Fux não pautaria as ações,
mas Lewandowski usou manobra para que o tema fosse analisado
O ministro Ricardo
Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), listou duas ações sobre a
compra de vacinas contra a covid-19 pelo governo federal para que elas sejam
julgadas, no plenário, na sessão do próximo dia 16.
A manifestação aconteceu após o presidente da Corte, ministro Luiz Fux,
apresentar um destaque e suspender o julgamento do caso, que ocorria no
plenário virtual. Quando um ministro apresenta destaque, o caso tem de ser
levado ao plenário físico. Como Fux é o presidente da Corte, caberia a ele
definir quando as ações serão pautadas.
Lewandowski, no entanto, não esperou uma definição do presidente e usou uma
manobra para que o tema fosse analisado no dia 16. Conforme o Valor apurou, Fux
não tinha a intenção de pautar as ações neste ano, já que restam poucas sessões
até o início do recesso do Judiciário.
De acordo com a assessoria de Lewandowski, o ministro entende que ao julgamento
das ações "é de caráter urgente para o resguardo da vida de centenas de
milhares de brasileiros em face da pandemia do corona vírus e da necessidade de
um plano eficaz de vacinação".
Em seu voto, o relator defendeu que o Ministério da Saúde deveria apresentar, em 30
dias, um detalhamento das suas estratégias para garantir "a imunização de
toda a população".
De acordo com o ministro, o plano teria de pormenorizar "ações, programas,
projetos e parcerias correspondentes, com a identificação dos respectivos
cronogramas e recursos financeiros, de maneira a assegurar a oferta e
distribuição tempestiva, universal e gratuita de vacinas em qualidade e
quantidade suficiente, segundo critérios técnicos e científicos
pertinentes".
Para o relator, esse plano deverá ser atualizado mensalmente pelo menos até
dezembro do ano que vem - e periodicamente ser remetido ao Congresso Nacional
"para os fins de fiscalização e
controle" previstos na Constituição Federal, no que será auxiliado
pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
A futura aquisição das vacinas pelo governo foi judicializada depois que o
presidente Jair Bolsonaro informou ter proibido o Ministério da Saúde de assinar um protocolo de
intenções para a compra de 46 milhões de doses da CoronaVac, produzida pelo
laboratório chinês Sinovac em parceria com o Instituto Butantan.
No voto, Lewandowski afirmou que o governo não pode rejeitar determinadas
vacinas "por critérios políticos, partidários ou ideológicos, nem
discriminá-las com base apenas em sua origem, muito menos repudiá-las por
razões de caráter subjetivo, não lhe sendo lícito abrir mão de qualquer
imunizante que venha a mostrar-se eficaz e seguro" contra o novo coronavírus.
"Constitui dever incontornável da União considerar o emprego de todas elas no
enfrentamento do surto, não podendo descartá-las, no todo ou em parte, salvo se
o fizer - de forma motivada - com base em evidências científicas sobre a sua
eficácia, acurácia, efetividade e segurança, bem assim com fundamento em
avaliação econômica comparativa dos custos e benefícios."
Lewandowski disse ainda que o Judiciário, via de regra, não deve impor a
implementação de políticas públicas, mas que as "dúvidas acerca de um
futuro acesso universal às vacinas" exigem do Supremo o exercício de um
poder contramajoritário, que ofereça "a necessária resistência às ações e
omissões de outros Poderes da República".
"Portanto, estando em jogo a saúde de toda a população brasileira, em
tempos de grande angústia e perplexidade, avulta mais do que nunca o dever que
incumbe ao Estado de pautar as respectivas ações em conformidade com evidências
técnicas, científicas e estratégicas, baseando-as, sobretudo, nos princípios da
prevenção e da precaução", escreveu.
Apesar da repercussão da fala de Bolsonaro sobre a CoronaVac, o advogado-geral
da União, José Levi, e o procurador-geral da República, Augusto Aras,
defenderam no Supremo que a manifestação não foi de caráter oficial, constituindo
mera publicação nos perfis pessoais do presidente nas redes sociais.
Outros dois processos ainda vão a julgamento, no plenário virtual, no próximo
dia 11 de dezembro e discutem se é constitucional a obrigatoriedade da vacina.
Por Isadora Peron, no Valor
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