(...)
Humilhas, avanças, provocas, agrides, espancas, torturas, aprisionas indefesos – e quem bate e violenta é a tropa de choque?
Te tornaste carne, sexo e prostituta de incubo de Saturno –
e ensandecidamente acusas o outro de estupro? (...)
Leia o poema Uma oração para canalhas clicando aqui.
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A casamata das cafetinas
A sociedade brasileira forjou ao longo de sua história, duas grandes academias. Uma é a escola formal, destinada a produzir, reproduzir e disseminar o conhecimento, um tipo de saber que arremessa a humanidade em direção ao desenvolvimento e ao progresso. Mas infelizmente existe uma outra, a escola das ruas, um certo tipo de ‘academia’ que em outros tempos, teve lá a sua importância relativa, mas que hoje, constitui-se inequivocamente em universidade e centro de excelência para a titulação da bandidagem, o doutoramento de pedófilos, a modernização do tráfico de entorpecentes, a sacralização de tudo o que alguns preferem denominar ‘inferno’.
Num passado que já vai longe, as ruas – em que pesem os riscos e perigos sempre presentes - descortinavam, ou insinuavam pelo menos, um segundo cenário, envolto numa áurea de romantismo, inspirando espíritos aventureiros, desbravadores, conquistadores. Mas nos dias de hoje as ruas perderam quase tudo o que havia de encanto e, só muito raramente, quase no limite das impossibilidades, apresentam-se como um espaço saudável e produtivo para as crianças e a nossa juventude.
Tão logo emerge da hibernação, ainda na fase da amamentação do filhote recém-nascido, a mãe-ursa passa a conviver com seu maior temor: encontrar um urso-macho, quem sabe o próprio parceiro que a engravidou, que não relutará em avançar sobre o pequeno e frágil filhote para devorá-lo, saciando a fome de seis meses.
O reino animal é assim. Pais que deveriam proteger os rebentos são os primeiros a extrair-lhes todas as possibilidades. E o que os brasileiros têm construído neste país continente não difere muito do mundo selvagem. As ruas comprovam isso, um dia sim e o outro também. Em tempo algum nossas ruas estiveram tão sintonizadas com as variações dos termos selva, selvagem, selvageria.
Nos núcleos urbanos a violência fincou âncoras em todos os quadrantes. Está presente nos lares, nos locais de trabalho, nas escolas, nos espaços de convivência, nos centros religiosos. Espaço algum escapa de seus inumeráveis tentáculos. Mas é na rua que a violência encontra um dos seus campos mais propícios, um de seus terrenos mais férteis.
Um outro campo, um outro território aonde a violência tem plena guarida compõe-se de gabinetes refrigerados, instalações e organizações estatais e paraestatais que trataram de volatizar os limites entre o público e o privado, diluindo-os no jogo de interesses rasteiros, no tráfico das mais infames influências, na volúpia da corrupção e das propinas.
No Brasil de hoje envergonha a tênue linha que separa o certo do errado, o justo do injusto, a ética da gatunagem explícita. E é neste espaço cinzento, cendrado e sombrio que nossas escolas formais agonizam, numa crise típica de moribundos que aguardam o sacramento da extrema-unção.
Enquanto as ruas se aperfeiçoam, se aprimoram, se qualificam para ensinar mais e melhor o que não presta, nossas escolas fragilizadas, depauperadas, agonizantes, sem viço e brilho, ensinam pouco, muito menos que deveriam. Enquanto as ruas exibem a exuberância do ensino-bandido, as escolas exibem a mediocridade do ensino-desastrado, do ensino-ineficaz.
Nossas escolas formais deveriam alfabetizar, ensinar os alunos a interpretar e efetuar operações de cálculo, habilitando-os a receber os conteúdos que serão apresentados nas fases seguintes. Mas, desde a pré-escola, parece que os parâmetros flexionaram e os professores agora se esmeram em incutir no estudante o paradigma que navega na crista da onda: “engajamento social”. Esse é o paradigma, essa é a palavra de ordem.
Raios! Nossas crianças e nossos jovens não sabem interpretar um texto trivial, sequer dominam as operações matemáticas, apresentam as piores notas nas avaliações internacionais para medir o conhecimento acumulado, mas quando se trata do quesito “engajamento social”, estão mais que antenados, seja lá o que signifique a destemida expressão.
Pouco tempo atrás questionaram uma professora do ensino fundamental que resolveu ensinar a seus alunos nada mais nada menos que a ciência dos palavrões. E assim se defendia a educadora revolucionária: “se a escola não ensina palavrões aos alunos, quem o fará”?
