segunda-feira, 18 de maio de 2020

Despolitizar o Enem



Na semana passada, enquanto alunos começavam a se inscrever para o Enem, diversas entidades mobilizavam esforços para garantir que estudantes tenham mais tempo para se preparar para a prova. O Ministério Público Federal divulgou nota técnica afirmando que a manutenção das datas violava direitos dos alunos. O Tribunal de Contas da União, a partir de uma representação movida pelos deputados Idilvan Alencar (PDT-CE) e Tulio Gadêlha (PDT-PE), elaborou parecer favorável ao adiamento, argumentando que os efeitos da pandemia acentuam desigualdades na educação. Reitores de universidades públicas também se posicionaram, reforçando as mesmas preocupações levantadas desde o início por secretários estaduais de educação.

No momento em que o mundo enfrenta uma das mais graves crises da História, todos os esforços no campo da educação deveríam estar focados em ações para amenizar os efeitos da suspensão das aulas presenciais entre os alunos mais vulneráveis. No entanto, a postura insensata do ministro da Educação, Abraham Weintraub, de fazer das datas do Enem uma questão de disputa política leva a sociedade a gastar energia desnecessária num tema que poderia ser tratado de forma técnica.

E assim que está acontecendo no resto do mundo. Na maioria dos países onde há provas similares ao Enem ninguém está perdendo tempo com questões como essa, pois os governos já sinalizaram que vão alterar os exames de acesso a universidades para minimizar prejuízos aos estudantes. Vários j á adiaram as datas ou ao menos sinalizaram para a sociedade que isso será feito. Outros, caso do Chile, optaram por adaptar a prova excluindo conteúdos que estavam previstos para o último ano do ensino médio.

O argumento óbvio para adiar o Enem é que a suspensão das aulas presenciais prejudica de forma mais intensa jovens de menor renda. Na quinta-feira passada, um levantamento feito pela repórter Angela Pinho na Folha de S. Paulo mostrou mais uma evidência disso. Mesmo em São Paulo, estado mais rico da federação, menos da metade dos alunos conseguiu acessar um aplicativo da Secretaria estadual de Educação que fornecia conteúdo didático com internet gratuita para os estudantes.

Ainda não sabemos quando as aulas presenciais poderão ser retomadas. Quando isso acontecer, será necessário um esforço adicional das redes estaduais de ensino para identificar lacunas de aprendizagem que poderão prejudicar os alunos que farão o Enem. A definição das datas do exame deveria levar em consideração principalmente o tempo mínimo necessário para preparar os jovens para as provas. Por isso é tão importante o diálogo com os secretários de Educação e com as universidades, que também terão que estar prontas para receber esses alunos no ano que vem em seus campi.

Para estudantes do ensino fundamental ou dos primeiros anos do ensino médio, os prejuízos de aprendizagem poderão ser revertidos com políticas adequadas ao longo deste e dos próximos anos letivos. Os jovens que estão no último ano da educação básica não têm esse tempo.

O argumento óbvio para adiar o Enem é que a suspensão das aulas presenciais prejudica de forma mais intensa jovens de menor renda.

Por Antônio Gois, em O Globo







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