Criada em 1993 para
evitar irregularidades em contratos entre empresas privadas e governos, a Lei
de Licitações foi colocada em xeque pelas delações de ex-executivos da
Odebrecht na Operação Lava Jato. Os relatos nas 270 horas de depoimentos
mostram que tanto os agentes públicos quanto os privados encontraram formas de
"driblar" a lei e obter vantagens em contratos com o governo, gerando
prejuízo à população.
A Lei de Licitações
foi criada para responder à pressão da sociedade por leis mais rígidas de controle
dos gestores públicos, afirmaram especialistas consultados pelo G1. O
presidente Itamar Franco queria mostrar que o novo regime democrático tinha
contratos transparentes, ao contrário dos fechados durante a ditadura.
Filho do fundador
da empreiteira, Emilio Odebrecht confirmou, em um de seus depoimentos, que
esquemas de corrupção envolvendo o poder público já eram praticados há décadas.
Pedro Novis, outro delator, afirmou que houve pagamento de propina aos
exgovernadores Paulo Maluf e Orestes Quércia em contratos de obras feitas entre
1980 e 1982, quando era governador de São Paulo.
Mesmo com a edição
da Lei de Licitações, os crimes dos quais Maluf seria suspeito nos anos 80
continuam sendo os mais comuns entre os esquemas de corrupção em Licitações. O
G1 conversou com especialistas em direito administrativo e selecionou exemplos
de grandes Licitações vencidas pela Odebrecht em dez estados brasileiros para
mostrar de que formas a Lei de Licitações, o Código Penal e a Lei da
Concorrência foram desvirtuados.
Segundo o advogado
Carlos Ari Sundfeld, professor de direito público da FGV Direito-SP, um
processo de Licitação oferece três momentos diferentes em que pode ocorrer
corrupção: com a formação de cartel entre as empresas concorrentes, com o
direcionamento da Licitação e, principalmente, durante a execução da obra. Ele
afirma, porém, que a maior parte das irregularidades apontadas na Lava Jato
deverá ser enquadrada nos artigos do Código Penal sobre corrupção ativa,
corrupção passiva e chantagem, já que elas são mais fáceis de serem
comprovadas.
Veja, a seguir,
oito estratégias da Odebrecht que, segundo as delações, foram usadas para
driblar a Lei de Licitações, exemplificadas por obras públicas em dez estados
envolvendo a empreiteira. A resposta de cada político, autoridade ou empresa
citada nas denúncias está no fim da reportagem.
Os advogados
explicam que um cartel existe quando as empresas interessadas em contratos com
o poder público negociam acordos entre si para decidir entre elas o resultado
de uma Licitação. Ao combinar sua estratégia, elas evitam uma concorrência de
verdade, que poderia levá-las, por exemplo, a fechar um contrato a preços
menores.
Essa combinação é
crime segundo a Lei de Licitações. A pena, segundo o artigo 90, é de dois a
quatro anos de prisão, além de multa para quem "frustrar ou fraudar,
mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo
do procedimento licitatório".
Além disso, a Lei
da Concorrência diz que é "infração de ordem econômica" uma empresa
"acordar, combinar, manipular ou ajustar com concorrente (...) preços,
condições, vantagens ou abstenção em Licitação pública". O agente público,
se tiver conhecimento desse acordo e não fizer nada para impedi-lo, também pode
responder por isso.
As delações indicam
que a Odebrecht e diversas outras empreiteiras simplesmente ignoraram essa
determinação legal e realizaram acordos desse tipo em Licitações realizadas em
várias partes do país, como no Distrito Federal e em Pernambuco.
Veja os exemplos:
Centro Administrativo do Distrito Federal: Três delatores
afirmaram que, entre 2007 e 2014, houve "acordo de mercado"
[expressão usada como sinônimo de cartel] entre empresas na fase de Licitação
da obra do Centro Administrativo do DF. João Antônio Pacífico, um dos
delatores, afirmou que a Odebrecht se uniu à empresa Via Engenharia, indicada
pelo grupo político do ex-governador José Roberto Arruda (PR), no consórcio
Centrad, que venceu a concorrência e ganhou o contrato.
Para vencer a
Licitação, Via e Odebrecht ainda teriam fechado um "acordo de
mercado" com o consórcio concorrente, que reunia as empresas Delta e
Manchester. As construtoras desistiram da Licitação principal, sob a promessa
de que seriam "subcontratadas" para atuar na manutenção dos prédios,
segundo Pacífico.