Os pais dos alunos da engajada professora verificaram que seus filhos não sabiam ler, escrever, calcular e muito menos interpretar pequenos e singelos textos. Não aprenderam na escola. Mas na escola aprenderam o significado de todos os palavrões, seus cadernos tornaram-se dicionários das palavras malditas, das mais sutis às cabeludas como as caranguejeiras.
Beber leite e chupar manga seria um bom mote para aulas de nutrição, de biologia, de ecologia, de saúde, de química, e de inúmeras outras disciplinas, inclusive geografia e matemática. Todavia, a professora adepta da pedagogia das ruas optou pelo que deveria ser uma aula de educação sexual, mas que pela banalidade e vulgaridade, reduziu-se a uma “aula” de e sobre cafetinagem e depravação.
Então ficamos assim: os professores remunerados para ensinar conteúdos pedagógicos, ensinam as ‘artes’ das ruas; enquanto os bandidos e traficantes cuidam de fazer às vezes da escola formal, ensinando leitura, interpretação de textos e operações de cálculo. Ou alguém acredita que a malandragem pode prescindir do conhecimento acadêmico e científico. Sendo assim, como se sairiam com os balanços contábeis das fortunas geradas pelo tráfico de drogas e entorpecentes? Como se sairiam com a complexidade das operações bancárias, das intrigadas tecnologias para a indústria da lavagem de dinheiro, da ciência de desbravar os mais promissores paraísos fiscais, das espertezas, indolências e cafumangos dos que se divertem com a língua, apelidando o mensalão e o achaque aos cofres públicos de caixa dois?
Ainda que fragilizadas, esgotadas, carcomidas nas entranhas, acreditam os pais que nossas escolas constituem um abrigo seguro, um bunker, uma casamata onde os filhos mantêm-se protegidos dos perigos das ruas.
Tratem eles de manter rigorosa vigilância sobre os políticos que elegeram, caso contrário, nem para esse papel a escola se prestará mais.
Felizmente, cresce o número dos que se indignam com a situação do país. E indignar é o primeiro passo para que a nação se mobilize, para que os brasileiros promovam as transformações capazes de nos assegurar um lugar dentre os países desenvolvidos, um lugar privilegiado no século XXI, um lugar onde caibam todos os nossos sonhos e esperanças.
Antônio Carlos dos Santos criou a metodologia Quasar K+ de Planejamento Estratégico e a tecnologia de produção do Teatro Popular de Bonecos Mané Beiçudo. acs@ueg.br
A sociedade brasileira forjou ao longo de sua história, duas grandes academias. Uma é a escola formal, destinada a produzir, reproduzir e disseminar o conhecimento, um tipo de saber que arremessa a humanidade em direção ao desenvolvimento e ao progresso. Mas infelizmente existe uma outra, a escola das ruas, um certo tipo de ‘academia’ que em outros tempos, teve lá a sua importância relativa, mas que hoje, constitui-se inequivocamente em universidade e centro de excelência para a titulação da bandidagem, o doutoramento de pedófilos, a modernização do tráfico de entorpecentes, a sacralização de tudo o que alguns preferem denominar ‘inferno’.
Num passado que já vai longe, as ruas – em que pesem os riscos e perigos sempre presentes - descortinavam, ou insinuavam pelo menos, um segundo cenário, envolto numa áurea de romantismo, inspirando espíritos aventureiros, desbravadores, conquistadores. Mas nos dias de hoje as ruas perderam quase tudo o que havia de encanto e, só muito raramente, quase no limite das impossibilidades, apresentam-se como um espaço saudável e produtivo para as crianças e a nossa juventude.
Tão logo emerge da hibernação, ainda na fase da amamentação do filhote recém-nascido, a mãe-ursa passa a conviver com seu maior temor: encontrar um urso-macho, quem sabe o próprio parceiro que a engravidou, que não relutará em avançar sobre o pequeno e frágil filhote para devorá-lo, saciando a fome de seis meses.
O reino animal é assim. Pais que deveriam proteger os rebentos são os primeiros a extrair-lhes todas as possibilidades. E o que os brasileiros têm construído neste país continente não difere muito do mundo selvagem. As ruas comprovam isso, um dia sim e o outro também. Em tempo algum nossas ruas estiveram tão sintonizadas com as variações dos termos selva, selvagem, selvageria.
Nos núcleos urbanos a violência fincou âncoras em todos os quadrantes. Está presente nos lares, nos locais de trabalho, nas escolas, nos espaços de convivência, nos centros religiosos. Espaço algum escapa de seus inumeráveis tentáculos. Mas é na rua que a violência encontra um dos seus campos mais propícios, um de seus terrenos mais férteis.
