvos”; ignoraram por inteiro a cultura, a identidade, a liberdade e a independência dos indígenas. Foi um brutal ato de selvageria como de resto são os processos de colonização.

O caráter festivo dos indígenas aliado ao fato de ser o ritual católico extremamente estilizado deu ao jesuíta o ingrediente formal para um inesgotável trabalho projeção dramática.

A estruturação desta dramaturgia de catequese é bastante incipiente. O ciclo é fechado invariavelmente no erro (pecado), na constatação dele (expiação), desfechando na redenção (perdão).

Para sedimentar o dualismo (bem X mal), o diabo era representado com o nome das tribos inimigas, conduzindo para o campo real, o imaginário coletivo. Além deste recurso, muitos outros foram utilizados. Anchieta chegou a escrever autos inteiramente na língua tupi, como forma de buscar uma identificação mais profunda com sua “platéia”.

As apresentações tinham caráter festivo, mobilizando toda a aldeia para a apreciação do evento. Dos autos que José de Anchieta escreveu, alguns merecem um destaque especial. “Auto da Pregação Universal”, “Dia de Assunção”, “Quando, no Espírito Santo, se Recebe uma Relíquia das Onze Mil Virgens” e “Na Festa de São Lourenço”. Esta última escrita conjuntamente com o padre Manoel do Couto.

Posteriormente o teatro deixa de ser unicamente instrumento de catequese dos indígenas. O universo se amplia. Passa também a ser utilizado na educação de colonos brancos, mamelucos, caboclos...



No período colonial há o registro, por parte dos historiadores, de um hiato de cerca de dois séculos, em que nossa produção teatral fica estagnada. As razões do interregno talvez se expliquem pelas guerras decorrentes das invasões holandesa e francesa. Mas sem dúvida, as modificações de ordem política verificadas no país contribuíram para a existência do buraco negro.

Há registro, porém da dramaturgia de Manoel Botelho de Oliveira (1637-1711). O comediógrafo nasceu no Brasil, mas a estreita ligação mantida com a Europa interferiu acentuadamente em sua produção artística. O processo de colonização cultural desconheceu limites. Botelho de Oliveira escreveu somente em espanhol, imitando os autores daquele país.

Após esta passagem, apenas o século XVII vai registrar a presença do teatro, com um luso-brasileiro: Antônio José da Silva - o judeu. Apesar de ter nascido no Rio de Janeiro, em 1705 - veio a falecer em 1739 - a vida e obra deste escritor estão umbilicalmente vinculadas a Portugal. Naturalmente isto o distancia dos problemas brasileiros e o teatro resultante sofre fortes influências dos teatros francês e italiano.

A vida deste dramaturgo é marcada por um suceder de acontecimentos sinistros. Quando tinha apenas oito anos, sua mãe é acusada de judaísmo, o que motiva a transferência de toda a família para o exterior. Todavia, o episódio não foi suficiente para aplacar a perseguição da Igreja. Aos trinta e quatro anos de idade, o próprio Judeu perde a vida, queimado pelo fogo “santo e purificador” da Inquisição.

Na segunda metade do século XIX, mais precisamente em 4 de outubro de 1838, a companhia de teatro de João Caetano estréia “O juiz de Paz na Roça”, de Martins Pena. Estrondoso sucesso. O fato de escrever sobre o cotidiano, retratando os personagens típicos do povo, de provocar o riso fácil e despretensioso, foram os ingredientes utilizados por Martins Pena para conquistar o sucesso.

Nascido em 1815, Martins Pena escreveu dos 22 aos 33 anos - quando morreu - vinte comédias e seis dramas. É uma produção surpreendente onde se destacam “O Cigano”, “O Usuário” – uma critica as Câmaras Municipais, “Comédia sem Título”, “O Caixeiro da Taverna” - abordando a carestia e “Os Três Médicos” - onde critica vigorosamente a classe médica.

A técnica empregada nas comédias de Martins Pena passa invariavelmente pela utilização em abundância do dramalhão. A estrutura das obras se utiliza sempre de recursos fáceis e triviais, primários e ingênuos. Uma outra característica de relevo é que seus textos ignoram por completo o cenário político-social decorrente da estrutura colonialista então vigente. Deixava-se conduzir por abordagens simplistas, gracejos triviais como é característico do teatro de costumes.

