quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Nossas crianças merecem mais.

O Plano de Desenvolvimento da Educação- PDE - apresentado pelo MEC no mês de abril recebeu algumas críticas profundas, contundentes, uma delas, muito importante para o ensino brasileiro: a ausência de um programa de treinamento para os estudantes de licenciatura.

Avaliando a pertinência da crítica, o Ministério da Educação tomou a decisão correta: criar um estímulo especial através da implementação de um programa de bolsas para os estudantes de licenciatura das universidades federais, sobretudo para os que cursam Física, Química e Matemática.

Nos programas de iniciação científica os alunos são capacitados e treinados em projetos didáticos desde o início dos cursos. E como esses programas têm alcançado resultados satisfatórios, a idéia é repetir a receita.

No Brasil, desde sempre, ocorre no ensino superior uma distorção das mais graves, difícil de entender, e que traz consideráveis prejuízos ao país: todo o sistema privilegia o bacharelado e não a licenciatura. Muitas vezes professores não conseguem ministrar aulas de forma instigante e inteligente porque não receberam formação adequada para isso.

O Ministro da Educação, Fernando Haddad, viu na medida uma oportunidade para que a própria instituição que dirige mude alguns de seus paradigmas. E neste sentido foi bastante enfático. Disse o ministro: “Essa situação retrata um pouco o que era uma visão existente, de se apoiar a educação voltada para a pós-graduação e desassistir a educação voltada para o curso básico”.

Se a educação brasileira já nasceu mergulhada em problemas, as áreas das ciências jamais escaparam do lamaçal. É o Conselho Nacional de Educação que numa projeção, de certa forma, bastante otimista, estima que o déficit de professores para o curso básico já ronde a casa dos 250 mil professores. E não paira qualquer dúvida que estes números incidem, sobretudo, nas áreas de ciências.

A experiência que tem servido de modelo para o Ministério é o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica, o Pibic. Hoje, este programa atende os bacharelados oferecendo aos alunos de graduação uma bolsa para atuar em um projeto de pesquisa. Orientados por um professor da instituição, alunos da pós-graduação também participam do processo. Com isto, o aluno da graduação já se vê mergulhado no contexto e, desde os primeiros instantes, se interessa pelo desenvolvimento de pesquisas científicas.

Como verificamos, as coisas não são tão difíceis como alguns apregoam. Não se trata de reinventar a roda ou revolucionar coisa alguma. Trata-se simplesmente de dar fluxo à análise crítica, vazão à lógica, de ter o cuidado e a inteligência de observar o que está dando certo – muitas vezes mantido na obscuridade exatamente por estar disponível e ao lado!

O novo programa em gestação no MEC já tem nome, Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência- Pibid - e estimulará os projetos de desenvolvimento do ensino e da didática. Como seu congênere-inspirador, também terá a orientação dos professores. Para verticalizar e torná-lo mais próximo da realidade, o Ministério planeja estabelecer um link entre esses projetos e as escolas públicas, fazendo com que as universidades federais interajam mais com o sistema público de ensino.

Todo este novo processo encontra-se em fase de estruturação, mas deve ser implantado já no ano que vem. No momento, o MEC está definindo os critérios para a seleção dos projetos e como se operacionalizará a relação com as escolas públicas.

Enquanto as bolsas de graduação do Pinic são concedidas pelo Conselho Nacional de Pesquisa, o CNPq do Ministério da Ciência e Tecnologia, as bolsas do Pibid serão financiadas pelo próprio MEC, e seu valor deve se situar ao redor de R$ 300,00.

Eis aí uma bolsa para treinar os estudantes para um desafio por demais importante, mas sempre relegado a um enésimo plano: dar aulas.

Encantar os alunos, tornar as aulas um ponto de encontro, um espaço privilegiado para o aprendizado e a reflexão crítica, não é para quem deseja simplesmente. Mas para aqueles que se esforçam, para os que receberam preparação suficiente, adequada.
Ainda que tardiamente, o MEC está se mobilizado para ensinar às Universidades que o ensino não deve se limitar – e sequer privilegiar - a pós-graduação. E que formar professores capazes, criativos, hábeis e perspicazes é uma das etapas mais que necessárias para modificar o processo de insolvência do ensino básico brasileiro.

Os pequeninos que amanhã conduzirão os destinos do país estão começando mal porque aprendem com professores desinteressados e mal preparados. O novo programa é um passo na longa caminhada para corrigir esta perversa distorção. Mas como ensina o antigo ditado oriental: “uma jornada de mil milhas se inicia com o primeiro passo”.

O fato é que nossas crianças merecem mais, muito mais. O Brasil e os brasileiros merecem mais, muito mais.

Artigo de Antônio Carlos dos Santos publicado na Revista Bula