Porto de Suape, em Pernambuco: Uma das muitas
obras do Porto de Suape foi a do Cais 5, de responsabilidade da Companhia
Pernambucana de Gás (Copergás). O delator da Odebrecht Carlos Angeiras afirmou
que, em 2008, por exigência de Aldo Guedes, presidente da Copergás, a Odebrecht
se juntou em um consórcio com a OAS e ambas fizeram um "acordo de
mercado" com os dois outros consórcios interessados na Licitação
(Serveng/Enterpa e Andrade Gutierrez/Somar). O valor de referência da Suape
para a Licitação desta obra era de R$ 109,5 milhões.
Para vencer a
Licitação, o consórcio da Odebrecht ofereceu a proposta com o preço mais baixo,
de R$ 107,9 milhões, enquanto os dois outros consórcios fizeram propostas de R$
108,6 milhões e R$ 109 milhões, respectivamente. Em troca, Aldo Guedes teria
recebido propina em nome do então governado Eduardo Campos, que morreu em 2014.
Ocorre
direcionamento da Licitação quando o agente público atua para que uma empresa
específica saia vencedora. Isso fere o objetivo da Lei de Licitações de gerar
concorrência verdadeira para um contrato. O direcionamento é outro momento
apontado pelos especialistas como irregular porque impede o caráter competitivo
da Licitação.
Canal do Sertão Alagoano: Foi o que
aconteceu nas obras do Canal do Sertão, em Alagoas. Segundo os delatores, os
políticos atuaram no direcionamento da Licitação dos lotes 3 e 4 da obra para a
OAS e a Odebrecht, respectivamente. Em troca, "diversos agentes
públicos" receberam propina no valor equivalente a 2,25% do total do
contrato. Segundo João Pacífico, a equipe do então governador de Alagoas,
Teotônio Vilela Filho (PSDB), atuou diretamente no esquema.
"Soubemos da
obra do Canal do Sertão pela imprensa e quando chegamos já havia outras
empresas fazendo estudos no local. Todas apresentaram propostas para obra, mas
era o governo do Estado que coordenava a divisão. Então ele dizia olha, esse
lote aqui é da OAS, esse lote aqui vai ser da Odebrecht. Aquele lote, você não
atrapalhe não, porque o seu vai ser esse aqui. Eles faziam essa
coordenação", explicou Pacífico.
Cidade Administrativa de Minas Gerais: Outro exemplo de
direcionamento que teria sido acertado diretamente com políticos foi o da obra
de construção da Cidade Administrativa de Minas Gerais. De acordo com um dos
inquéritos na lista de Fachin, quando Aécio Neves (PSDB-MG) tomou posse em seu
segundo mandato como governador de Minas, ele teria organizado o esquema para
fraudar a Licitação: "A construção da cidade administrativa ocorreria em
três lotes: o primeiro referente ao palácio de governo e a um anexo, o segundo
referente a uma secretaria e o terceiro referente a uma outra secretaria. A
Odebrecht seria a líder do lote 2 e ficaria responsável para construir a
secretaria em consórcio com a Queiroz Galvão e a OAS, por um valor final de
aproximadamente 360 milhões de reais", diz o inquérito.
Ponte sobre o Rio Negro, no Amazonas: A Região Norte
também teve uma obra citada nas delações da Odebrecht relacionada ao
direcionamento de Licitação. Trata-se da concorrência da obra de construção de
uma ponte sobre o Rio Negro, no Amazonas. O contrato foi assinado com o
consórcio vencedor em 2007.
O delator Arnaldo
Cumplido de Souza e Silva afirmou que assumiu a diretoria de projetos de
infraestrutura da empreiteira em 2009 e, então, foi informado de um acordo para
fazer pagamentos indevidos ao então governador Eduardo Braga (PMDB), porque ele
teria favorecido o consórcio entre a Camargo Corrêa e Construbase nesta
Licitação. Depois que Braga deixou o governo para concorrer ao Senado, seu
vice-governador, Omar Aziz, assumiu o cargo e teria "herdado" o
recebimento dos pagamentos indevidos.
A Odebrecht usava
sua rede de influência para alterar os editais das Licitações para adotar
critérios que a favorecessem na disputa pela obra, segundo os delatores.
