segunda-feira, 25 de outubro de 2010

O buraco negro que, na educação, separa qualidade de quantidade


Deu no Estadão

O panorama da educação
O Estado de S.Paulo

O mais recente levantamento comparativo da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) em matéria de educação - o relatório Education at a glance 2010 - revela que, apesar de ter ampliado os gastos com o ensino fundamental na primeira década de 2000, o Brasil ainda investe só 1/5 do que os países desenvolvidos destinam ao setor.

O levantamento cobre todos os ciclos de ensino e leva em conta a educação pública e privada. Segundo ele, enquanto países como Alemanha, Bélgica, França, Reino Unido, Áustria, Dinamarca, Noruega, Itália, Islândia, Estados Unidos e Japão investem, em média, US$ 94.589 por estudante durante todo o ciclo do ensino fundamental, no Brasil o gasto médio é de US$ 19.516 por aluno. O resultado é que, em matéria de formação e preparo, os estudantes brasileiros continuam muito longe dos estudantes dos países desenvolvidos.

A pesquisa da OCDE comparou os investimentos no ensino fundamental realizados por 39 países e avaliou os resultados por eles obtidos. Entre outros fatores, ela levou em consideração os salários dos professores, materiais pedagógicos, instalações físicas, acesso à escola, número de estudantes matriculados e o papel dos pais na supervisão e aconselhamento das escolas públicas.

O estudo também comparou os benefícios sociais e econômicos resultantes da educação de qualidade, em termos de aprendizagem dos estudantes, condições de empregabilidade e níveis salariais.

Segundo a pesquisa, os níveis de despesa com educação variam consideravelmente entre os 39 países analisados, tanto em termos absolutos como relativos. Países como Dinamarca, Israel, Islândia e Estados Unidos, por exemplo, gastam em todos os níveis de ensino o equivalente a cerca de 6,2% do Produto Interno Bruto (PIB). Países como a Rússia e a República Eslovaca gastam 4,5%. Destinando ao setor educacional 5,2% do PIB, o Brasil se encontra numa posição intermediária.

O estudo também mostra que, entre os países mais ricos, 90% do investimento em ensino fundamental e médio vem do poder público. Quanto ao ensino superior, em países como a Finlândia, Noruega e Coreia do Sul, 75% dos investimentos são privados. A prioridade do gasto público é dada, assim, à formação básica.

A pesquisa revela ainda que, em pelo menos 8 dos 39 países pesquisados, as instituições públicas cobram dos pais uma contrapartida média de US$ 1,5 mil por ano. Como se vê, nesses países, o ensino público não é inteiramente gratuito.

Entre os países mais desenvolvidos, o ensino de redação, literatura, matemática e ciências representa quase 50% do tempo de instrução obrigatória, para os alunos com idade entre 9 e 11 anos, e 40%, para os estudantes na faixa etária entre 12 e 14 anos. Nos demais países, o tempo gasto com essas atividades básicas varia de 16% a 30%.

Evidentemente, isso faz diferença no aproveitamento e no preparo dos estudantes. Esse também é um dos fatores que os levam, quando adultos, a continuar estudando durante toda sua vida profissional. Por isso, mostra a pesquisa, quanto melhor é a qualidade da formação básica dos alunos, mais valor darão ao ensino superior e aos cursos de pós-graduação, o que os torna menos vulneráveis ao desemprego causado pelas crises econômicas. Entre 1997 e 2007, segundo o estudo, a taxa média de desemprego anual de quem tem nível superior ficou em torno de 4%, em média. Entre os que somente concluíram o ensino básico, a taxa média de desemprego ficou acima de 10%, nos 39 países pesquisados.

O estudo da OCDE mostrou ainda que os países desenvolvidos têm 20 alunos por turma no ensino fundamental. No Brasil, embora o tamanho das turmas tenha diminuído em relação a 2000, o número é de 30 estudantes, nas turmas de 5.ª a 9.ª série do ensino fundamental. É um número alto, o que dificulta o trabalho dos professores.

A pesquisa da OCDE registra avanços na educação brasileira, como a universalização do ensino fundamental. Mas, comparativamente, a formação dos nossos estudantes, de modo geral, continua muito longe de um padrão aceitável.

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Meus queridos, o artigo que segue, postei quase quatro anos atrás. O que demonstra que o país parecer ter mergulhado num estado letargico em que tudo se imobiliza, permanecendo qual fóssil cristalizado. Leia e entendam o por quê:

O buraco negro que, na educação, separa qualidade de quantidade

As últimas pesquisas, efetuadas pelo MEC e por organismos internacionais, registram a mediocridade em que se encontra o sistema de ensino brasileiro, sobretudo, no que refere-se à qualidade.


