Mensagens alegando que o Japão estaria testando um
"novo sistema educacional" com "um plano piloto revolucionário
chamado 'Mudança Valente' (Futoji no henko)", que inclui apenas cinco
disciplinas e nenhum dever de casa, são compartilhadas nas redes sociais
dezenas de milhares de vezes desde 4 de janeiro de 2021. Mas a afirmação é
falsa: as reformas feitas pelas autoridades educacionais japonesas não se
referem a esse termo e tampouco têm as características mencionadas nas
publicações virais.
O conteúdo
que circula, pelo menos, desde 2011 em diversos idiomas,
sugere que o novo projeto japonês é "baseado nos programas
educacionais Erasmus, Grundtvig, Monnet, Ashoka e Comenius" e que prepara os alunos para serem "Cidadãos do
mundo", diz um trecho da mensagem
compartilhada no Facebook (1, 2, 3) e Twitter (1, 2, 3).
Segundo o
suposto novo plano educacional, dizem eles, os alunos não têm dever de casa e
cursam apenas cinco disciplinas: aritmética de negócios (operações básicas e
uso de calculadoras financeiras), leitura (até ler um livro por semana),
educação cívica, computação (pacote Office, internet, redes sociais e negócios
online), idiomas (quatro ou cinco).
“Futoji no henko” é traduzido como “mudanças de fonte em negrito”, confirmou um repórter do escritório da AFP em Tóquio.
O termo se
traduz no alfabeto japonês como “太字 の 編粉”. Uma busca
no Google por esses sinogramas mostrou resultados relacionados a tutoriais para
alterar a espessura das fontes em vários aplicativos de tecnologia.
Outra
pesquisa, dessa vez pelo termo no alfabeto latino, forneceu vários resultados
com alertas de que as mensagens sobre uma suposta mudança no modelo
educacional japonês são desinformação.
O termo também não é encontrado no site do Ministério da Educação, Cultura, Esportes, Ciência e
Tecnologia do Japão. Um funcionário dessa pasta disse à AFP nunca ter ouvido
falar dessa expressão.
No site do
Ministério da Educação japonês é mencionado que a última
reforma (Lei da Educação Básica) foi feita
em 2006 “com o desejo de desenvolver ainda mais o estado
democrático e cultural” do país e de “contribuir para a
paz mundial e melhorar o bem-estar da humanidade”.
Com base
nisso, explica o ministério, em 2008 foi lançado o Primeiro Plano Básico para o
fomento da educação, com as diretrizes para atingir os objetivos previstos na
Lei. Em 2013 foi implementado o segundo e em 2018, o terceiro.
Nenhuma
referência é feita ao termo “Futoji no henko” nem aos programas educacionais Erasmus, Grundtvig, Monnet, Ashoka ou pedagogia Comenius, mencionados nos
conteúdos virais.
Tampouco há
referência ao suposto objetivo de formar “cidadãos do
mundo”. A Lei Básica afirma que “a educação deve
ser ministrada com o objetivo de desenvolver plenamente o caráter individual”.
"Seus horizontes serão
globais, não nacionais", indicam as
postagens virais. No entanto, a Lei aponta para a importância de “formar um povo
saudável de espírito e corpo e imbuído das qualidades necessárias às pessoas
que compõem uma nação e uma sociedade pacífica e democrática”.
Apenas
cinco matérias?
À AFP, o
ministério negou que os estudantes no Japão cursem "apenas cinco
disciplinas", como asseguram as publicações
virais.
Um documento publicado em 2015
por essa pasta japonesa, traduzido para o português por meio do aplicativo
Google Lens, mostra um esquema de disciplinas para o ensino médio. Nele são
mencionados mais de cinco temas, incluindo, entre outros, história japonesa,
economia, física, química, artes e ofícios, música e esportes.
O guia oficial de organização de disciplinas também indica uma lista com
mais de cinco, diferentemente do que é dito nos conteúdos virais, com, por
exemplo, história mundial, história japonesa, geografia, caligrafia,
artesanato, química, entre outros.
O Japão é um
dos países com os melhores indicadores educacionais segundo a Organização para
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). O país está no topo dos
rankings internacionais das provas PISA há mais de cinco
décadas.
AFP
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