Em 1808, as investidas napoleônicas forçam a transferência da corte para o Rio de Janeiro. O Imperador franqueia os portos e o livre comércio é estabelecido. Os ingleses exultam e agradecem. Novos direitos políticos são conquistados e com o crescimento da economia, se verifica também o desenvolvimento da cultura e da intelectualidade. Jornais passam a circular, museus, escolas superiores e bibliotecas são criadas. A vida lateja e pulsa no seio das elites.

Nessa época, é freqüente a presença de companhias teatrais portuguesas no Brasil. Procurando fugir aos esquemas dessas companhias, João Caetano cria em 1833 uma companhia brasileira.

João Caetano - ator e posteriormente produtor - mereceu respeito e consideração de seus contemporâneos. Até mesmo os desafetos lhe reconheciam talento. Em 1861, pouco tempo antes de morrer, edita “Lições Dramáticas”, onde esquematiza seus estudos, experiências e concepções teatrais. Aqui, João Caetano aborda um tipo de preocupação, que deve ser extensiva a todos os atores, no sentido de exercer pleno domínio sobre a emoção. Chega a descrever um episódio inusitado: na apresentação de um espetáculo, enforca uma atriz levando-a a asfixia. Segundo seu relato foi necessária a intervenção da platéia e também dos demais atores, que acorreram em auxílio à atriz.

Este dilema entre a emoção e a razão permeia toda a história do teatro.

Há também em João Caetano uma preocupação no sentido de delinear psicologicamente suas personagens. Na peça “Gargalhada”, interpretando o papel de André, construiu a personagem através de vários estudos e laboratórios que envolveram reiteradas visitas a hospitais psiquiátricos para uma observação mais acurada dos enfermos.

O pequeno público existente então, não possibilitava que os espetáculos permanecessem por muito tempo em cartaz. Cada trabalho era apresentado no máximo quatro vezes.

Os artistas começam a reivindicar do governo auxílio na propagação da atividade cênica. A preocupação em disseminar o teatro e os diversos obstáculos que se colocavam à frente, não raro, gerava proposições inusitadas, algumas estapafúrdias. Uma delas solicitava a terminante proibição de apresentações circenses - com animais selvagens ou domesticados, nos dias em que houvesse alguma apresentação de teatro. Uma outra solicitava a proibição de apresentações das cias. estrangeiras enquanto estivesse em cartaz um espetáculo da Cia. Dramática Nacional.

Pelas sugestões percebe-se que as dificuldades enfrentadas atualmente pelos produtores de cultura vêm de longa data.

A primeira tragédia abordando questão nacional deve-se a Gonçalves de Magalhães. Baseando-se na vida do Judeu, escreve “Antônio José” ou “O Poeta e a Inquisição”. O espetáculo foi montado pela companhia de João Caetano.

Em 1875, desgostoso com a falta de oportunidades para os dramaturgos brasileiros, José de Alencar faz um enérgico protesto: “Na alta roda ouve-se a moda de Paris, e como em Paris não se representam dramas nem comédias brasileiras, eles, ces messieurs, não sabem que significa teatro nacional”.



O desabafo foi feito logo após o fracasso da estréia de sua peça “O Jesuíta”.

A crítica de José de Alencar não perdeu a atualidade, e nos remete ao já consagrado santo de casa não faz milagre. Nas regiões menos desenvolvidas do país este quadro se agrava, e os artistas só adquirem certo respeito, quando obtém alguma ressonância no eixo Rio-São Paulo, culturalmente “mais avançado”. É o velho conflito ‘colonizado X colonizador’ triunfando sob um novo ângulo.

João Caetano falece em 1863. Na pobreza. Como de resto ocorre com a esmagadora maioria dos artistas da terra tupiniquim. Gonçalves Magalhães desaparece no naufrágio do navio em que viajava, em 1864. E como também é próprio da terra brasilis, só obtém consagração após sua morte.

A Semana de Arte Moderna de 1922 ressalta o trabalho de Oswald de Andrade e as décadas de quarenta e cinqüenta consolidam bons autores. “Deus lhe Pague” de Joracy Camargo oferece a perspectiva da produção de um teatro de cunho social.

Em 1938, Paschoal Carlos Magno funda o Teatro do Estudante do Brasil.