Um outro campo, um outro território aonde a violência tem plena guarida compõe-se de gabinetes refrigerados, instalações e organizações estatais e paraestatais que trataram de volatizar os limites entre o público e o privado, diluindo-os no jogo de interesses rasteiros, no tráfico das mais infames influências, na volúpia da corrupção e das propinas.
No Brasil de hoje envergonha a tênue linha que separa o certo do errado, o justo do injusto, a ética da gatunagem explícita. E é neste espaço cinzento, cendrado e sombrio que nossas escolas formais agonizam, numa crise típica de moribundos que aguardam o sacramento da extrema-unção.
Enquanto as ruas se aperfeiçoam, se aprimoram, se qualificam para ensinar mais e melhor o que não presta, nossas escolas fragilizadas, depauperadas, agonizantes, sem viço e brilho, ensinam pouco, muito menos que deveriam. Enquanto as ruas exibem a exuberância do ensino-bandido, as escolas exibem a mediocridade do ensino-desastrado, do ensino-ineficaz.
Nossas escolas formais deveriam alfabetizar, ensinar os alunos a interpretar e efetuar operações de cálculo, habilitando-os a receber os conteúdos que serão apresentados nas fases seguintes. Mas, desde a pré-escola, parece que os parâmetros flexionaram e os professores agora se esmeram em incutir no estudante o paradigma que navega na crista da onda: “engajamento social”. Esse é o paradigma, essa é a palavra de ordem.
Raios! Nossas crianças e nossos jovens não sabem interpretar um texto trivial, sequer dominam as operações matemáticas, apresentam as piores notas nas avaliações internacionais para medir o conhecimento acumulado, mas quando se trata do quesito “engajamento social”, estão mais que antenados, seja lá o que signifique a destemida expressão.
Pouco tempo atrás questionaram uma professora do ensino fundamental que resolveu ensinar a seus alunos nada mais nada menos que a ciência dos palavrões. E assim se defendia a educadora revolucionária: “se a escola não ensina palavrões aos alunos, quem o fará”?
Os pais dos alunos da engajada professora verificaram que seus filhos não sabiam ler, escrever, calcular e muito menos interpretar pequenos e singelos textos. Não aprenderam na escola. Mas na escola aprenderam o significado de todos os palavrões, seus cadernos tornaram-se dicionários das palavras malditas, das mais sutis às cabeludas como as caranguejeiras.
Beber leite e chupar manga seria um bom mote para aulas de nutrição, de biologia, de ecologia, de saúde, de química, e de inúmeras outras disciplinas, inclusive geografia e matemática. Todavia, a professora adepta da pedagogia das ruas optou pelo que deveria ser uma aula de educação sexual, mas que pela banalidade e vulgaridade, reduziu-se a uma “aula” de e sobre cafetinagem e depravação.
Então ficamos assim: os professores remunerados para ensinar conteúdos pedagógicos, ensinam as ‘artes’ das ruas; enquanto os bandidos e traficantes cuidam de fazer às vezes da escola formal, ensinando leitura, interpretação de textos e operações de cálculo. Ou alguém acredita que a malandragem pode prescindir do conhecimento acadêmico e científico. Sendo assim, como se sairiam com os balanços contábeis das fortunas geradas pelo tráfico de drogas e entorpecentes? Como se sairiam com a complexidade das operações bancárias, das intrigadas tecnologias para a indústria da lavagem de dinheiro, da ciência de desbravar os mais promissores paraísos fiscais, das espertezas, indolências e cafumangos dos que se divertem com a língua, apelidando o mensalão e o achaque aos cofres públicos de caixa dois?
Ainda que fragilizadas, esgotadas, carcomidas nas entranhas, acreditam os pais que nossas escolas constituem um abrigo seguro, um bunker, uma casamata onde os filhos mantêm-se protegidos dos perigos das ruas.
Tratem eles de manter rigorosa vigilância sobre os políticos que elegeram, caso contrário, nem para esse papel a escola se prestará mais.
Felizmente, cresce o número dos que se indignam com a situação do país. E indignar é o primeiro passo para que a nação se mobilize, para que os brasileiros promovam as transformações capazes de nos assegurar um lugar dentre os países desenvolvidos, um lugar privilegiado no século XXI, um lugar onde caibam todos os nossos sonhos e esperanças.
Antônio Carlos dos Santos criou a metodologia Quasar K+ de Planejamento Estratégico e a tecnologia de produção do Teatro Popular de Bonecos Mané Beiçudo. acs@ueg.br