Na sexta-feira 1.º de setembro, data da saída do
mês de agosto, ou seja, do desgosto, a Secretaria de Comunicação do Palácio do
Planalto divulgou nota oficial longa e vazia na qual chamou o marchante goiano
Joesley Batista, do Grupo J&F, de “grampeador-geral da República”.
Aparentemente, a Presidência da República apontou suas pesadas baterias
antiaéreas para derrubar uma flecha de bambu que o procurador-geral, Rodrigo
Janot, preparou, segundo anunciaram as trombetas de Jericó, para atingir o
presidente Michel Temer com mais uma denúncia criminal.
Em resposta ao desaforo, o maior produtor e comerciante de proteína
animal do mundo chamou publicamente o presidente, que está na China em longa
viagem de turismo para evitar vaias amanhã, no desfile militar do Dia da
Pátria, de “ladrão-geral da República”. É pouco ou quer mais? Joesley disse
ainda que Temer “envergonha” todos os brasileiros. Delator da Lava Jato, o
desafeto-mor do chefe do governo afirmou, também em nota (que pretensão!), que
a colaboração premiada é um direito e o ataque à prerrogativa revela a
“incapacidade” de Temer se defender dos próprios crimes.
O Palácio do Planalto desqualificou o duplamente contador (de dinheiro e
de furtos desqualificados) Lúcio Funaro, que firmou acordo de delação com o
Ministério Público Federal (MPF). Segundo vazamentos, este contou que seu
silêncio foi comprado por Joesley, dando sentido ao enigma de Temer no Jaburu:
“Tem que manter isso, viu?”. Em seu papel de santo do pau oco, Joesley
pontificou: “A colaboração premiada é por lei um direito que o senhor presidente
da República tem por dever respeitar”. Entrementes, a Veja publicou
entrevista do acusador na qual tentou passar de vilão a vítima: “Na hora em que
os nossos anexos começarem a revelar outras organizações criminosas, aí talvez
a sociedade vá olhar e dizer: ‘Pô, o Joesley teve a imunidade, mas olha como
ele ajudou a desbaratar a corrupção’.” O esperto aposta na idiotice geral dos
otários.
Só que anteontem o precipitado-mor da (des)União revelou dispor-se a
cancelar prêmios e manter penas apontadas na delação de Joesley porque se
sentiu logrado pelo bamba do abate. E, pior ainda, traído por seu ex-braço
direito Marcelo Miller, de quem a Nação inteira já desconfiava por ter deixado
o Ministério Público Federal, tudo indica sem sequer trocar o paletó, para se
dedicar à defesa dos donos e executivos da JBS nas tratativas para a referida
dita cuja delação premiada. A revelação de que Janot foi ludibriado pelo
procurador que virou advogado do delator valeu por uma flechada de metal no
próprio pé. As gravações e documentos antes desconhecidos viraram o jogo em
favor de Temer.
Para o advogado do presidente, Antônio Cláudio Mariz de Oliveira,
Joesley “não merece nenhuma resposta em face da sua origem e do conhecido
comportamento absolutamente reprovável do delator”. Esta reação pífia não
encobre o fato de seu cliente ter recebido o insultado para um papo amigável
sobre compra de silêncio de réu e de omissão de juízes e procuradores, ao
abrigo das trevas do porão do palácio ao qual este fora acolhido sem revista e
usando nome que nem era seu. Gravada, a tertúlia sustentou o depoimento em que
se baseou a primeira denúncia de Janot contra Temer.
O tiroteio de baixo calão travado no curral do Jaburu dá bem uma ideia
do nível de desrespeito de autoridades e ex-cúmplices tornados desafetos às
nossas instituições republicanas. O pior é que ladrão pesa muito mais do que
grampeador. Havemos de observar que, na hierarquia dos crimes, o de furtar é
muito mais grave do que o de grampear. E nunca foi dada uma resposta à altura.
A única seria Temer explicar de forma detalhada e convincente suas relações e
seu compromisso secreto e suspeito com Joesley no Jaburu. E Janot pisou no
tomate vencido que atirou na lapela presidencial.
Para a Nação, emergindo agoniada da fossa da depressão, não há mocinhos
neste faroeste caboclo. Mede-se a culpa de Joesley pelos 2 mil anos de penas
perdoadas para contar uma história da qual só revela a parte que lhe convém. O
MPF, após seu chefe ter sido insultado de “ingrato” pelo ex-presidente Lula,
aparece depois da última confissão como interessado apenas em implicar Temer e
o PMDB. Por isso, relevou úteis informações que o delator na certa tem sobre o
padrinho mais forte no poder, Lula, que propiciou a um modesto açougueiro do
interior de Goiás tornar-se magnata mundial da próspera indústria do abate de
bois com juros de banana podre, subsidiados por um banco público.
Não convence o motivo dado por Janot, a 11 dias de deixar o cargo, para
o prêmio excessivo a patrões e empregados da JBS: facilitar a investigação. E
mais: não apareceu documento algum esclarecendo as razões de o bamba do abate
ter merecido tantas benesses após conversas “republicanas” que disse ter
mantido com Lula e o então presidente do BNDES, Luciano Coutinho.
Falta ainda o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin
ser questionado pelos colegas a respeito da homologação da delação, agora
reveladora de que o populacho tinha razão em abominá-la.
No meio desse charivari todo, do outro lado do planeta, Temer
comporta-se como São Sebastião catequizando o Extremo Oriente, à espera de
flechas bambas de Janot, que nunca pareceu se esforçar muito para investigar o
papel de Dilma Rousseff na compra da “ruivinha” em Pasadena. Ou a conexão de
Lula e da própria Dilma com contas milionárias que o próprio Joesley informou
ter aberto no exterior.
Esta República de bananas podres ficou a mercê de filhotes de César
Maia, Fufuca Dantas, José Sarney e Fernando Coelho – estes dois protagonistas
de mais um lance com o qual o governo tenta entregar generosas partes da
Amazônia a bandidos proibidos de desmatar e garimpar no exterior.
José Nêumanne, no
Estadão
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