quinta-feira, 29 de março de 2018

Relatório da OCDE aponta dificuldades educacionais de estudantes imigrantes


Um amplo estudo realizado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) mostrou que as desvantagens socioeconômicas e as barreiras linguísticas são os maiores obstáculos ao sucesso na escola para estudantes de famílias de imigrantes. O documento é lançado em um momento no qual o fenômeno da migração atinge mais de 258 milhões de pessoas em todo o mundo.
relatório, intitulado The Resilience of Students with an Immigrant Background: Factors that Shape Well-Being (A resiliência de estudantes de origem migrante: fatores que moldam o bem-estar, em tradução livre), mostra que as dificuldades costumam afetar particularmente os imigrantes de primeira geração - estudantes que nasceram no estrangeiro ou que têm pais nascidos no estrangeiro.
O texto aponta como os fluxos de migração estão mudando profundamente a composição das salas de aula. Os resultados do Programa da OCDE para Avaliação Internacional de Estudantes (PISA) revelam que, em 2015, quase 25% dos estudantes de 15 anos de idade nos países da OCDE eram estrangeiros ou tinham pais estrangeiros.
De acordo com a pesquisa, cerca de 50% dos alunos de origem imigrante não conseguiram atingir as habilidades acadêmicas básicas em leitura, matemática e ciências. Entre os alunos nativos, ou seja, os que não têm origem estrangeira, a proporção é de um em cada quatro.
O relatório mostrou que os estudantes imigrantes sentiam um menor senso de pertencimento na escola do que os estudantes nativos, relatavam menos satisfação e maior ansiedade relacionada com o trabalho escolar. No entanto, muitos também expressaram altos níveis de motivação para alcançar melhor desempenho.
O baixo rendimento acadêmico entre estudantes com antecedentes de imigrantes é particularmente alto na Áustria, Bélgica, Dinamarca, Finlândia, Alemanha, Luxemburgo, Eslovênia, Suécia e Suíça. Nesses países, entre os alunos que não atingiram os mínimos acadêmicos, os estudantes imigrantes que são mais do que o dobro.
Os alunos imigrantes são mais propensos a frequentar escolas com um pior clima disciplinar e uma maior prevalência de faltas. Além disso, são mais propensos a serem vítimas de bullying e serem tratados de forma injusta pelos professores.
Tudo isso contribui para diferenças entre estudantes nativos e imigrantes no desempenho acadêmico e no bem-estar. No entanto, muitos estudantes imigrantes informam que seus professores proporcionam suporte adicional, uma indicação da vontade dos professores de apoiá-los efetivamente.
A língua também é determinante. Os alunos imigrantes que não falam a língua do país em suas próprias casas têm resultados piores no teste PISA do que os estudantes imigrantes que falam a língua nativa.
O relatório fornece ainda uma análise aprofundada dos fatores de risco e proteção que podem prejudicar ou promover a resiliência dos estudantes imigrantes. Ele explora o papel que os sistemas educacionais, escolas e professores podem desempenhar para ajudar esses alunos a se integrarem às suas comunidades, superar adversidades e construir uma vida acadêmica, social, emocional e motivacional.
De acordo com o estudo, os professores têm um papel fundamental a desempenhar para ajudar os alunos a se adaptarem em suas salas de aula e na sociedade em geral. Eles devem receber mais apoio e treinamento para lidar com aulas cada vez mais multiculturais, abordando o bullying e envolvendo pais de estudantes imigrantes.
Os 35 países-membros da OCDE são: Áustria, Bélgica, Dinamarca, França, Grécia, Islândia, Irlanda, Itália, Luxemburgo, Noruega, Países Baixos, Portugal, Reino Unido, Suécia, Suíça, Turquia, Alemanha, Espanha, Canadá, Estados Unidos, Japão, Finlândia, Austrália, Nova Zelândia, México, República Tcheca, Hungria, Polônia, Coreia do Sul, Eslováquia, Chile, Eslovênia, Israel, Letônia e Estônia. O Brasil não é membro, mas é um país parceiro da OCDE.
EBC


quarta-feira, 28 de março de 2018

Os anti-heróis de toga


Lula tinha razão (e a sua crítica merece ser ampliada)

Lamento, mas não considero razoável analisar os votos dos ministros no Supremo Tribunal Federal como se esses fossem balizados, sobretudo, por premissas técnicas. O que é uma pena. Seria melhor viver em um país cuja máxima Corte respeitasse a Constituição e, em casos como o da última quinta-feira, a sua própria jurisprudência. A realidade, contudo, é assaz madrasta. Aquela que deveria ser a guardiã da magna-carta, fonte de temor para os corruptos e de segurança para os cidadãos, há tempos não se mostra capaz de exercer o seu papel.
Ou melhor ainda, como disse Luís Inácio antes de ser agraciado com uma combinação entre desfaçatez e problemas de agenda, está totalmente acovardada. E agora? Que caminho seguir?
Honestamente, quanto ao STF eu não faço ideia, embora pareça cada vez mais óbvia a necessidade de mudanças no seu processo de formação. Ao longo da própria quinta-feira passada, enquanto a parvalhice de Rosa Weber sustentava a habitual devoção ao petismo por parte de Ricardo Lewandowski, o senador Lasier Martins (PSD-RS) defendia algumas opções: a indicação de futuros ministros teria origem em uma lista tríplice a ser analisada por um amplo colegiado, este formado pelos presidentes dos mais importantes tribunais (STF, STJ, TST e TCU, além do PGR). E os mandatos teriam duração limitada em dez anos. A PEC (Proposta de Emenda Constitucional) de sua autoria já está pronta. Aguardando na fila.
De todo modo, mesmo com a promoção de reformas que dificultem o compadrio testemunhado durante os últimos anos no Supremo, incluindo aí toda sorte de destemperos, pronunciamentos inadequados e um nível de promiscuidade ultrajante junto à classe política, não faz sentido imaginar que passaríamos a viver uma realidade muito diferente da atual. Não quando uma considerável parte dos cidadãos defende seus próprios algozes a ponto de desejar que eles sejam bafejados pela impunidade. Não quando até aos mais ponderados falta a firmeza necessária para dizer as coisas como elas são.
Durante entrevista concedida sexta-feira de manhã à Jovem Pan, portanto horas após ter mediado um seleto grupo de brasileiros que decidiu tratar de maneira especial quem não deveria ser diferente, Cármen Lúcia afirmou que a divisão no STF se reflete na sociedade. Devo admitir, não é de hoje que as frases de efeito regularmente pontuadas pela presidente do tribunal, como pretensos torrões de açúcar a adoçar as nossas existências, provocam em mim mais bocejos do que esperança. Dessa vez, entretanto, ela foi certeira: especialmente no que diz respeito a Lula, de fato a condescendência e mesmo a simpatia que grande parte dos ministros nutrem por ele também se repete aqui fora.
E pouco importa se esse xodó acaba por legitimar uma troca de favores entre castas somente preocupadas com a preservação do sistema. Pouco interessa se outros condenados por corrupção tendem a se aproveitar das concessões herdadas desse impróprio sentimento.
No fim das contas, não há outra saída. Ou deixamos de lado esse apego por mitologias ou o combate à corrupção se tornará cada vez mais inglório.
E seremos, então, merecedores de um lugar na mesma prateleira dos nossos anti-heróis de toga.

Mario Vitor Rodrigues, em O Estado de S. paulo