quinta-feira, 15 de abril de 2021

Japão decide despejar no mar água tratada da usina de Fukushima

Mais de 1 milhão de toneladas de água contaminada estão armazenadas em centenas de tanques na usina nuclear de Fukushima

Governo japonês garante que despejo é seguro, mas decisão gera protestos de países vizinhos, pescadores e ambientalistas. Água radioativa está armazenada em tanques e passará por tratamento.

 

O Japão anunciou nesta terça-feira (13/04) que a água contaminada que está armazenada na usina nuclear de Fukushima será despejada no oceano Pacífico após receber tratamento para a remoção da maioria dos elementos radioativos. A medida gerou protestos de países vizinhos, pescadores e especialistas.

A decisão, muito especulada, mas postergada por anos devido a preocupações com segurança e protestos, foi tomada durante uma reunião dos ministros japoneses, que endossaram o despejo no mar como a melhor opção. O primeiro despejo ocorrerá em cerca de dois anos, tempo que a operadora da usina, a empresa Tokyo Electric Power (Tepco), necessita para filtrar a água para remover isótopos nocivos, construir uma infraestrutura e obter aprovações regulatórias.

O governo japonês argumentou que o despejo da água contaminada é necessário para prosseguir com o complexo desmantelamento da usina e afirmou que a substância despejada no oceano será semelhante às águas contaminadas liberadas rotineiramente de usinas nucleares em todo o mundo.

Aproximadamente 1,3 milhão de toneladas de água contaminada – ou o suficiente para encher cerca de 500 piscinas olímpicas – estão armazenadas em enormes tanques na usina de Fukushima a um custo anual de cerca de 900 milhões de dólares.

A água tem sido armazenada em tanques desde 2011, quando um terremoto e um subsequente tsunami danificaram os reatores da usina, contaminando a sua água de resfriamento, que começou a vazar. A capacidade de armazenamento estará esgotada no final do próximo ano.

Água tratada, não contaminada

"Liberar a água tratada é uma tarefa inevitável para desativar a Usina Nuclear de Fukushima Daiichi e reconstruir a área de Fukushima", disse o primeiro-ministro do Japão, Yoshihide Suga, sobre o processo que levará décadas para ser concluído. O premiê afirmou que o governo trabalhará para garantir segurança da operação de despejo e que ajudará a agricultura, pescadores e o turismo local.

O governo japonês fez questão de enfatizar os processos de filtragem e diluição. A assessoria de imprensa do governo enviou um e-mail a veículos de comunicação na segunda-feira para solicitar que o termo "contaminado" não fosse mais usado em reportagens, argumentando se tratar de um termo enganoso.

A Tepco planeja filtrar a água contaminada para remover os isótopos, deixando apenas o trítio, um isótopo radioativo do hidrogênio difícil de separar da água. A empresa diluirá a água até que os níveis de trítio caiam para abaixo dos limites regulamentares. A substância é considerada relativamente inofensiva porque não emite energia suficiente para penetrar na pele humana. Outras usinas nucleares mundo afora despejam rotineiramente água com baixos níveis deste isótopo nos oceanos.

Os Estados Unidos observaram que o Japão trabalhou em estreita colaboração com a Agência Internacional de Energia Atômica. "Nesta situação única e desafiadora, o Japão pesou as opções e efeitos, foi transparente sobre sua decisão e parece ter adotado uma abordagem de acordo com os padrões de segurança nuclear aceitos globalmente", disse o Departamento de Estado dos EUA.

Vizinhos não foram consultados

Os países vizinhos do Japão, no entanto, se opuseram a decisão de Tóquio. A China e a Coreia do Sul pediram por mais consultas sobre o plano japonês de despejo. Taiwan também expressou preocupações.

"Esta ação é extremamente irresponsável e prejudicará seriamente a saúde pública internacional e a segurança, bem como os interesses vitais dos cidadãos dos países vizinhos", disse o Ministério do Exterior da China em um comunicado.

O governo sul-coreano convocou o embaixador do Japão num gesto de protesto contra a medida. "A decisão nunca poderá ser aceita e não causaria perigo apenas à segurança e ao ambiente marítimo dos países vizinhos, mas também foi tomada unilateralmente, sem consultas suficientes com nosso país, que é o vizinho mais próximo do Japão", disse um funcionário do alto escalão do governo sul-coreano, após uma reunião de emergência para debater sobre o assunto.

Em um comunicado posterior, um membro do governo japonês disse a repórteres que o Japão havia consultado seus vizinhos. 

 

Sindicatos de pescadores de Fukushima têm pedido ao governo há anos que não despeje a água, sob o argumento que tal medida teria um "impacto catastrófico" no setor. A Tepco prometeu compensar comunidades de pescadores e outros setores que podem sofrer danos à reputação devido ao despejo.

"Qualquer radioatividade liberada no meio ambiente terá consequência"

Em entrevista à DW, o especialista em temas nucleares do Greenpeace, Shaun Burnie, afirmou que o despejo das águas da usina de Fukushima não tem como ser feito de forma segura.

"A alternativa clara existe há anos, e isso é o armazenamento de longo prazo", disse Burnie. Ele acrescentou que o governo japonês havia dito anteriormente que haveria espaço suficiente disponível fora da usina para armazenar os resíduos.

De acordo com Burnie, o despejo da água contaminada liberará materiais radioativos, incluindo o trítio, que, em algumas porcentagens, pode "se tornar organicamente ligado" às células humanas ou de peixes. Um artigo na publicação científica Scientific American relatou em 2014 que, quando ingerido, o trítio pode aumento os riscos de câncer.

"Outros isótopos radioativos como o estrôncio 90, que poderia ser liberado nestes despejos, concentram-se nos ossos de peixes e humanos, aumentando os riscos de câncer", prosseguiu Burnie. "Qualquer radioatividade liberada no meio ambiente terá uma consequência. Isso não significa que inevitavelmente resultará em casos de câncer na saúde, mas aumenta a carga de radiação e isso não é aceitável."

Da Deutsche Welle


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