Grupo criou um aplicativo de reforço e cursos livres gratuitos de fotografia, programação, literatura entre outros.
Um grupo de voluntários no Jardim João 23, na Zona
Oeste de São Paulo, criou um espaço de inclusão e educação para incentivar a
continuidade dos estudos de crianças e adolescentes e ampliar o aprendizado por
meio de cursos livres durante a pandemia.
O projeto, chamado de New School, começou a ser
pensado por João Paulo Malara, de 29 anos, em 2014, após a morte do irmão mais
novo, Gabriel.
"Sou de uma família de 7 irmãos, fui criado pela
minha mãe que me deu amor e carinho para não desistir. Meu irmão, infelizmente,
acabou se envolvendo com o mundo do crime para mudar de vida e foi morto por um
policial no dia do aniversário de 19 anos", conta João. "Naquele
momento decidi que tinha que fazer alguma coisa para mudar o futuro dos jovens
que poderiam acabar da mesma forma que ele, isso pela educação."
João
Paulo lembra que começou a buscar ter contato com os jovens da comunidade para
entender o que eles sentiam falta de aprender. "Consegui enxergar que o
que faltava para eles é uma referência, alguém para se inspirar, que mostrasse
que o que mudaria os seus destinos seria a educação", diz.
Mas tirar o projeto do papel não foi fácil. Para
juntar dinheiro mais rápido e investir no aplicativo e no espaço, João largou
uma vida estável no Brasil, saiu do emprego, e foi trabalhar de garçom por um
ano em Nova York, nos Estados Unidos. Ele conseguiu juntar cerca de R$ 70 mil.
Com medo de acontecer alguma coisa com o dinheiro, ele
transferiu o valor total para um amigo no Brasil que investiu todo o valor em
criptomoedas. No entanto, a empreitada deu errado e João acabou perdendo todo o
dinheiro.
"Fui sem nada e voltei sem nada. Para não
desistir do New School vendi todas as minhas coisas, tudo que tinha comprado lá
e tudo que estava aqui. Voltei a morar com a minha mãe e consegui juntar um
dinheiro que deu para investir na primeira versão do aplicativo e na nossa
sede", explica.
O projeto New School, - tanto o aplicativo, quanto o
espaço físico - tem como objetivo ser um espaço de educação continuada.
"Criamos um movimento educacional para ensinar na
prática e de acordo com a nossa realidade por meio de um aplicativo. E agora a
gente dá educação da graça, na nossa linguagem e da forma que interessa ao
jovem", afirma Malara.
Como funciona o projeto?
Fora as atividades que podem ser realizadas no espaço
físico - apelidado de espaço resenha - como peças de teatro, saraus, prática de
esportes e entre outras, o aplicativo oferece 10 modalidades de cursos que vão
desde programação até fotografia, literatura e matemática.
O grupo de voluntariado é formado por jovens da
periferia, apelidado de P&D Quebrada, um grupo que levantam dados e
conteúdos de maior interesse da comunidade. Após debater, pesquisar e checar os
conteúdos, o grupo faz um planejamento de aula que é acompanhada, orientada e
respondida por um especialista.
"Temos o objetivo de expandir conteúdos que não
são falados na escola, de acordo com a nossa realidade. Em biologia, por
exemplo, contamos quais os efeitos no organismo quando você tem contato com
alguma droga que é muito usada nos bailes funks", conta João Paulo.
Todas as aulas são gravadas no Jardim João 23.
"Para os voluntários o projeto funciona super bem. A galera que trabalha
com a gente está desempregada, então essa rotina ajuda a manter a cabeça boa,
dá inspiração para continuar insistindo nos seus sonhos. Quem faz esse trabalho
realmente se sente bem consigo mesmo no fim do dia. Além de ser uma válvula de
escape dos problemas do dia-a-dia", aponta João Paulo.
O projeto é mantido com doações. Para o
desenvolvimento da versão mais aprimorada do aplicativo, o grupo abriu uma
vaquinha online.
Mudança
de planos com a pandemia
João conta que estava planejando um lançamento
nacional do aplicativo em abril de 2020. No entanto, com a pandemia, teve que
mudar os planos.
"Tivemos que mudar totalmente o nosso foco.
Ninguém consegue pensar em educação quando as pessoas estão passando
fome", pondera. Os voluntários se reuniram e passaram a entregar cestas
básicas na comunidade. Segundo João Paulo, foram mais de 20 mil quilos de
cestas entregues na região.
Alunos
atendidos
Atualmente, o aplicativo conta com cerca de 300 alunos
inscritos na plataforma. O projeto irá lançar a versão nacional do app, mais
elaborada e com mais funcionalidades em janeiro de 2021. Com isso, eles
pretendem alcançar mais pessoas de outras periferias do Brasil.
O espaço físico fica aberto de segunda a sexta com
atividades. A organização e limpeza do local ficam por conta da própria
comunidade. "As mães das crianças que visitam a gente ajudam a cuidar,
isso porque os filhos delas passam boa parte do dia aqui com a gente, então é
uma forma de retribuir."
Por
Deslange Paiva, no G1
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