sexta-feira, 19 de outubro de 2007

O Brasil e sua guerra sanguinária

O Estado de Israel já nasceu mergulhado numa guerra com os países árabes, um conflito sem tréguas, e por isto o esforço da nação está permanentemente focado em suas defesas, na vigilância de suas fronteiras, na diuturna modernização de suas forças militares.

Apesar de comprometer a maior parte de suas energias num colossal esforço de guerra, Israel compromete 8,4% do Produto Interno Bruto em investimentos no setor educacional. Faz assim porque desde sempre compreende que o conhecimento, o know how, a educação, é o patrimônio maior de qualquer povo, o grande insumo capaz de garantir estabilidade social e – ante vital necessidade - a manutenção de sua superioridade política, econômica e militar sobre os demais atores regionais.

O Brasil não está em guerra. Pelo menos não em guerra convencional. Não sofre ameaça dos vizinhos, não precisa tensionar e convergir seus esforços para a área militar, e, portanto, deveria ter o devido discernimento para estabelecer melhor as prioridades, alocando maiores parcelas para investimentos estratégicos e estruturais. Não é o que ocorre, todos sabemos. Num exemplo categórico, investe tão somente 2,9% do PIB em educação. Considerando o ensino superior, o índice chega, cambaleante, a 3,9%. Menos da metade do que investe Israel. Menos da metade do que investe um país mergulhado em um sangrento conflito de 40 anos.

A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE – divulga, a cada ano, o relatório Education at a Glance. Na última edição o Brasil figura com o menor gasto por aluno entre as 34 nações avaliadas. Aliás, temos vestido bem este modelito de nos sairmos em ultimo lugar nos ranking’s produzidos mundo afora, sobretudo os de âmbito internacional, que avaliam a educação e o ensino. O que muitos imaginavam - e não tão poucos sabiam - agora está comprovado e documentado, é oficial: o Brasil figura em ultimo lugar no quesito investimento em educação.

Totalizando o investido em cada aluno, do ensino básico ao superior, o valor gira nem torno de R$ 1.303,00.

Os Estados Unidos gastam anualmente U$ 12 mil por aluno e a Suíça e Noruega chegam a aplicar dez vezes mais que o Brasil. Entendem por que são países desenvolvidos?

Poderiam argumentar os mais governistas, EUA, Noruega e Suíça são países desenvolvidos e não dá para estabelecer comparações com nações deste nipe. Seria uma argumentação trágica não fosse ela tradução literal de uma insossa ópera bufa.

Que seja então, tudo bem. Mas, o que dizer de países como Chile e México, latino-americanos como o Brasil, em vias de desenvolvimento como o Brasil e com inúmeras similaridades com nosso país? Há aqui uma diferença expressiva: Chile e México não desdenham a educação como o Brasil. E por isto, numa rasa análise comparativa, fica mais que demonstrado que investem o dobro em educação, duas vezes mais que Pindorama.

Não bastasse o problema de investir o mínimo minimórum em educação – relembro ao caro leitor que estamos, entre os 34 países pesquisados, em ultimo lugar – a corrupção endêmica cuida de fazer com que o diminuto vire quase nada, o parcimonioso torne risco n’água.

A equação é ingrata, nefasta, e não está de todo completa: último colocado em investimento em educação; corrupção inclemente até mesmo com a merenda escolar (e o leite das crianças) e problemas crônicos de gestão que levam boa parte do professorado a não cumprir a jornada de trabalho, apresentando excesso de faltas e nunca menos que 30% em regime de licença, seja médica, seja por interesse particular.

O país não está em regime de guerra declarada contra uma nação estrangeira. Mas experimenta a tragédia de uma guerra interna, tão odienta e abjeta quanto a externa. Sim, a guerra que aqui se trava é outra. Não menos sangrenta, não menos injusta para os mais fracos, indefesos e excluídos. Não combatemos um inimigo que fala uma outra língua e vive em um outro território. Na guerra que aqui se trava, brasileiros exterminam brasileiros utilizando armas, às vezes, muito mais sofisticadas e mortais que as manuseadas pelos soldados israelenses. O armamento que aqui se utiliza tem o poder de excluir milhões, de mantê-los no analfabetismo, numa educação periférica e marginal, num estágio permanente de atraso e subdesenvolvimento. A guerra que aqui se trava decorre fundamentalmente da mediocridade das autoridades que, no discurso, elevam a educação à prioridade absoluta, à redentora da nação, mas que na prática diária, a vestem como mulher da vida, como amante bandida, como prostituta e meretriz.

Antônio Carlos dos Santos é criador da metodologia de Planejamento Quasar K+ e da tecnologia de produção de teatro popular de bonecos Mané Beiçudo.