Lentamente, a China continua sufocando a identidade do Tibete colocando
atrás das grades todos que sobem o tom para defender a própria cultura e
impondo nas escolas o mandarim para criar uma única identidade nacional na qual
a língua tibetana não tem vez.
Um dos golpes mais recentes foi a condenação, em maio, a cinco anos de
prisão do professor Tashi Wangchuk, pelo crime de "incitação ao
separatismo", apesar de ONU, União Europeia e várias ONGs pedirem sua
libertação por considerarem que a detenção ocorreu por sua defesa dos direitos
humanos.
Antes de ser preso, Wangchuk manifestou preocupação pelo fato de muitas
crianças tibetanas não poderem falar fluentemente o idioma nativo, o que
contribui para a extinção progressiva da cultura.
"O governo chinês tenta fazer nossa língua e nossa rica cultura
desaparecerem para matar a essência do povo tibetano", afirmou à Agência
Efe por e-mail o cineasta Dhondup Wangchen, exilado nos Estados Unidos após seis
anos preso na China.
Embora a Constituição chinesa diga que "todas as nacionalidades têm a
liberdade de usar e desenvolver sua própria língua escrita e falada", a
realidade é bem diferente.
Nas cidades tibetanas lojas e escritórios têm placas nos dois idiomas, mas
Wangchen contou que as autoridades estão retirando o tibetano do currículo
escolar e não estão dando permissão para a construção de novas creches.
"Há cada vez mais professores chineses nas escolas tibetanas e eles
estão tendo influência negativa nas crianças, dizendo que não terão futuro se
aprenderem o tibetano, mas, que se estudarem chinês, serão brilhantes. A China
sabe que a língua é a identidade de uma pessoa e é por isso que está tentando
fazer com que desapareça para matar a essência do povo", argumentou.
Outra estratégia para minar a identificação são as escolas Neidi xizang,
muitas delas em Pequim, para onde a criança é enviada para estudar longe da
família, entre os 11 e os 15 anos.
Neste período de "maior vulnerabilidade" dos jovens, eles tentam
"influenciar ou forçar uma cultura que não é familiar e é muito oposta à
que conhecem", disse o exilado tibetano.
Organizações como a Human Rights Watch já alertaram sobre que este tipo de
medida "agressiva" para "impor uma única identidade nacional e
promover o uso do mandarim entre os tibetanos".
Nesse cenário, o cineasta disse temer que a situação piore nos próximos
anos. Ele descreveu o país como "muito belo", mas lembrou que foi
obrigado a fugir de um lugar onde jornalistas estrangeiros e trabalhadores de
ONGs têm acesso praticamente proibido há anos.
Wangchen admitiu ter vontade de voltar, mas não com o clima político
atual, já que considera que a situação piorou muito desde que saiu de prisão.
"Tem mais militares e polícia patrulhando, e, se alguém se atreve a
se envolver em atividades políticas ou em outros assuntos que Pequim considera
sensíveis, eles dificultam a vida na hora de ir ao hospital, abrir uma conta
bancária ou viajar, por exemplo", relatou.
A condenação de Tashi Wangchuk não é um caso isolado. Outros pensadores e
religiosos continuam presos por defender a identidade dos tibetanos.
O escritor Jo Lobsang Jamyang foi condenado em maio de 2016 a sete anos e
meio de prisão. Apesar dos motivos ainda serem um mistério, suspeita-se que a
razão possa ser seus escritos criticando as políticas chinesas, conforme
explicou a organização Free Tibet à Efe.
A organização também lembrou os casos de Yeshe Choedron, Sonam Lhatso,
Khenpo Pagah, Geshe Orgyen e Thardhod Gyaltsen, presos por defender a
identidade cultural.
E a intimidação não acaba com a saída de prisão. Apesar de Wangchen ter
sido solto em 2014, ele continuou submetido a uma rígida vigilância das
autoridades. No final do ano passado, conseguiu fugir da China e pediu refúgio
nos Estados Unidos, onde a mulher e os filhos já tinham conseguido asilo
político.
Seu crime? Fazer o curta-documentário "Leaving Fear Behind"
("Deixando o medo para trás"), no qual entrevistou sem autorização
oficial cerca de 100 tibetanos e depois distribuiu o material entre os
jornalistas estrangeiros que cobriam os Jogos Olímpicos de Pequim, em 2008.
Por Jèssica
Martorell, na EFE.