Posteriormente aparece a troupe “Os Comediantes”, também constituída de atores amadores. Por um curto período “Os Comediantes” experimenta o profissionalismo. O fracasso financeiro faz o Grupo recuar à posição inicial.

O objetivo básico do teatro deste período é reformar a estética do espetáculo, desenvolver um trabalho grandioso, no estilo das companhias profissionais. É esta obsessão pela forma perfeita que dá origem à especificação das tarefas. Surgem os diferentes agentes do espetáculo: o iluminador, o cenógrafo...

Para fazer frente à produção européia e norte americana, o industrial italiano Franco Zampari cria em 1948, o TBC - Teatro Brasileiro de Comédia.

Inicialmente constituído por amadores, o TBC logo se profissionaliza e dá início a uma trajetória promissora.

A consolidação do parque industrial de São Paulo exigia também a estruturação de uma industria cultural. O TBC se propõe a enfrentar este desafio partindo do marco zero, ignorando a produção existente até então. Para isto a direção dos espetáculos fica nas mãos dos estrangeiros.

A Companhia não tinha maior preocupação com o político e social. Estes aspectos, quando abordados se restringiam ao espectro do humanismo universal.

Em contraposição, surge em São Paulo um movimento nacionalista expresso no ARENA com “Eles não Usam Black-Tie”, de Guarniere, que por um ano permanece em cartaz.

A forma e o gesto do teatro pelo teatro - postulados do TBC, agora encontra uma resistência à altura. Surge um teatro proletário que referencia as lutas sociais com um enfoque jamais ousado.

Também o OFICINA surge com uma proposta inovadora. Procurou trabalhar para um público composto basicamente por estudantes e setores da classe média. Alcança uma determinada fase da produção em que o teatro é denominado assembléia, com o grupo se colocando - socialmente - no mesmo ângulo de visão do espectador. Foi uma experiência de extrema importância, em que pese seu caráter pretensioso e autoritário, haja vista que o público não dispõe de mecanismos para desenvolver uma atuação que o aproxime tecnicamente do ator: não ensaia, não realiza oficinas, mantém-se ao largo dos exercícios e laboratórios...

O OFICINA conclui este ciclo de sua existência com uma proposta revolucionária: sair das salas e ganhar as ruas. Posteriormente as atividades do grupo se disseminaram para alcançar outras manifestações artísticas.

Antônio Carlos dos Santos


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Amazonas: Após ataques, servidores da Funai abandonam base e índios isolados ficam sem proteção



Instalação etnoambiental Ituí-Itacoaí visa garantir a segurança de indígenas que vivem no Vale do Javari

BRASÍLIA - Índios isolados da Terra Indígena do Vale do Javari , no extremo Oeste do Amazonas , estão sem a proteção de funcionários da Fundação Nacional do Índio ( Funai ) desde a manhã da última quinta-feira. O último servidor da Funai que atuava na base de proteção etnoambiental localizada no rio Ituí deixou o local após uma série de ataques com disparos à instalação. Sem proteção, os funcionários da Funai estão se recusando a ir à base. Há duas semanas, a Justiça Federal do Amazonas determinou que a União desse proteção à Funai, mas Polícia Federal , Exército e Força Nacional de Segurança não responderam aos ofícios enviados pelo Ministério Público Federal ( MPF ) solicitando ajuda.

A base de proteção etnoambiental Ituí-Itacoaí é a principal instalação da Funai para garantir a segurança dos índios isolados que vivem no Vale do Javari. A região é uma das mais preservadas e remotas do Brasil e, nos últimos anos, vem sendo alvo de caçadores clandestinos, madeireiros e garimpeiros ilegais. Em setembro, um colaborador da Funai na região morto a tiros em Tabatinga, na região da tríplice fronteira entre Brasil, Colômbia e Peru.

No dia 8 de novembro, a Justiça Federal do Amazonas determinou que a União fornecesse homens para fazer a segurança dos funcionários da Funai que atuam na base. A ação, segundo a decisão, seria coordenada pelo MPF, que então enviou ofícios para o Exército, Polícia Federal, Força Nacional de Segurança e para a Secretaria de Segurança Pública do Amazonas (SSP-AM). Em nota divulgada na quinta-feira, o MPF disse que apenas a SSP-AM respondeu colocando-se à disposição.

