O Brasil é uma república singular. Um marciano que eventualmente surgisse do espaço sideral, pousando sua nave neste país continental, por certo teria grandes dificuldades para compreender esta nação onde os contrastes estão como chaga aberta.
Por aqui convivem, lado a lado, o desenvolvimento auto sustentável da Suécia, com a miséria insidiosa e inaceitável do Gabão. De um lado, o país que exporta aviões a jato para os EUA e demais potências desenvolvidas; e no mesmo lado, este mesmo país a apresentar indicadores sociais de corar o mais indecente dos mortais.
Aqui a pujança econômica eleva o Brasil à posição das maiores economias do planeta, e a injustiça social remete este rincão à posição de uma das nações de maior concentração de renda do mundo.
Como que para coroar o descompasso da nação tupiniquim, a UNESCO e a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) divulgaram – e já faz um certo tempo - a pesquisa denominada Literacy Skills for the World of Tomorrow, colocando o Brasil como o penúltimo, dentre 41 países, no quesito desempenho escolar.
Os dados desnudam uma realidade estarrecedora. A pesquisa enfocou a categoria de estudantes na faixa etária de 15 anos. Ao se estabelecer o ranking, nossos estudantes ficaram com o penúltimo desempenho nas áreas de matemática e ciências, e em 37º em leitura. Quando se apurou a média do conjunto das três disciplinas, o Brasil ficou com a vice-lanterna, ou seja, em penúltimo lugar, ultrapassando apenas o Peru.
No instante em que o Ministério da Educação implementa um arrojado programa de erradicação do analfabetismo, os dados colhidos através do Programa Internacional de Avaliação do Estudante evidenciam que metade dos alunos brasileiros de 15 anos de idade, está abaixo do nível 1 de alfabetização. Nesta escala, desenvolvida pela UNESCO, se obtém a classificação dos estudantes que apresentam dificuldades em utilizar os instrumentos da leitura para aumentar seus conhecimentos e competências em outros assuntos, correlatos ou não.
Em matemática e em ciências, os países que obtiveram as melhores posições foram Hong Kong e Coréia do Sul respectivamente. Em leitura, pela pesquisa ocupava o primeiro lugar no ranking dos melhores colocados, a Finlândia.
É importante destacar que até cerca de 40 anos atrás, o Brasil figurava num posto similar ao da Coréia, com níveis de desenvolvimento econômico e social semelhantes. Mas graças às mazelas de nossas elites dirigentes, fomos ficando para trás, cada vez mais para trás, bem mais para trás. Ao ponto em que, enquanto a Coréia ultrapassa importantes países como Japão, Reino Unido, Estados Unidos, França, Suíça e Alemanha; o Brasil consegue ser superado nesta corrida até mesmo pelos vizinhos de continente: México, Chile e Argentina.
Infelizmente criamos um vício nefasto de nos colocarmos sempre no centro do mundo, imaginando ser Deus brasileiro e que, com um jeitinho, tudo acaba por se ajeitar. Todas as pesquisas internacionais que avaliam o ensino no Brasil são como jato de água fria ou óleo escaldante.
Desde sempre conhecedor desta atroz realidade, o ex-ministro da educação, Cristóvan Buarque, tensionou o governo Lula o quanto pode, clamando por mais verbas para os projetos de sua pasta. Foi demitido pelo telefone. Por diversas vezes ouvira do Presidente da República o conselho de ir mais devagar com o andor. Não houve alternativa para o ex-ministro: as câmaras de TV flagraram ao vivo e a cores o desconforto e o jeito sem graça. Depois de – por toda a vida, ter ouvido esta heresia, primeiramente dos militares golpistas e depois dos “neoliberais tucanos vendidos ao capital estrangeiro”, agora passava pelo vexame de ouvir a orientação leniente do próprio presidente, o líder operário de longas jornadas e que ajudou a eleger.
“Mas, como mais devagar?” Teve vontade de responder várias vezes o ministro ao presidente. “Historicamente temos andado a passos de tartaruga”, imagino ter confidenciado ele aos seus botões. Mas nada falou. Não restou alternativa senão a resignação.
É necessário impregnar ao nosso desenvolvimento a velocidade da Coréia do Sul. Salta aos olhos que metade dos nossos estudantes adolescentes, pela escala da UNESCO, ainda não tenham rompido a fase da alfabetização.
É necessário direcionar todas as nossas atenções, com todo o carinho e energia para resolvermos a questão da educação no país. Muitos passos importantes foram dados, mas de todo insuficientes. É isto que todas as pesquisas estão a sinalizar, uivar, tangir, gritar. O velho ditado de que a vaca pode ir para o brejo já não faz sentido porque a vaca já está atolada até o pescoço.
O senador Cristóvão tem estimado um tempo de cerca de 25 a 30 anos para que possamos zerar este placar. É tempo demais. Um tempo que não temos. Um tempo inadmissível. A sociedade deve entender isto de maneira categórica para que assim se estabeleça um ambiente de intensa pressão sobre o governo. Para situação de crise como esta, urge uma política específica e emergencial.
Pressionado pelas conquistas soviéticas na corrida espacial, os EUA estabeleceram um prazo de dez anos para que colocassem o pé na lua. Muitos não acreditaram no cumprimento da meta. Não foram poucos os que utilizaram o assunto como mote para piadas e chacotas. Mas estabelecido o desafio, todo o esforço do país se concentrou no foco, no ponto planejado.
O exemplo deve nos motivar, nos guiar para respondermos a este desafio. Se não entendermos a emergência e gravidade da crise que degenera nosso sistema educacional, seguramente seremos surpreendidos por um amanhã sombrio, um futuro desolador.
Antônio Carlos dos Santos criou a metodologia Quasar K+ de Planejamento Estratégico e a tecnologia de produção de teatro popular Mané Beiçudo.