Após três
anos de vigência do Plano Nacional de Educação (PNE), apenas seis das 30 metas
e estratégias que deveriam ter sido cumpridas até 2017 foram alcançadas total
ou parcialmente. O número representa 20% do total, o que significa que quatro
em cada cinco metas não foram atingidas. O balanço é do Observatório do PNE
(OPNE), uma plataforma formada por 24 organizações parceiras, coordenada pelo movimento
Todos Pela Educação.
O PNE é
uma lei federal, sancionada em 2014, que prevê metas para melhorar a qualidade
do ensino brasileiro em um prazo de dez anos, desde a educação infantil até a
pós-graduação. As estratégias preveem aumento do investimento, melhorias em
infraestrutura e valorização do professor. O texto estabelece 20 metas para
serem cumpridas até 2024, das quais oito têm prazos intermediários, que já
venceram. A lei também aponta 254 estratégias relacionadas a cada uma das metas
e 14 artigos que definem ações a serem realizadas no país.
Na
avaliação da presidente executiva do Todos Pela Educação, Priscila Cruz, o
principal entrave para o cumprimento do PNE é a falta de um plano estratégico
que estabeleça uma ordem de execução das metas. Para ela, os governos federal,
estaduais e municipais deveriam ter traçado uma estratégia de execução para
definir o que deve ser feito primeiro.
“O plano
não coloca as metas e as estratégias em uma ordem para que a gente consiga
fazer com que ele seja realmente executado e cumprido. Algumas metas são
gargalos para outras, é preciso definir quais deveriam ser cumpridas antes para
que outras avancem e quais metas vão impedir que as demais sejam cumpridas”,
aponta.
Para a
pedagoga Anna Helena Altenfelder, superintendente do Centro de Estudos e
Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), o balanço dos três
anos do PNE é preocupante. “Ainda mais se levarmos em consideração que as metas
são articuladas e o sucesso de uma depende da execução da outra. Temos que
pensar no plano como um todo”, diz.
Valorização
dos professores
Entre as
metas consideradas fundamentais para o avanço da educação no país e que não
foram cumpridas, algumas dizem respeito à valorização dos professores,
considerada um dos gargalos para o avanço do ensino. A meta 18, por exemplo,
estabelece que devem ser assegurados planos de carreira para os profissionais
da educação básica e superior públicas, tomando como referência o piso salarial
nacional. Segundo o Observatório, não há iniciativas em curso em âmbito
federal.
“Com um
bom professor, em uma escola com um bom diretor e bem gerida, com
infraestrutura adequada, você consegue andar com várias metas [previstas no
plano]”, diz Priscila.
Ela também
cita como exemplo a meta que prevê a melhoria do Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica (Ideb), indicador criado pelo Ministério da Educação (MEC) para
medir a qualidade do ensino em diferentes etapas. A avaliação do Observatório é
que apenas a meta do 5º ano do ensino fundamental foi cumprida, enquanto os
anos finais dessa etapa e o ensino médio ainda estão em um patamar muito baixo.
“Essa meta do Ideb não vai acontecer se não melhorarmos a formação dos
professores. O maior determinante para a aprendizagem de alunos é a qualidade
do professor”, diz.
A
valorização da carreira docente também é apontada pela superintendente do
Cenpec como fundamental para o sucesso do restante do plano. “Se queremos uma
educação de qualidade, não se pode pensar nisso sem a valorização da carreira
docente, que passa pelas condições de trabalho, pela carreira do professor e
pela formação”, diz Anna Helena.
Educação
infantil
Uma das
metas do PNE determina que todas as crianças de 4 a 5 anos deveriam estar
matriculadas na escola até 2016. Os dados mais recentes da Pesquisa Nacional
por Amostra de Domicílio (Pnad), que são de 2015, mostram que a taxa de
atendimento nessa faixa etária é de 90,5%. O cumprimento real da meta só poderá
ser aferido quando a Pnad 2016 for divulgada, mas o relatório da Observatório
destaca que o percentual de 9,5% restante representa cerca de 500 mil crianças
dessa faixa etária fora da escola.
“Se a
criança não entrou na educação infantil, ela vai ter mais dificuldades de se
alfabetizar. Não se alfabetizando, ela não vai conseguir aprender tudo aquilo
que ela deveria. Não aprendendo, ela vai abandonar a escola antes do tempo. É
uma reação em cadeia”, explica Priscila Cruz.
No Brasil,
a educação infantil é responsabilidade dos municípios. Para o presidente da
União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Aléssio Costa
Lima, a garantia da matrícula de todas as crianças nesta etapa de ensino
depende de políticas públicas de inclusão social, uma vez que quem está fora da
escola nessa faixa etária são moradores de periferias de centros urbanos ou de
lugares distantes, com difícil acesso. “Teremos que ter um conjunto de
políticas articuladas que venham a garantir a questão da inclusão”, diz o
secretário.
O PNE
prevê também que o investimento público em educação deve ser ampliado para 7% do Produto Interno Bruto (PIB) até 2019
e para 10% até 2024. O presidente da Undime destaca que a ampliação de recursos
para a educação é fundamental para o cumprimento das metas restantes. Para ele,
o modelo atual de financiamento, que ocorre principalmente por meio do Fundo de
Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos
Profissionais da Educação (Fundeb), não é suficiente para atender as
necessidades do setor.
“É preciso
assegurar novas fontes de investimentos porque a melhoria da qualidade e a
ampliação da oferta, como está colocado em muitas metas, isso não se faz sem
acréscimo de investimentos”, diz o secretário.
Expectativa
Entre as
metas que já foram cumpridas no PNE estão a formação de um fórum permanente
para acompanhar o piso salarial do magistério público na educação básica e a
divulgação de resultados pedagógicos de indicadores educacionais.
Outra meta
alcançada, embora com atraso, foi a que estabeleceu o encaminhamento da Base
Nacional Comum Curricular (BNCC). A proposta foi encaminhada ao Conselho
Nacional de Educação (CNE) em abril deste ano, quando o prazo inicial era até
2016. Também foi considerada cumprida parcialmente a meta que determina que os
estados e municípios deverão elaborar seus planos de educação, com metas
próprias para seus sistemas. Apenas dois estados e 14 municípios ainda não sancionaram
seus planos.
A Agência
Brasil procurou o MEC para um posicionamento sobre o cumprimento das
metas do PNE, mas a pasta ainda não respondeu às perguntas da reportagem, e
informou que irá se manifestar nos próximos dias.
Com o
avanço ainda lento do plano, a presidente do Todos pela Educação diz que tem
uma perspectiva pessimista quanto ao cumprimento da lei até 2024. “A gente já
perdeu muito tempo. A falta desse planejamento estratégico fez com que a gente
não conseguisse dar uma certa ordem na execução do plano. Então ficamos sem
prioridade nenhuma”, diz Priscila, embora reconheça que dificilmente planos de
metas são cumpridos em sua totalidade.
Para Anna
Helena, é preciso uma ampla mobilização da sociedade para que o país avance no
cumprimento das metas. “O PNE deve ser uma discussão de todos, não só das áreas
especializadas. Ele precisa ser discutido nas escolas, pelos alunos, pelos
professores, pelas famílias, pela sociedade como um todo, porque o plano fala
sobre a escolha que estamos fazendo para o futuro do nosso país”.
Por Sabrina
Craide, da Agência Brasil