Relatos obtidos pela reportagem indicam que os funcionários que deveriam substituir a equipe que estava na base se recusaram a se dirigir ao local por temerem novos ataques.

- Os servidores se recusam a subir (o rio) sem segurança por temerem por sua segurança - disse um funcionário do órgão que aceitou falar sob a condição de anonimato.

Para o vice-presidente da associação dos índios da etnia marubo do rio Ituí, Lucas Marubo, a situação coloca em risco a vida tanto dos funcionários da Funai quanto dos índios.

- Se não tem segurança para eles, também não tem segurança para nós, que vivemos na região. Os invasores estão à espreita só esperando para entrar. Sem ninguém da Funai lá, fica mais fácil para eles. A situação é muito perigosa - alerta Lucas Marubo.

A base de proteção aos índios isolados vem sendo alvo de manifestações de indigenistas e de servidores da Funai. No dia 6 de novembro, uma carta assinada por dezenas de funcionários da Funai alertava sobre os riscos da falta de segurança na região.

'O processo de fragilização das condições de trabalho das FPEs (Frentes de Proteção Etnoambiental) tem se agravado nos últimos meses pelos motivos supracitados, podendo levar ao risco iminente de paralisação das atividades das Bases Avançadas de Proteção Etnoambiental (BAPE), inviabilizando a atuação dos servidores e, consequentemente da Funai, em sua missão institucional de garantia e promoção dos direitos desses povos', diz um trecho do documento.

Os índios isolados são aqueles que ainda não foram contatados ou que, voluntariamente, decidiram viver sem contato com o mundo exterior. Eles são considerados extremamente vulneráveis à proximidade com os não-índios tanto pelas diferenças culturais quanto pela vulnerabilidade a doenças para as quais eles não tenham defesas imunológicas.

De acordo com a Funai, o Brasil tem 114 registros de índios isolados ou de recente contato. Desses, 28 já foram confirmados. Para defendê-los, a Funai criou 11 frentes que coordenam 19 bases, todas localizadas na floresta amazônica, em áreas de difícil acesso.

A reportagem enviou perguntas ao Comando do Exército, à Polícia Federal, ao Ministério da Justiça e à Funai questionando sobre o que fez com que essas instituições não tenham respondido aos ofícios enviados pelo MPF. Até o fechamento desta matéria, no entanto, nenhuma resposta havia sido enviada.
Por Leandro Prazeres, em O Globo Online



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quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Unicef: mortalidade infantil tem redução histórica no Brasil


O Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) promove hoje (27) sessão, na Assembleia Legislativa de São Paulo, para marcar os 30 anos da Convenção sobre os Direitos da Criança. O órgão produziu um relatório que confere ao Brasil reconhecimento por ter melhorado, ao longo dos anos, índices como o da mortalidade, do trabalho infantil, além da exclusão escolar.
Conforme o Unicef, de 1990 a 2017 registrou-se "redução histórica" no total de mortes de crianças menores de um ano de idade. No período, a taxa nacional caiu de 47,1 para 13,4 a cada 1 mil nascidos vivos. Além disso, entre 1996 e 2017, 827 mil vidas foram salvas.
As ações de mitigação articuladas pelos governos geraram efeitos de âmbito nacional, causando impacto também em São Paulo. No estado, a redução do índice foi de 22,5 para 10,9, de 1996 para 2017, quando 103 mil vidas de bebês foram salvas.
A queda nos índices de cobertura vacinal, adverte o Unicef, tem sido porta de entrada para doenças que eram, até recentemente, consideradas erradicadas, como o sarampo. "Em 2016, a mortalidade infantil subiu pela primeira vez em mais de 20 anos e ainda não voltou aos patamares de 2015, acendendo um sinal de alerta. No total, 42 mil crianças menores de 5 anos ainda morrem por ano no Brasil", informa o fundo da ONU no relatório.

Índice de violência

A alta incidência de homicídios de adolescentes é outro ponto abordado no documento. O Unicef destaca que, entre 1990 e 2007, o total de ocorrências dessa natureza mais do que dobrou.
"De 1996 a 2017, 191 mil crianças e adolescentes de 10 a 19 anos foram vítimas de homicídio", informam os autores do relatório, acrescentando que, a cada dia, em média, 32 meninas e meninos nessa faixa de idade são assassinados.
Nos municípios paulistas, somente na década encerrada em 2017, destaca o documento do Unicef, 8.200 crianças e jovens nessa faixa etária foram assassinados. A taxa chegou a ser de 9,7 homicídios por 100 mil habitantes, há dois anos. A estimativa é que mais de 1 milhão de menores de idade vivam em áreas afetadas pela violência armada na cidade de São Paulo.