Trecho Sul do Rodoanel, em São Paulo: Roberto Cumplido,
delator da Odebrecht, afirma que a Licitação dos lotes do Rodoanel Sul envolveu
irregularidades. Além da cartelização das empresas, que definiram entre si quem
venceria a concorrência de cada lote da obra, Cumplido afirma que a Odebrecht
se reuniu com a Dersa (Desenvolvimento Rodoviário S/A) para fazer
"inúmeros pleitos relacionados aos editais de Licitação dos lotes da obra
do Rodoanel, que foram atendidos pela concessionária".
Guilherme Jardim
Jurksaitis, professor de direito administrativo na pós-graduação da FGV
Direito-SP, explica que essa prática descumpre a regra da lei que prevê que as
Licitações sejam sigilosas antes da publicação do edital. Segundo o professor,
"é comum o mercado procurar influenciar a administração na formulação de
seus editais, especialmente quando envolvem grandes obras".
Um dos motivos é o
fato de que a Licitação é feita apenas com o projeto básico da obra, de
responsabilidade poder público, que "não costuma dispor das condições
técnicas suficiente à elaboração de bons editais e projetos para grandes
obras". Porém, ele afirma que, ao buscar socorro na experiência do mercado
privado, os agentes públicos não podem acabar beneficiando uma empresa com
informações privilegiadas durante a Licitação.
Especialistas
apontam que há inúmeras oportunidades para que agentes públicos e privados se
aproveitem de brechas legais para praticar esquemas de corrupção após o
processo de contratação, mesmo que a Licitação tenha ocorrido dentro das
regras. Uma das mais comuns é a adoção de aditivos contratuais para aumentar o
valor do contrato, que podem ser negociados entre a empresa e o governo que
contratou a obra.
"A lei é muito
rigorosa para celebrar contratos, mas é muito permissiva para fazer
ajustamentos", diz Jardim, professor da FGV Direito-SP. Ele cita como
exemplo a falta de necessidade de transparência pública na elaboração e
celebração de aditivos e a falta de exigência de abrir uma concorrência para
que outras empresas possam fazer propostas para executar aquele trecho não previsto
no contrato original. "Formalmente a lei é cumprida. O problema é que a
corrupção não está no jogo formal, está por trás disso, e a lei não se
preocupou em fazer dispositivos mais sofisticados."
Os especialistas
explicam que nem sempre o dinheiro da propina está vinculado diretamente ao
dinheiro a ser recebido com um ajuste do contrato de Licitação. "Durante a
execução do contrato, a administração pode criar um milhão de problemas",
explica Sundfeld. "Por exemplo, a empresa prestou o serviço e o gestor não
paga, fala que não tem dinheiro e paga quando puder. Ou ela está disposta a
receber propina e criar facilidades para a empresa. Nesse caso, não é que a
empresa esteja violando a lei [de Licitações]. Ela viola outra lei, a lei
penal, que é pagar propina, mas o contrato em si não é inválido. Só que a
empresa diminuiu seu ganho pagando propina, senão seria prejudicada por
alguém."
Perimetral de Porto Alegre, no Rio Grande
do Sul:
Um exemplo de como políticos teriam conseguido "vantagens indevidas"
usando a flexibilidade da legislação é a obra da Perimetral de Porto Alegre, um
contrato de mais de R$ 600 milhões feito com dinheiro do governo federal,
envolvendo a Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre (Trensurb) e o consórcio
liderado pela Odebrecht. Em depoimento, Valter Luis Arruda Lana, delator da
Odebrecht, contou que a obra foi licitada ainda no governo de Fernando Henrique
Cardoso, em 2001, mas entre 2003 e 2007 ficou parada no Tribunal de Contas da
União (TCU). O projeto só começou a sair do papel em 2008, mas cheio de
"amarras", para evitar, principalmente, a possibilidade de celebração
de aditivos contratuais superfaturados.
Segundo ele, em um
período "curto" de tempo após o início das obras, a empreiteira teve
que negociar o pagamento de propina a quatro pessoas diferentes, que "se
diziam credoras" do projeto: Marco Maia (PT), ex-presidente da Trensurb,
Marco Arildo (PT), presidente da Trensurb em 2008, Humberto Kasper (PT),
diretor da Trensurb, e Eliseu Padilha (PMDB), ministro de FHC na época da Licitação.
Lana disse que ouviu deles a justificativa de que eles tiveram a chance de
criar dificuldades ao processo de Licitação, mas não o fizeram na época e, por
isso, queriam receber uma contrapartida da empresa. Ele também afirmou que
Paulo Bernardo (PT), ministro em 2008, o procurou para avisar que a obra tinha
sido inserida no PAC da Mobilidade, o que garantia que ela teria prioridades na
execução e pagamentos em relação a outras obras.
