quinta-feira, 26 de novembro de 2015

Lobão busca rigor e misericórdia em novo livro, que inclui capítulo em homenagem a Olavo de Carvalho

Lançamento no Rio aconteceu na segunda, na Travessa do Shopping Leblon


O cantor Lobão lançou na segunda-feira no Rio de Janeiro o livro “Em busca do rigor e da misericórdia”, título colhido na leitura de um texto de Olavo de Carvalho, a quem presta uma bela homenagem no capítulo 6.

“Dois dos cacoetes frequentes entre os ruidosos detratores do Olavo são a invariável fuga do debate com ele e a recusa peremptória em ler o que escreve. Intelectuais de esquerda não leem autores que se oponham ao ideário esquerdista, o que expõe o avançado processo de autofagia em que se encontram, como o cachorro atrás de seu rabo, numa regurgitação sistemática de assertivas sobre suas convicções, sem a menor possibilidade de visitação ao contraditório. Todos agem naquele célebre formato: não li, não quero ler e tenho raiva de quem leu. Daí essa atmosfera inalienável de masturbação impotente a que tanto me refiro”, escreve Lobão.

Embora os detratores do cantor certamente também prefiram não ler seu novo livro, seguem abaixo o convite do lançamento e o texto editorial da orelha para aqueles que, como Lobão, têm a coragem de buscar conhecimento para embasar suas opiniões, aprimorar suas criações e tornar-se uma pessoa melhor, sem deixarem de se divertir, é claro, durante todo o processo.

É sempre rigorosamente divertido, de fato, ler o misericordioso Lobão.


“O homem está há pelos menos três anos exposto a um dos mais bárbaros processos de simonalização da história do Brasil, enfrenta essa campanha criminosa com coragem e espírito público, sobe nos carros de som para discursar contra o autoritarismo para milhares de pessoas nas ruas, e, no entanto, chega em casa, entra em seu estúdio e cria, compõe, anota, toca, escreve, lê, grava. Sozinho com seus gatos.

Isto é Lobão.

A solidão é a chave deste livro, que narra, em tempo real, sem omitir fraquezas nem minimizar o clima exterior pesadíssimo, o processo de materialização – desde a concepção até a realização – de um projeto ambicioso e há muito desenhado pelo artista escritor: o de compor, arranjar, tocar e gravar um disco rigorosamente sozinho.

É na exploração literária desse choque altamente produtivo entre atividade pública e vida interior que está a grandeza sublime deste ‘Em busca do rigor e da misericórdia’. Lobão é um coerente – ser raríssimo. As brigas que compra na vida pública hoje – e que não faltam a este relato amoroso – são as mesmas de trinta, quarenta anos atrás. Ele não mudou. É o mesmo cara de sempre, inconformado, livre, incondicionalmente comprometido com o contraditório, com o dissenso, indivíduo que não abre mão do humor e da linguagem muito peculiar – que sofistica o desbocamento – através da qual explora a ironia, o deboche, a provocação. A novidade – de que este livro é extraordinário fruto – talvez seja o espaço maior que dá ao pensamento, à meditação, à reflexão profunda, razão pela qual idealizou e montou para si, em seu estúdio caseiro (importante personagem desta narrativa), um microcosmo de solidão criativa perfeita e absoluta.

Neste livro, marco da evolução de um artista completo, Lobão reflete sobre a necessidade – o impulso – de trabalhar sozinho, de produzir sozinho, de estar sozinho, e ao mesmo tempo sobre o ambiente mental, de maturidade mesmo, que o levou valorizar, mais do que nunca, o convívio da família. A passagem na qual aborda as condições em que construiu para (contra) si a carapaça de personagem assustador e maldito, por meio da qual se pretendia proteger, é obra-prima representativa dos altíssimos graus de honestidade, abstração e consciência abrigados nestas páginas.

Das mais baixas mentiras, das piores covardias e traições, das violências e ameaças as mais inacreditáveis, de toda a carga de intimidação que lhe tentam pesar, de toda essa pedreira Lobão extrai grande arte – grande música, grande livro. É espantoso. Mas a leitura deste ‘Em busca do rigor e da misericórdia’ não deixa mesmo dúvida: não importa a sordidez mobilizada contra si, tudo – ao menos em Lobão – resulta em criação.”


Por Felipe Moura Brasil, na revista Veja