Quando nos deparamos com a ignorância fora da escola já estão colocadas as condições para a plena indignação, aquela mais aguda e revoltante. Porque a ignorância é a mãe da brutalidade, da estultice, da insanidade intelectual. Além de embrutecer as pessoas, corrói as forças da sociedade, as emergias do país.
Já é grave assim quando se manifesta nas ruas. Mas quando a ignorância finca raízes no interior das escolas - configurando claramente os equívocos e distorções das políticas públicas levadas a efeito na área educacional - então o sentimento tangencia a perplexidade e a hedionda repulsa.
A Síntese de Indicadores Sociais do IBGE traz à luz uma realidade perversa, terrífica: temos no Brasil 2,1 milhões de alunos entre 7 e 14 anos analfabetos. E o mais grave é que, deste universo, quase 88% freqüentavam a escola no ano passado. .
Um outro dado de levantar defunto: 29% das crianças com 7 anos de idade não sabiam ler e escrever, em que pese 90,8% delas estarem presentes em sala de aula, freqüentando a escola.
Geograficamente, a região nordeste é o quadrante do país onde o problema mais se evidencia, se manifestando de maneira avassaladora. Nada menos que 44% das crianças nordestinas com 7 anos encontram-se na situação de iletrados. É quase a metade dos brasileirinhos que lá residem.
Na região Norte, este indicador chega a 39,6%.
Já na faixa que se inicia nos 8 e se estende até os 14 anos de idade, o índice de analfabetismo bate a casa dos 5,4%, segundo o IBGE. E o mais curioso e inaceitável: a esmagadora maioria desses brasileirinhos - vítimas da desídia governamental - são estudantes, estão nas escolas, e se não aprendem não é em razão do abandono, da perambulação pelas ruas, becos e esquinas. Não, freqüentam as aulas, prestam com habitual regularidade as provas e exames de avaliação, registram diligentemente a freqüência. Para se ter uma idéia do quão acintosa é esta realidade, do universo de 1,3 milhão de analfabetos no extrato, 84,5% estão estudando, ou seja, 1,1 milhão.
E aqui, importa abrir um parêntese: a eloqüência dos dados apresentados na Síntese de Indicadores Sociais do IBGE pode esconder uma situação ainda mais absurda. Na faixa contemplada pelo estudo, dos 8 aos 14 anos, o analfabetismo seguramente é muito maior em virtude de desconsiderar a população de 7 anos, que, pelo menos em tese, deveria cursar a 1 série do ensino fundamental, ainda em fase de alfabetização.
São números que deveriam falar por si, indicadores que deveriam ser suficientes para alterar as políticas públicas estabelecidas pelo MEC. Ensina o ditado popular que, para os que têm vergonha na cara, meia palavra basta. Já para os que não têm, uma locomotiva é insuficiente.