quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

O que anseia o Brasil?


Meus caros, esta semana estamos revendo alguns artigos que escrevi no ano de 2007. Fica claro o quão lento é o nosso progresso, o quão vagarosas são nossas conquistas... vejam:

O que anseia o Brasil?

 Nas últimas décadas as instituições brasileiras têm passado por aguda crise de identidade.

Não há mais um ponto seguro onde se possa fixar a vista. Esquadrinhando o horizonte o que salta aos olhos são cenários disformes, grotescos, uma mistura com elevado teor de indecência e licenciosidade. E nada, absolutamente nada, parece escapar desta ópera-bufa. Não importa se a instância é municipal, estadual ou federal; tão pouco se o poder encontra-se na esfera do executivo, legislativo ou judiciário. Corre a impressão de que o aparelho estatal foi tomado por um miasma nauseabundo, um plasma contagioso, um buraco negro que consome os esforços e iniciativas para remediar a situação.

Há problemas de toda ordem: lerdeza; gigantismo; sobreposição de órgãos, tarefas e atribuições; ineficácia, crônico viés perdulário, e uma endemia que gangrena e leva à putrefação do corpo institucional.

Neste contexto, como esperar que alguma coisa funcione a contento? Daí a insegurança generalizada, o ineficaz sistema de ensino, o caos na saúde pública, a infra-estrutura física aos frangalhos, o tecido social vilipendiado pela onipresença das bolsas-esmolas,...

Crise institucional sacramentada, um setor específico parecia gravitar sobre o mar de lama, mantendo-se imune à sujeira do lodaçal que emporcalha o país: o Corpo de Bombeiros.

Ao contrário de todas as demais guarnições militares, os bombeiros não foram criados para tirar e sim para salvar vidas. Sua existência remonta ao século 27a.C. quando, na Roma antiga, o imperador Augusto criou o primeiro grupo de combatentes do fogo, os “vigiles”.

De lá para cá, em todos os lugares do mundo, os bombeiros têm dado exemplos e mais exemplos de bravura, destemor e heroísmo, não raro colocando em risco e perdendo as próprias vidas para salvar pessoas que sequer conhecem.

Exatamente pela sacralização da instituição causou estupor a foto estampada nas primeiras páginas dos jornais: bandidos - disfarçados de policiais federais - roubando R$ 30 mil de um empresário no Rio de Janeiro. Tentavam seqüestrá-lo, mas a presença do fotógrafo Fábio Motta do jornal “O Estado de São Paulo” amedrontou os marginais que suspenderam a ação, mas não deixaram de fugir com o dinheiro.

Os bandidos passavam-se por policiais. Eram informantes da Polícia Civil e prestavam serviço na 59ª Delegacia de Polícia, inclusive (dá para acreditar?!) dando expediente interno, trabalhando no atendimento ao público.

A publicação das fotos levou a polícia a identificar os marginais como cabos integrantes do Corpo de Bombeiros da cidade maravilhosa.

Estão presos e vão amargar umas boas férias na cadeia. Não tanto quanto deveriam, mas vá lá, estamos no Brasil.

Nenhuma profissão está imune à horda de marginais, ao bando de tártaros que estão a assolar o Brasil. Em todas as categorias profissionais existe um substrato de incompetentes, trabalhadores sem caráter, cafajestes, venais boticários, maganões, bandidos e mesmo assassinos. Dentre os empresários, quem não se lembra do ex-deputado Sergio Naya, aquele do desabamento do edifício Palace 2, em 1998? E dentre os médicos quantos Marcelos Carons estão soltos por aí, tratando pacientes como carne suína? Os homens da imprensa têm os seus Pimentas Neves, os juízes vários Nicolaus dos Santos para chamarem de seus, os políticos... ah, os políticos, essa categoria de vestais da moral e da coisa pública... Mas apesar de tudo, de saber que o mar não está pra peixe, não deixou de ser uma ingrata surpresa verificar que, mesmo a sagrada instituição dos bombeiros, não tem conseguido escapar à sanha dos meliantes e dos patifes.

É evidente que o grotesco episódio não macula a instituição Corpo de Bombeiros. Sequer a constrange. Mas enfatiza à sociedade que devemos aperfeiçoar os instrumentos de proteção do Estado democrático. De modo que as pessoas e as nossas mais nobres instituições não sejam coisificadas e aparelhadas pelos criminosos, pelos pandilheiros. Usem colarinho branco ou não, o Brasil anseia para ver os sacomanos na cadeia.

Artigo de Antônio Carlos dos Santos publicado na Revista Bula