Em torno de 50% dos alunos brasileiros situados na faixa etária dos 15 anos, estão no chamado nível 1 de alfabetização, indicador estabelecido pela Unesco para classificar a performance dos estudantes. Neste patamar, estão aqueles que mal conseguem efetuar leitura e interpretação de textos. Em um dos mais recentes levantamentos, considerando 41 países pesquisados, o Brasil ficou na 37ª posição, à frente apenas de quatro países. No continente americano vencemos apenas o Peru.


A gravidade da situação que estes indicadores desnudam, está a enfatizar que metade dos alunos brasileiros, com bom aproveitamento acadêmico, que desde sempre estiveram na escola, não dominam a língua pátria e são incapazes de extrair dos textos seus significados. Passam quase dez anos na escola regular sem quase nada aprender. É uma pantomina em que todos enganam-se mutuamente: o estado presta contas divulgando inaugurações de novas e mais novas escolas, os pais contentam-se com um espaço onde possam deixar os filhos, qualquer espaço - desde que fora da violência das ruas - e os alunos acomodam-se na ignorância, que não exige esforço, estudos e trabalhos. E o país amplia a distância que o separa dos países desenvolvidos.


Para construirmos uma nova realidade para a educação, urge entendermos o caos em que nos encontramos. É o primeiro passo, identificar com precisão nossos problemas, para que tenhamos condições de encará-los de frente, estabelecendo políticas, diretrizes e estratégias que os conformem aos objetivos e metas traçados. Para criar um país desenvolvido, em que as oportunidades e a justiça sejam patrimônio de todos, será preciso muito mais.


As edificações destinadas ao ensino carecem de reformas, adequações e principalmente, um novo conceito. Estes espaços devem ser reconcebidos. As salas de aula convencionais, não mais respondem às necessidade contemporâneas. O espaço em que interagem professor e aluno deve se ampliar para todo o espaço de convivência comunitária. As ruas, praças e demais logradouros e equipamentos públicos devem ser extensões de nossas salas de aula. Todo o ambiente que nos envolve deve ser utilizado como salas de aula, laboratórios de pesquisas e oficinas de aprendizagem. A realidade é que a escola sempre funcionou como uma instituição externa à sociedade. Sobretudo neste momento em que a violência urbana as têm tangido para o isolamento. Muralhas de concreto armado, cercas eletrificadas, sistemas de monitoramento eletrônico, cães de guarda... vultosos investimentos que deveriam se destinar à área pedagógica, são carreados para o setor de segurança.


De igual modo, os conteúdos ministrados estão defasados, inadequados. Os assuntos são tratados e abordados de forma cartesiana e mecânica, de modo que não exercem fascínio, não exercem encanto sobre os alunos. Agrava o quadro o sistema adotado de remuneração dos professores: salários miseráveis que retiram de um dos principais atores deste processo, o estímulo. Pior, afeta de maneira irremediável a auto-estima dos educadores.


Mas nem tudo foi ou está perdido.


No último século o país investiu na universalização do ensino, massificando a oferta de vagas. E neste sentido, muito foi conquistado. No ano de 2000, a taxa de escolarização da população de 7 a 14 anos - faixa destinada ao ensino fundamental - chegou a 94,5%. É um dado extremamente relevante, que não deve ser ignorado.


Outras conquistas merecem registro. Nos idos de 1940, a taxa de analfabetismo se situava em torno de 65,1% da população com mais de 15 anos de idade. No ano de 2000, esta taxa era de 13,6%. São indicadores que ainda não satisfazem ao anseio de progresso e desenvolvimento da sociedade, mas enfatizam categoricamente que é possível avançar quando há vontade política e determinação.


É evidente que muito ainda há o que fazer. Quando cotejamos estes dados com os dos demais países - inclusive os latino-americanos - é que percebemos o quanto estamos atrasados. Mas ignorar os progressos obtidos até aqui seria um erro tão elementar quanto o de ignorar a necessidade de novos e urgentes investimentos, agora priorizando a qualidade e não a quantidade.


Assim como estamos ganhando a batalha da massificação da oferta de vagas, deveremos agora enfocar o desafio de massificar a qualidade.


E qualidade refere-se, sem dúvida, à edificações, conteúdos e didáticas adequadas. Mas refere-se também à criação de um eficiente e continuado processo de qualificação da mão de obra, o que inclui a adoção de vigorosos processos de capacitação, planos de progressão funcional, e de políticas salariais consistentes.


Direção, professores, servidores e comunidade, devem estar plenamente engajados na construção deste novo cenário, onde a universalização se dê pelo acesso, como também pela qualidade.


Hoje, na área da educação, é visível o descompasso entre estes dois componentes: quantidade e qualidade. E mais: o buraco negro que separa o acesso (quase universalizado) da qualidade do ensino, compromete de maneira determinante nosso desenvolvimento social, fazendo com que gerações e gerações percam sonhos e oportunidades.


Responder, com sabedoria e rapidez, a este desafio é o que está na ordem do dia.

Artigo de Antônio Carlos dos Santos publicado na Revista Bula e no portal Goiás Educação.