domingo, 13 de junho de 2010

Vamos substituir os computadores por réguas de cálculo?

Para os mais dados à observação sempre esteve claro que alguma coisa não vai bem.

Sim, é verdade, não há quem não veja o esforço nacional pra dotar as escolas de melhores condições tecnológicas, sobretudo de computadores. Participa deste esforço não apenas o governo, mas também a sociedade organizada, empresas e fundações privadas, nacionais e internacionais.

O PC e a rede mundial de computadores são instrumentos imprescindíveis no mundo moderno. Estão para a vida contemporânea como a água e o alimento estão para o peixe. Definitivamente, não há como navegar pelo século XXI mantendo-se ao largo das tecnologias de informática, sobretudo quando o foco é o ensino, a educação.

Que educador em sã consciência pode ignorar ou desdenhar a importância do computador e da internet no aprendizado dos alunos? A praticidade, racionalidade, eficiência; o acesso ilimitado a dados e informações, o livre ingresso para freqüentar e desbravar universos antes intangíveis, a irrestrita disponibilidade de obras clássicas, acervos seletos e das melhores bibliotecas dos EUA e da Europa, tudo isso possibilitado pela existência da WEB. É o mundo na tela de um simples monitor.

Em que pese a velocidade muito menor que a necessária, nossas escolas têm se adequado às demandas dos novos tempos. Investem na atualização dos hardwares, em redes, softwares e aplicativos mais eficazes, instalam espaços e laboratórios para otimizar a utilização, democratizar o conhecimento, promovem oficinas... E tudo parecia correr conforme o planejado até que começaram a surgir aqui e ali – ainda que de maneira assistemática, tímida e dispersa – estudos alertando que, ao contrário de ajudar, os computadores estão atrapalhando a vida dos estudantes brasileiros.


- Mas como pode? É uma aberração, um acinte, uma aleivosia - apressaram-se em bradar os ‘entendidos’.

- Um computador, qualquer que seja a circunstância, jamais será um entrave para um estudante, esteja no Brasil, esteja na Cochinchina – completaram outros ‘especialistas’ ostentando a empáfia característica dos que acreditam que o mar se limita à crista das ondas.

Por outro lado, os adeptos das práticas conservadoras e avessos a tudo o que soe modernidade, não ficaram para trás:

- Com ábacos e os antigos instrumentos os alunos aprendem mais – e concluem frenéticos. – Vamos substituir os computadores por réguas de cálculo.

Este é um caso em que os ‘entendidos’ e os avessos à modernidade estão errados. Completamente errados.

Pois o Ministério da Educação acaba de divulgar uma pesquisa demolidora sobre o assunto: a instalação de computadores, redes virtuais e laboratórios de informática em nossas escolas não têm agregado qualidade à educação, ao contrário, tem piorado o já deplorável ensino brasileiro.

Se o caro leitor acredita que a conclusão do MEC sobre o impacto do uso do computador em nossas escolas é de nocautear, então durma com essa: os alunos que costumeiramente utilizam o computador na escola estão seis meses atrasados nas disciplinas quando cotejados com os que não tem acesso ao equipamento.

Para alcançar este diagnóstico os pesquisadores do ministério, utilizando as três últimas edições do Saeb – o exame aplicado para avaliar o ensino básico – lançaram mão dos modelos estatísticos mensurando o impacto da utilização do computador no aproveitamento pedagógico dos estudantes com acesso ao PC. E não custa registrar que nada menos que 38% das escolas públicas brasileiras contam com computadores instalados.

A questão central é que o aluno, sem um professor capacitado para guiar seus passos neste novo mundo, fica a mercê do efêmero, da mera diversão, e utiliza o tempo - que deveria destinar às tarefas, trabalhos escolares e aos estudos - para se aprimorar nos jogos virtuais ou esquentar conversa nos sites de relacionamentos, salas de bate-papos e similares.

Portanto, nem tanto o céu, nem tanto a terra. O PC não deve ser encarado como uma panacéia, mas também não deve ser subestimado. É obvio ululante que – no devido contexto – está a milhares e milhares de anos-luz da régua de cálculo utilizada por nossos avós.

Tão importante quanto prover as condições materiais e assegurar a instalação de wardwares e softwares em nossas escolas, é garantir um processo de educação específica para o professor. Só assim nosso estudante terá um supervisor habilitado para auxiliá-lo na travessia, no domínio e na conquista da nova tecnologia. Muitos de nossos educadores sequer conseguem ligar um computador e muitos outros nem se preocupam em esconder a aversão pelas novas tecnologias, sejam relacionadas à informática ou não. Refugam o novo como o diabo refuga a santa cruz.

Os países desenvolvidos conseguem extrair o máximo da relação tecnologias de informática/estudantes porque – além de investir no meio físico – investem também no professor, capacitam-no entusiasticamente e o utilizam para monitorar e supervisionar a incursão dos alunos pela rede.

É um modelo antigo, simples, exitoso e eficaz. Mas que as autoridades brasileiras só agora começam a se dar conta. Se existe algum consolo, vale um antigo ensinamento de nossos avós: antes tarde do que nunca.

Artigo publicado no portal da Associação dos Professores de São Paulo