O Monstrengo Fernando Pessoa,
mostrengo que está no fim do mar
Na noite de breu ergueu-se a voar;
A roda da nau voou três vezes,
Voou três vezes a chiar,
E disse: «Quem é que ousou entrar
Nas minhas cavernas que não desvendo,
Meus tetos negros do fim do mundo?»
E o homem do leme disse, tremendo:
«El-Rei D. João Segundo!»
«De quem são as velas onde me roço?
De quem as quilhas que vejo e ouço?»
Disse o mostrengo, e rodou três vezes,
Três vezes rodou imundo e grosso.
«Quem vem poder o que só eu posso,
Que moro onde nunca ninguém me visse
E escorro os medos do mar sem fundo?»
E o homem do leme tremeu, e disse:
«El-Rei D. João Segundo!»
Três vezes do leme as mãos ergueu,
Três vezes ao leme as reprendeu,
E disse no fim de tremer três vezes:
«Aqui ao leme sou mais do que eu:
Sou um povo que quer o mar que é teu;
E mais que o mostrengo, que me a alma teme
E roda nas trevas do fim do mundo,
Manda a vontade, que me ata ao leme,
De El-Rei D. João Segundo!»
sábado, 11 de junho de 2011
sexta-feira, 10 de junho de 2011
Cesariny - O Navio de Espelhos
O navio de espelhos
não navega cavalga
Seu mar é a floresta
que lhe serve de nível
Ao crepúsculo espelha
sol e lua nos flancos
Por isso o tempo gosta
de deitar-se com ele
Os amadores não amam
a sua rota clara
(Vista do movimento
dir-se-ia que pára)
Quando chega à cidade
nenhum cais o abriga
O seu porão traz nada
nada leva à partida
Vozes e ar pesado
é tudo o que transporta
(E no mastro espelhado
uma espécie de porta)
Seus dez mil capitães
têm o mesmo rosto
A mesma cinta escura
o mesmo grau e posto
Quando um se revolta
há dez mil insurrectos
(Como os olhos da mosca
reflectem os objectos)
E quando um deles ala
o corpo sobre os mastros
e escruta o mar do fundo
Toda a nave cavalga
(como no espaço os astros)
Do princípio do mundo
até ao fim do mundo
ESTADO SEGUNDO, XXI
Ama como a estrada começa
Mário Cesariny
(Lisboa, 9/8/1923 – Lisboa, 26/11/2006)
Pintor e poeta, fundador do Movimento Surrealista Português.
não navega cavalga
Seu mar é a floresta
que lhe serve de nível
Ao crepúsculo espelha
sol e lua nos flancos
Por isso o tempo gosta
de deitar-se com ele
Os amadores não amam
a sua rota clara
(Vista do movimento
dir-se-ia que pára)
Quando chega à cidade
nenhum cais o abriga
O seu porão traz nada
nada leva à partida
Vozes e ar pesado
é tudo o que transporta
(E no mastro espelhado
uma espécie de porta)
Seus dez mil capitães
têm o mesmo rosto
A mesma cinta escura
o mesmo grau e posto
Quando um se revolta
há dez mil insurrectos
(Como os olhos da mosca
reflectem os objectos)
E quando um deles ala
o corpo sobre os mastros
e escruta o mar do fundo
Toda a nave cavalga
(como no espaço os astros)
Do princípio do mundo
até ao fim do mundo
ESTADO SEGUNDO, XXI
Ama como a estrada começa
Mário Cesariny
(Lisboa, 9/8/1923 – Lisboa, 26/11/2006)
Pintor e poeta, fundador do Movimento Surrealista Português.
quinta-feira, 9 de junho de 2011
Don Quixote
Don Quixote grand pas de deux - Svetlana Zakharova and Andrei Uvarov
Miguel de Cervantes (1547 ? 1616)
"El hombre se despierta de un incierto
Sueño de alfanjes y de campo llano
Y se toca la barba con la mano
Y se pregunta si está herido o muerto.
¿No lo perseguirán los hechiceros
que han jurado su mal bajo la luna?
Nada. Apenas el frío.
Apenas una dolencia
de sus años postrimeros.
El hidalgo fue un sueño de Cervantes
Y don Quijote un sueño del hidalgo.
El doble sueño los confunde
Y algo está pasnado que pasó mucho antes.
Quijano duerme y sueña.
Una batalla:
Los mares de Lepanto y la metralla."
Poema Sueña Alonso Quijano, de Jorge Luis Borges
Pas de Deux Don Quixote Com Baryshnikov
Miguel de Cervantes (1547 ? 1616)
"El hombre se despierta de un incierto
Sueño de alfanjes y de campo llano
Y se toca la barba con la mano
Y se pregunta si está herido o muerto.
¿No lo perseguirán los hechiceros
que han jurado su mal bajo la luna?
Nada. Apenas el frío.
Apenas una dolencia
de sus años postrimeros.
El hidalgo fue un sueño de Cervantes
Y don Quijote un sueño del hidalgo.
El doble sueño los confunde
Y algo está pasnado que pasó mucho antes.
Quijano duerme y sueña.
Una batalla:
Los mares de Lepanto y la metralla."
Poema Sueña Alonso Quijano, de Jorge Luis Borges
Pas de Deux Don Quixote Com Baryshnikov
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