domingo, 30 de janeiro de 2022

Atormentada pelo Holocausto, israelense ajuda afegãos que fogem do Talibã

Inbar Nacht, fundadora da ONG israelense Nacht Philanthropic Ventures, em entrevista com a AFP em Tel Aviv (AFP/JACK GUEZ)

Quando Inbar Nacht viu no ano passado as imagens de famílias afegãs tentando desesperadamente fugir de seu país, pensou em seus familiares assassinados durante o Holocausto e se mobilizou para ajudar centenas de pessoas a abandonar o Afeganistão dos talibãs.

 

Há dois anos, Nacht, advogada israelense, e seu marido Marius, que fez fortuna na alta tecnologia, criaram uma ONG, a Nacht Philanthropic Ventures, para ajudar pessoas idosas ou com deficiência em Israel, afetadas pela pandemia, e apoiar projetos artísticos.

Retirar as famílias do Afeganistão, um país que não tem relações diplomáticas com Israel, não fazia parte dos objetivos de sua associação.

Mas em entrevista à AFP em sua casa de Tel-Aviv, Nacht explicou que, como descendente de judeus perseguidos e assassinados pelos nazistas, não podia "permanecer indiferente a essas imagens de pessoas que tentavam fugir com seus filhos".

"Isso fez minha identidade judaica vibrar profundamente", disse no mesmo dia internacional da memória do Holocausto, celebrado nesta quinta-feira (27).

"Tentei imaginar meus antepassados nessa situação" e o que teria acontecido com eles "se pessoas de outros países tivessem ajudado".

"Isso faz parte da nossa história como judeus (...). Pouco importa se são do Afeganistão ou de outros lugares, são civis inocentes que se encontram em uma situação impossível (...). Tentamos ver como podíamos ajudá-los", explica a mulher, que não descarta a possibilidade de ajudar pessoas de outros lugares em situações parecidas.

Salvar vidas

O aeroporto de Cabul foi tomado de surpresa em agosto de 2021 por dezenas de milhares de afegãos que tentavam fugir após a chegada do Talibã ao poder, porque se lembravam do governo cruel imposto pelo mesmo grupo nos anos 90.

A Nacht Philanthropic Ventures se mobilizou imediatamente.

Entrou em contato com um ex-soldado americano que esteve no Afeganistão, que ajudava as pessoas a chegarem no aeroporto, e com Stacia George, uma ex-funcionária da USAID, a agência americana para o desenvolvimento, que tinha uma lista de quase 300 pessoas ameaçadas e que precisavam ser retiradas, entre elas militantes dos direitos humanos, cientistas e membros de minorias.

Mas em 26 de agosto, dia no qual deveriam partir, um atentado suicida reivindicado pelo grupo extremista Estado Islâmico (EI) causou a morte de cerca de 200 pessoas no aeroporto.

Stacia George e o veterano organizaram então um transporte de ônibus para Mazar-i-Sharif, cidade ao noroeste de Cabul. A ONG ajudou a financiar a viagem, o alojamento e a segurança.

"A fundação foi incrível (...) ao proporcionar tão rápido os meios que nos permitiram salvar vidas", declarou Stacia George à AFP.

"Pura humanidade"

Em janeiro, as 278 pessoas já estavam seguras em vários lugares do mundo, segundo a ONG.

Com exceção dos funcionários da empresa de ônibus, ninguém soube que a operação foi financiada por judeus israelenses.

Entre as pessoas retiradas, Hamid, um engenheiro de 33 anos que trabalhava para o exército americano, dizia estar ameaçado pelos talibãs. Foi abrigado durante 23 dias com sua família em Mazar-i-Sharif antes de viajar para os Emirados e depois para Ruanda, país que aceitou acolhê-los.

Para este afegão, que soube depois que a operação foi financiada por uma organização israelense, foi um ato de "pura humanidade".

Inbar Nacht, que realizou a operação, "não conhecia nenhum de nós, não sabia nada sobre nós", disse à AFP em Kigali.

"Tudo o que podemos dizer é que sentimos uma gratidão imensa por esse gesto de bondade e esperamos que os Nacht possam ajudar outras pessoas", afirmou.

Jonah MANDEL, AFP






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