Sala de aula

Outro aspecto mostrado no relatório é o acesso de crianças e adolescentes à educação. Na avaliação do Unicef, o país "conseguiu avançar consideravelmente" nessa área.
"Em 1990, quase 20% das crianças de 7 a 14 anos (idade obrigatória na época) estavam fora da escola. Em 2009, a escolaridade obrigatória foi ampliada para a faixade 4 a 17 anos. E, em 2017, 4,7% das crianças e adolescentes de 4 a 17 anos estavam fora da escola".
Os especialistas do Unicef ponderam que, embora o índice de exclusão escolar tenha diminuído significativamente, o país ainda não atingiu a universalização do ensino. Ao todo, quase 2 milhões de meninas e meninos estão fora da escola.
"Em São Paulo, 13% das crianças e adolescentes estavam fora da escola em 1996. Em 2018, eram 3,9%, o que representa 330 mil meninas e meninos. Há ainda aqueles que estão na escola sem aprender. A adolescência é a fase da vida mais afetada com a distorção idade-série no país: 14,9% dos estudantes do ensino médio e 12,5% nos anos finais do fundamental estão dois ou mais anos atrasados, totalizando 6,5 milhões de meninas e meninos. Em São Paulo, são 556.515 crianças e adolescentes", completa o órgão.

Imigrantes e saúde mental

Para o Unicef, outro ponto que deve integrar a agenda das autoridades preocupadas com a garantia dos direitos de crianças e adolescentes refere-se à acolhida de refugiados. Dos cerca de 200 mil venezuelanos que ingressaram no país até julho, 30% eram menores de idade. O estado é o segundo com maior volume de pedidos de refúgio, concentrando mais de 10% do total.
O tema suicídio também figura no relatório do Unicef como uma das questões contemporâneas que requerem atenção. "Nos últimos 10 anos, os suicídios de crianças e adolescentes vêm aumentando no Brasil. Eles passaram de 714, em 2007, para 1.047, em 2017. No estado de São Paulo houve aumento de 53% no número de casos, saltando de 98, em 2007, para 150 em 2017".
Da Agência Brasil

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A ENCCLA e o combate ao crime


Coordenada pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, a ENCCLA enfrenta a corrupção e a lavagem de dinheiro como grandes males que afetam os cidadãos

É possível vencer o crime. O Brasil tem envidado esforços notáveis no combate à corrupção e à lavagem de dinheiro, dando voz, corpo e respostas efetivas aos mandamentos constitucionais e aos compromissos assumidos internacionalmente. Prova desse dever imperativo em defesa da sociedade são os resultados efetivos da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (ENCCLA), um fórum de mais de 80 instituições brasileiras dedicadas à formulação de políticas públicas e soluções articuladas voltadas ao combate à corrupção e à lavagem de ativos.


Coordenada pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, a ENCCLA enfrenta a corrupção e a lavagem de dinheiro como grandes males que afetam os cidadãos. São notórios os custos políticos, sociais e econômicos que tais crimes acarretam: comprometem a legitimidade política, enfraquecem as instituições democráticas, corroem valores de coletividade, retiram recursos públicos dos serviços básicos à população. Não bastasse, minam o crescimento e afugentam novos investimentos do país, gerando ambiente de insegurança no mercado econômico. Combatê-los de forma efetiva, portanto, é fundamental para o fortalecimento da lisura pública e para a viabilização do desenvolvimento nacional.

Criada em 2003, a Estratégia se consolidou e representa, atualmente, a principal rede de articulação interinstitucional brasileira a reunir uma diversidade de órgãos dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário das esferas federal e estadual e, em alguns casos, municipal, bem como do Ministério Público e associações civis. E já ultrapassa fronteiras, servindo de inspiração a países interessados em implementar grupos de trabalhos semelhantes.