O delator contou
que foi favorável ao repasse de dinheiro em todos os casos para "não
correr riscos". Os especialistas explicam que o raciocínio tem lógica, já
que o andamento do contrato envolve a expedição de licenças ambientais, a
liberação de financiamentos e outros atos públicos que poderiam ficar prejudicados,
caso um político contrariado decida, por ação ou omissão, interferir no
processo.
No total, as cinco
pessoas teriam recebido o equivalente a 2,25% do valor total do contrato,
dinheiro que teria sido pago após a Odebrecht conseguir um único aditivo
contratual, referente a gastos extras para a obra, depois que um córrego não
incluído no projeto básico foi encontrado no trajeto da avenida.
Outra forma de
escapar do controle dos tribunais de contas, cada vez mais eficientes em
detectar "jogo de planilha" e pegar irregularidades em aditivos
contratuais, as empresas e o poder público também foram atrás de outras formas
de driblar esse cerco e executar repasses indevidos. Na arena Fonte Nova, na
Bahia, a Odebrecht recebeu parte do pagamento dentro de outro contrato.
Arena Fonte Nova, na Bahia: Com os aditivos
contratuais na mira dos tribunais de conta, principalmente em obras importantes
para a Copa do Mundo, o então governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), teria
pedido, à Odebrecht, uma forma "heterodoxa" de resolver uma dívida
com gastos extras que o consórcio entre a empreiteira e a OAS tiveram para
acelerar a obra e terminá-la em 2013, a tempo da Copa das Confederações. Esse é
o relato do delator André Vital Pessoa de Melo, que afirmou que a solução
encontrada foi incluir essa dívida no pagamento de outra dívida, da década de
1990, entre a Companhia de Engenharia Ambiental e Recursos Hídricos da Bahia
(Cerb) e a Odebrecht.
A dívida era de R$
390 milhões, mas a empreiteira aceitou reduzi-la para R$ 290 milhões, e afirmou
que só daria apoio a campanhas eleitorais do partido no estado se recebesse a
primeira parcela ainda em 2014. Pelo acordo, a Odebrecht repassaria ao PT R$ 30
milhões, mas o delator Cláudio Melo Filho afirma que só um terço do dinheiro
foi repassado.
Outra boa intenção
da Lei de Licitações que acabou virando estratégia para uma série de
irregularidades foi a facilidade oferecida aos concorrentes para questionar o
resultado de uma Licitação. Segundo Sundfeld, "se alguém entrar na
Licitação de fora do esquema, vai provavelmente ser soterrado por um ataque do
cartel. Basta ir com uma alegação qualquer no Tribunal de Contas ou na Justiça,
e eles dão uma liminar e param a Licitação".
Usina Hidrelétrica de Jirau, em Rondônia: Foi o caso de uma
das obras do Projeto Madeira, a construção da Usina Hidrelétrica de Jirau,
vencida pela empresa Tractebel-Suez. A Odebrecht, segundo os delatores Emílio
Odebrecht e Henrique Serrano Valladares, estava convicta de que a Suez teria
vencido a Licitação de forma irregular e, para tentar barrar a contratação,
teria apelado, em vão, ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e
depois teria pago R$ 5,5 milhões em espécie ao senador Edison Lobão (PMDB-MA),
para que ele interferisse junto ao governo Dilma.
Outra estratégia da
Odebrecht foi contar com o apoio do então deputado federal Eduardo Cunha
(PMDB-RJ) para atacar representantes do governo durante audiência na Câmara
sobre as obras da usina. Segundo Valladares, Cunha organizou um café da manhã
com ele e "pelo menos seis deputados", para que o executivo
"treinasse" os deputados a fazerem perguntas embaraçosas ao governo.
"A reunião do café era para que eu capacitasse os deputados a fazerem
perguntas durante essa reunião da comissão. Perguntas que eu sabia que eles não
tinham respostas, perguntas embaraçosas, que eu faria se estivesse lá na
condição de fazer. Então, eu fiz uma explanação daquilo que é o [rio] Madeira.
Eles não sabiam de nada disso, de Furnas, Odebrecht, investimentos de R$ 100
milhões, essa ladainha que os senhores não aguentam mais ouvir",
acrescentou o delator no depoimento.
