Nos primeiros meses de aula deste ano, Maria (nome fictício), foi chamada à escola do filho quase todos os dias por conta de problemas de indisciplinas. Depois de meses em casa apenas com atividades remotas, o menino de 13 anos parecia ter desaprendido as regras escolares.
Ela conta que o menino tinha
um comportamento tranquilo e quieto em casa, mas, quando chegava à escola,
ficava agitado, agressivo e com dificuldade de concentração. Para ela, a
sensação era de que o filho tinha desaprendido a se comportar no ambiente
escolar.
A dificuldade de voltar a
conviver com os colegas não é um caso isolado. Segundo pesquisa feita pelo
Datafolha, 34% dos estudantes estão com dificuldade de controlar suas emoções
desde que voltaram a ter aulas presenciais de acordo com seus pais.
A pesquisa foi feita a
pedido do Itaú Social, Fundação Lemann e BID (Banco Interamericano de
Desenvolvimento). Foram ouvidos 1.308 responsáveis por 1.869 estudantes de
escolas públicas de todas as regiões do país. As entrevistas foram feitas por
telefone entre os dias 6 e 27 de maio.
Além da dificuldade em
controlar as emoções, 24% dos alunos estão se sentindo sobrecarregados e 18%
estão tristes ou deprimidos, de acordo com os pais. Ainda segundo a pesquisa,
só 40% dos estudantes estão recebendo algum tipo de apoio psicológico nas
escolas.
O filho de Maria estuda em
uma escola estadual em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, que registrou uma
série de brigas entre alunos no início do ano. Depois dos episódios, a unidade
passou a ter um psicólogo para atender os estudantes.
Segundo a mãe, foram
registrados tantos episódios de violência entre os estudantes que o psicólogo
não deu conta de atender a todos. Seu filho ficou em uma fila de espera para
atendimento, mas ela desistiu de cobrar já que o menino faz tratamento fora da
escola.
Desde o início do ano,
quando a maioria dos estados e municípios retomou completamente as aulas
presenciais, as escolas têm registrado uma escalada de casos de violência e
problemas de saúde mental entre os estudantes.
Nas escolas estaduais de São
Paulo, por exemplo, nos dois primeiros meses de aulas, houve um aumento de
48,5% de ocorrências de agressão física, em comparação a 2019. Em todo o país,
os professores também relatam aumento de casos de crise de ansiedade,
automutilação e falta de concentração dos estudantes.
"Por mais que houvesse
a percepção de que a pandemia e o isolamento prejudicaram a saúde mental dos
alunos, as escolas não podiam prever o tamanho desse problema. É uma situação
inédita que estão enfrentando e precisam da ajuda de outras áreas para lidar
com essas questões", diz Lucas Rocha, diretor de projetos de educação da
Fundação Lemann.
Além dos problemas
ocasionados pelo isolamento das crianças e adolescentes, a avaliação é de que a
sensação de sobrecarga dos estudantes pode também ser consequência do esforço
das escolas para a recuperação dos aprendizados perdidos durante a pandemia.
"Ainda que não se tenha
um diagnóstico nacional, sabemos que o prejuízo foi grande nesse período. As
escolas foram as primeiras a identificar essas perdas e estão tentando fazer a
recuperação. Por mais bem intencionadas e corretas que estejam, essas ações
precisam ser acompanhadas de acolhimento para não sobrecarregar ainda mais os jovens",
avalia Rocha.
A pesquisa também
identificou que 39% dos alunos matriculados nos anos iniciais do ensino
fundamental (do 1º ao 5º ano) estão com dificuldade em avançar no processo de
alfabetização e 6% não estão avançando, segundo a avaliação dos pais.
"É uma constatação
muito grave. Se a gente não garantir que essas crianças aprendam a ler e
escrever corretamente, estamos comprometendo toda a sua trajetória
escolar", diz Rocha.
Já nos anos finais do ensino
fundamental (do 6º ao 9º ano), quase metade dos estudantes (47%) tem alguma
dificuldade em ter vários professores. O aumento da complexidade dos exercícios
matemáticos e dos textos mais longos para leitura também são mudanças vistas
com alguma dificuldade para 73% e 56% dos alunos, respectivamente.
Yahoo Notícias, Folhapress
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