A ENCCLA contribuiu na estruturação de delegacias especializadas na luta contra crimes ?nanceiros e na criação de delegacias de combate à corrupção, tornando mais e?caz a repressão. Também prestou forte contribuição à formação dos grupos nacionais de combate às organizações criminais, no âmbito dos Ministérios Públicos Estaduais, bem como especializou autoridades brasileiras na luta contra o crime organizado.

O trabalho da ENCCLA facilitou o acesso a registros contábeis das entidades contratadas pela administração pública; aprimorou o controle de fronteiras; ajudou na promoção da alienação antecipada de bens apreendidos; e contribuiu na criação do Sistema Nacional de Bens Apreendidos. Ressalte-se que o fórum contribuiu fortemente para construções legislativas que versam sobre lavagem de dinheiro, organizações criminosas e combate à corrupção.

Entre os resultados alcançados ainda figuram a criação da Rede Nacional de Laboratórios contra a lavagem de Dinheiro (Red-LAB); a adoção do Sistema de Movimentação Bancária (SIMBA), com a padronização para a quebra de sigilo bancário e o Cadastro de Correntistas do Sistema Financeiro Nacional.

Ainda durante esse ano, destacam-se as contribuições da ENCCLA no âmbito da Lei nº 13.810/2019, que prevê o cumprimento de sanções do Conselho de Segurança das Nações Unidas, incluindo indisponibilidade de bens de pessoas físicas e jurídicas, e a designação nacional de pessoas investigadas ou acusadas de terrorismo. Sublinha-se, como fruto da Estratégia, o Programa Nacional de Capacitação e Treinamento para o Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (PNLD), que já qualificou mais de 18 mil servidores públicos atuantes nessa seara.

Reunida em Belo Horizonte (MG) de 18 a 22 de novembro, a ENCCLA apresentou os resultados e produtos construídos e implementados ao longo de 2019. Os projetos priorizam inteligência digital na análise de dados, fiscalização de empresas, além de projetos de lei contra a lavagem e o desvio de ativos.

Um dos avanços conquistados este ano foi ampliar o canal Plataforma FalaBR, de forma a receber denúncias sobre empresas brasileiras no exterior suspeitas de corrupção e de suborno transnacional. Êxito de repercussão nacional, a ENCCLA conseguiu que operações registradas em cartório suspeitas de lavagem sejam comunicadas às autoridades competentes.

As autoridades apresentaram um projeto de lei para restringir saques em espécie e transferências a partir de contas que recebem recursos públicos. Numa frente ligada a inteligência digital, outro projeto é uma plataforma digital de dados abertos para transparência pública. A ENCCLA também estuda ações contra o uso de empresas de fachada e propõe medidas de controle de dinheiro em espécie, nacional ou estrangeiro. Outra frente de trabalho defende considerar o crime tributário como antecedente à lavagem.

Podemos celebrar um amplo amadurecimento institucional. As decisões da ENCCLA, tanto nos grupos que acolhem as ações como nas plenárias, são adotadas por consenso. Essa metodologia permite deliberações muito mais complexas e concretas.

Longa e frutífera é a caminhada da ENCCLA, e os desafios que avultam no presente são intensos. Portanto, cumpre às instituições que a representam encontrar os caminhos que melhor conduzam a, articulada e conjuntamente, trabalharmos paras alcançar nosso propósito central, que é a afirmação dos valores de integridade, de probidade e de justiça no Brasil.

Por Maria Hilda Marsiaj Pinto - Secretária Nacional de Justiça -, em O Estado de S. Paulo - Blogs
 / Fausto Macedo 


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terça-feira, 26 de novembro de 2019

Pediatras criticam guia alimentar para crianças feito pelo Ministério da Saúde



Especialistas afirmam que o leite de vaca tem altos teores de proteínas e sua ingestão em bebês compromete o metabolismo, aumenta o risco de obesidade e sobrecarrega os rins

BRASÍLIA - Bebês a partir de nove meses que não são alimentados com leite materno podem tomar leite de vaca ou somente fórmulas infantis? A discussão ganhou corpo depois de o Guia Alimentar para Crianças Brasileiras Menores de 2 anos, do Ministério da Saúde, abrir uma brecha para o uso de leite de vaca a partir desta faixa etária. Lançado semana passada, o documento diz ser possível substituir a fórmula infantil por leite de vaca, a partir de 9 meses, caso os bebês já não recebam o aleitamento materno e seja difícil o uso de fórmulas.