Tanto a
Constituição Federal quanto a Lei de Licitações preveem que os contratos sejam
fiscalizados pelos tribunais de contas e pelos vereadores e deputados estaduais
e federais, que são ligados ao Poder Legislativo, além de órgãos como a
Controladoria-Geral da União e a própria Justiça. As delações da Odebrecht,
porém, mostram que os esquemas de corrupção envolveram inclusive quem deveria
controlar o processo para coibir irregularidades.
Obra de Angra 3, no Rio de Janeiro: Henrique Pessoa,
ex-executivo da Odebrecht, afirmou em depoimento ao Ministério Público Federal
que a empreiteira contratou uma sobrinha do presidente do Tribunal de Contas da
União (TCU), Ministro Raimundo Carreiro, como contrapartida à resolução de um
processo judicial sobre as obras da usina de Angra 3. De acordo com o delator,
a Licitação que foi vencida pelo consórcio do qual a Odebrecht participava em
Angra 3 foi judicializada e levada ao TCU pelo consórcio perdedor.
"[Em] uma das
reuniões na UTC [outra empresa do consórcio da Odebrecht], Antonio Carlos
Miranda [diretor da UTC] perguntou a cada um dos presentes lá, estávamos todos,
quem é que poderia contratar essa menina, a Fernanda, porque era uma solicitação",
relatou ele. "Em um primeiro momento todo mundo não tinha onde colocar,
coisa e tal. Mas ele insistiu e terminamos, nós, porque tínhamos uma obra
próxima da casa dela - se não me engano, ela morava no Campo Grande, no Rio de
Janeiro e nós tínhamos uma obra próxima - e ela acabou sendo fichada por nós, a
Odebrecht", explicou.
Após quase 25 anos
em vigor, não faltam críticas e propostas para melhorar a Lei de Licitações.
Até agora, ela já passou por diversas modificações, principalmente na lista de
hipóteses em que o poder público pode dispensar a Licitação - essa lista
praticamente dobrou desde que a lei saiu do papel. "As dispensas mostram o
fracasso da lei", afirma Guilherme Jardim. "Ela prevê hipóteses de
contratação direta. No início, eram 13 casos de contratação, hoje são mais de
30. Isso foi aumentando ao longo do tempo."
A experiência do
Regime Diferenciado de Contratações (RDC), exceção feita pelo governo federal
para obras ligadas à Copa do Mundo de 2014 e à Olimpíada do Rio de 2016,
dividiu opiniões e foi inclusive alvo de ações diretas de
inconstitucionalidade. Jardim explica que ela não é capaz de, sozinha,
erradicar os esquemas de corrupção, mas trouxe como novidade o dispositivo da
"contratação integrada", que permite que uma única Licitação seja
feita para o projeto básico da obra, o projeto executivo e a própria execução.
Carlos Ari Sundfeld
lembra que a própria Lei de Licitações foi criada sob forte influência das
empreiteiras, que tinham a intenção de controlar a competição. "É claro
que, quando você limita a competição, você aumenta a possibilidade de
cartel", explicou o professor de direito público. "Reformas
anteriores andaram criando furos nesse sistema, como a lei do pregão. Não serve
para obras, é mais para compras, mas tornou a competição mais radical."
Sundfeld diz que, ao dar espaço para empresas de fora, elas podem acabar
"desarranjando um pouco esses espaços muito contaminados" dos
esquemas de poder ligados a partidos. "Não acabam com isso, mas fazem uma
bagunça. Ter leis que estimulam mais a competição é bom."
Atualmente, o
projeto de lei mais avançado para fazer novas alterações na Lei de Licitações
foi aprovado no Senado em janeiro. Entre as mudanças está dobrar a pena de
prisão e permitir mais hipósteses para a "contratação integrada".
Porém, de acordo com os especialistas ouvidos pelo G1, as melhorias que ele
pode trazer não necessariamente estão ligadas ao combate à corrupção.
Entre as sugestões
feitas estão modificar artigos que dão aos gestores públicos um poder
"excessivo" sobre as empresas, como a possibilidade de atrasar o
pagamento em até 90 dias sem justificativa, assegurar maior controle do
orçamento para que uma obra não fique parada no meio do caminho por falta de
verba e derrubar "barreiras burocráticas" que estimulam a prática de
corrupção.
"Quanto mais
barreiras burocráticas, mais oportunidade tem para pedir propina. Mas os órgãos
de controle querem cada vez mais barreiras, inclusive criadas por eles mesmos,
para aprovar aditivo, ou resultado de Licitação... Mas e se a autoridade do
tribunal de contas se corromper? Então é mais oportunidade para a
corrupção", diz Sundfeld.
G1
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