A orientação provocou uma reação imediata da Sociedade Brasileira de Pediatria. Nesta quinta, a entidade encaminhou para o Ministério da Saúde um comunicado questionando e pedindo mudanças no guia, sob o argumento de que o leite de vaca na dieta dos bebês nesta idade pode causar complicações, comprometer o crescimento e o desenvolvimento.

'O documento traz recomendações muito importantes sobre o aleitamento materno, é muito bem feito', afirma Virgínia Weffort, da Sociedade Brasileira de Pediatria. 'Mas, ao mesmo tempo, inclui orientações sobre o uso de leite de vaca que não concordamos.'

Virgínia afirma que o leite de vaca tem altos teores de proteínas e sua ingestão em bebês compromete o metabolismo, aumenta o risco de obesidade e sobrecarrega os rins. Para a sociedade, o essencial seria que bebês que não podem receber aleitamento materno exclusivo tivessem acesso a fórmulas infantis.

Diretora do departamento de promoção à saúde do Ministério da Saúde, Lívia Salles afirma que o documento lançado semana passada pela pasta é fruto de mais de dois anos de discussão e que, em nenhum momento, recomenda o uso do leite de vaca como primeira opção.

'A cartilha foi feita para contribuir com o desenvolvimento de estratégias que promovam uma dieta saudável e equilibrada. Mas ela deve ser feita de acordo com a realidade do País', argumenta. Lívia conta que pesquisas realizadas mostram que 60% dos bebês brasileiros com menos de seis meses e 74% dos bebês maiores de seis meses já tomam leite de vaca. Isso se deve, sobretudo ao alto preço das fórmulas infantis. Nem todas as famílias do País conseguem arcar com o custo deste tipo de alimentação e acabam, portanto, mesmo sem recomendação médica, recorrendo ao leite de vaca.

Lívia diz que, diante dessa realidade, a equipe de consultores procurou deixar claro no manual as melhores formas do uso do leite de vaca, quando fórmulas infantis ou o aleitamento não podem ser realizados. Nos casos de bebês a partir de quatro meses, o leite tem de ser diluído em água. Para maiores de 9 meses, o produto pode ser incluído na alimentação, mas dentro de um cardápio equilibrado.

A diretora argumenta que o Brasil não está sozinho na recomendação do uso de leite de vaca. O guia alimentar do Canadá e o guia alimentar da Suécia já trazem essa possibilidade, a partir dos nove meses.

'E, naqueles países, a decisão não é norteada em função do preço', observa a diretora da Ministério da Saúde. Ela afirma que a pasta não cogita fazer alterações no guia em função das críticas feitas pela sociedade de pediatria. Lívia acrescenta ainda o argumento de que a Organização Mundial da Saúde recomenda que todas as cartilhas feitas por organismos públicos têm de levar em consideração a realidade do País.

Compostos lácteos

A nutricionista do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) Ana Paula Bortoletto Martins avalia que o leite de vaca, de fato, não é a primeira opção para se incluir na dieta de bebês. 'Entendo as queixas feitas pela Sociedade Brasileira de Pediatria, mas o documento do ministério também deixa claro que a prioridade é o aleitamento materno exclusivo. E que fórmulas viriam em segundo lugar', completa.

Ana Paula, contudo, chama atenção para outro risco quando não se dá alternativa para famílias: o uso inadvertido de compostos lácteos como se fossem fórmulas infantis. Esses compostos estão dispostos nas prateleiras de farmácias e supermercados ao lado de fórmulas infantis. As embalagens são muito parecidas, mas o preço é muito menor.

'Muitas famílias, sem informação adequada, acabam se valendo destes preparados, na ilusão de que estão comprando o melhor para seus filhos. Como se fosse uma fórmula, mas mais barata', diz. Tais compostos, embora sejam muito mais baratos, levam em sua composição 51% de leite. Trazem ainda uma boa porção de açúcares e são enriquecidos com alguns vitaminas. 'Eles estão longe de ser um alimento adequado para bebês e crianças', diz.

Esses compostos, por terem registro no Ministério da Agricultura, não são ainda sujeitos às regras que controlam a publicidade. E, justamente por isso, muitas vezes trazem brindes ou promoções de descontos. O guia faz um alerta para esses compostos, mostrando que eles estão longe de ser um substituto para fórmulas infantis.

Além das críticas às referências ao leite de vaca, Virgínia conta que a sociedade discorda das recomendações feitas à formulação de papinhas para bebês. O guia permite o uso moderado de sal nestas refeições. A pediatra afirma, no entanto, que o ideal seria que nenhum sal fosse adicionado à dieta até um ano de idade.

'Recomendamos o uso moderado, estudos mostram não haver prejuízo com essa prática', afirma a diretora do ministério.
Por Lígia Formenti, em O Estado de S. Paulo

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quinta-feira, 21 de novembro de 2019

Folia de Reis é declarada patrimônio cultural imaterial de Minas Gerais


O Conselho Estadual de Patrimônio de Minas Gerais aprovou o reconhecimento da Folia de Reis como patrimônio cultural imaterial do estado. A manifestação cultural e festiva, celebrada anualmente por católicos, ocorre geralmente no dia 6 de janeiro. Esta data, na tradição cristã, marca o aniversário da visita dos três reis magos ao recém-nascido Jesus Cristo.


Belchior, Gaspar e Baltazar, convertidos em santos pela Igreja Católica, teriam saído do Oriente se guiando por uma estrela e levavam três presentes: ouro, incenso e mirra. Para os devotos, a data da chegada dos reis magos ao destino final é quando se encerram os festejos natalinos, que começam quatro domingos antes do 25 de dezembro, dia atribuído ao nascimento de Jesus Cristo.
Dessa forma, no dia 6 de janeiro são desarmados os presépios, as árvores e os demais enfeites.
Desfiles
É também nesta data que os católicos de algumas regiões do Brasil se mobilizam na Folia de Reis, chamada ainda de Reisado ou Festa de Santo Reis, entre outros nomes. Os participantes dessa manifestação cultural e festiva entoam diversas canções e rezas em homenagem aos três viajantes santificados. Os foliões passam de casa em casa em coro e são recebidos em cada uma delas com comes e bebes típicos e outras oferendas.
Em cada local, há também particularidades, como encenações dos reis magos, desfiles, danças, repertórios, instrumentos utilizados e roupas. Minas Gerais é um dos estados onde a Folia de Reis mais se faz presente, resguardando uma tradição de aproximadamente 300 anos.
Um inventário do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha-MG) realizado em 2016 cadastrou 1.255 grupos de foliões, distribuídos em 326 municípios mineiros.
Origem
Este inventário, que teve origem há pouco mais de um ano, ofereceu as bases para o reconhecimento dos festejos como patrimônio cultural imaterial de Minas Gerais.
"Foi um levantamento amplo com o objetivo de entender a origem dessa tradição no estado e também as transformações que ela sofreu, investigando como acontecia no passado e como acontece nos dias atuais. O estudo se baseou nas narrativas dos próprios participantes", informou Michele Arroyo, presidente do Iepha-MG.
O estudo cadastrou também manifestações que ocorrem em outras datas e que prestam outras homenagens, como as folias de São Sebastião e da Virgem Maria. Muitos grupos, porém, ainda não foram mapeados. A estimativa do Iepha-MG é que existam cerca de 4 mil deles em Minas Gerais.
Políticas públicas
Uma das vantagens de serem considerados patrimônio cultural imaterial é a possibilidade de obterem benefícios de políticas públicas. "É uma tradição da cultura popular extremamente representativa e esse reconhecimento permitirá aprofundar um trabalho de parceria entre o governo estadual e os grupos, construindo assim uma política da salvaguarda das folias de reis", disse Michele Arroyo.
Ela explicou que o trajeto das folias de reis costuma levar em conta os locais e as casas onde foram montados presépios. Esta ano, o Iepha-MG incentivou a instalação de presépios em edifício públicos em Belo Horizonte e em algumas cidades do interior. Com o reconhecimento, este estímulo deve aumentar nos próximos anos. O órgão pretende criar um calendário de presépios e folias, de modo a aumentar a visibilidade e a divulgação.
O título de patrimônio cultural imaterial poderá facilitar ainda o apoio do estado para que os grupos comprem instrumentos musicais e confeccionem as roupas. O Iepha-MG também pretende criar espaços de formação para fomentar a integração das novas gerações, por exemplo, através de oficinas de canto e de instrumentos musicais.
Agência Brasil


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