Fraude até nas bolsas de estudo
Ao menos 28 pessoas
foram presas pela Polícia Federal ontem durante uma operação que investiga
fraudes milionárias no repasse de bolsas de estudo a pessoas sem vínculos com a
Universidade Federal do Paraná (UFPR). Segundo a investigação, os suspeitos desviaram
cerca de R$ 7,4 milhões em bolsas de pesquisas para 27 pessoas entre 2013 e
2016.
Entre eles havia
ajudantes de cozinha, taxistas, aposentados, donos de salões de beleza, um
pedreiro, uma vendedora de rou pinhas de boneca Barbie e beneficiários do Bolsa
Família. A PF investiga se eles agiram como laranjas.
Também foram
detidas duas servidoras da UFPR: Conceição Abadia de Abreu Mendonça e Tânia
Marcia Catapan, da Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação. Mendonça era chefe
do controle e execução orçamentária, e Catapan, secretária administrativa do
gabinete. Foram citadas como responsáveis pelas ordens de pagamento das bolsas
fraudulentas.
'Quantos
pesquisadores sérios deixaram de receber recursos, enquanto esse dinheiro todo
estava sendo desviado?' , afirmou João Manoel da Silva Dionísio, secretário de
Controle Externo do Tribunal de Contas da União (TCU).
A fraude, segundo a
PF, foi detectada pelo TCU e comunicada à UFPR. A operação foi realizada em
parceria também coma Controladoria-Geral da União (CGU). Alguns dos
investigados chegavam a receber até R$ 24 mil por mês em bolsas de pesquisa.
As bolsas dos 27
investigados foram pagas a título de auxílio à pesquisa, para estudos no país e
no exterior. Boa parte dos beneficiários, porém, não tinha nem ensino superior,
e nenhum possuía currículo na plataforma Lattes – obrigatório para concessão de
bolsas acadêmicas.
Jornal de Brasília
TCU vê nepotismo e desvios em bolsas ao monitorar
repasses do Dnit à UFPR
Auditoria foi em
sete contratos; denúncia ainda deve ser julgada pela Corte. Em um caso, chefe
do Dnit responsável por 'liberar verba' do órgão recebeu pagamento como
professora da UFPR.
Por Gabriel Luiz, G1 DF
O Tribunal de
Contas da União (TCU) investiga sete contratos entre o Departamento Nacional de
Infraestrutura de Transportes (Dnit) e a Universidade Federal do Paraná (UFPR)
suspeitos de fraude. Entre as irregularidades apontadas estão casos de
nepotismo, fraudes em pagamento de bolsas e repasses indevidos a professores e
servidores – e até parentes deles – com poder de decisão sobre os contratos.
As apurações a que
o G1 teve acesso correm em sigilo e ainda devem ser julgadas em Plenário. Os
envolvidos negam irregularidade (veja ao final desta reportagem a resposta de
cada citado). Nesta quarta-feira (15), a UFPR foi justamente alvo de uma ação
da Polícia Federal que prendeu pelo menos 27 pessoas suspeitas de desviar
dinheiro de bolsa de pesquisa .
Os acordos
analisados pelo TCU neste caso se referem a serviços de meio ambiente prestados
pela UFPR ao Dnit, com o objetivo de fiscalizar e supervisionar obras como
construção de rodovias ou pontes pelo país, por exemplo. Somados, eles
totalizam R$ 71,95 milhões. Esse valor corresponde a 84% do que a instituição
recebeu da autarquia entre 2009 e fim de 2015, em 15 contratos ao todo. Os
desvios são de pelo menos R$ 1,29 milhão, de acordo com o tribunal.
Além da suspeita de
pagamentos indevidos, os técnicos do TCU também apontam que os serviços
executados poderiam ter sido realizados por qualquer empresa privada do
mercado, uma vez que as demandas eram de 'baixa complexidade'. Os contratos
foram firmados sem Licitação, o que 'onerou os cofres públicos' e 'ensejou a
malversação de dinheiro público', segundo o tribunal.
De acordo com a
Corte, o Dnit não tomou 'os devidos cuidados ao decidir dispensar/inexigir o
processo licitatório para contratação de serviços comuns', que eram confiados à
UFPR. Para o TCU, a situação demonstra 'consequente desvio da missão
institucional' da universidade, que deveria 'atuar somente nas atividades de
ensino e pesquisa'.
Para o esquema
apontado funcionar, a UFPR supostamente 'reelaborava' os planos de trabalho
criados pelo Dnit para aparentar serem projetos de cunho acadêmico. Assim,
fundações ligadas à instituição conseguiam abrir orçamento para 'subcontratar'
empresas privadas, que acabavam executando os trabalhos. As companhias
escolhidas, segundo o TCU, eram ligadas a professores da universidade.
Planilha lista
parte dos pagamentos à excoordenadora do Dnit Aline Figueiredo (Foto:
Reprodução)
Irregularidade de gestão
Segundo o Tribunal
de Contas, uma funcionária do Dnit responsável por autorizar os pagamentos à
UFPR acabou recebendo dinheiro da universidade. No entendimento dos técnicos do
TCU, a então coordenadora-geral de meio ambiente do Dnit, Aline Figueiredo
Freitas Pimenta, faturou ao todo R$ 450 mil.
Ela recebeu R$ 45
mil em 2010 como funcionária autônoma, e R$ 405 mil entre agosto daquele ano e
janeiro de 2011 como 'instrutora e professora de cursos livres'. Aline esteve
no cargo de chefia no Dnit entre julho de 2010 e setembro de 2015.
Na prática, a
servidora foi paga por contratos que ela mesma autorizou, diz o relatório. O G1
também apurou que o marido de Aline, André Luís Pimenta, recebeu R$ 43 mil por
serviços supostamente prestados em 2010.
Uma funcionária
terceirizada do Dnit e excolega de trabalho de Aline, Juliana Karina Silva,
também foi favorecida em contratos de gestão ambiental. Em 2010, ela faturou R$
45 mil por serviços de consultoria em obras de construção de pontes em rodovias
federais.
O levantamento do
TCU também mostra que o antecessor no cargo de Aline, Jair da Silva, recebeu ao
todo R$ 60 mil em 2011. Ele foi chefe no Dnit entre 2008 e 2010. Na prática, o
grupo que tinha o poder de liberar verba para a UFPR se beneficiou dos próprios
contratos que administrava.
Ponte sobre o Rio
Paraná na BR-262; a obra é uma das contempladas nos contratos entre Dnit e a
UFPR (Foto: Dnit/Divulgação)
'Uma vergonha'
Segundo o TCU, um
professor que chegou a emitir pareceres favoráveis ao contrato com o Dnit, alvo
de questionamentos internos, também se beneficiou.
Ele era membro do
Conselho de Planejamento e Administração da UFPR e ganhou R$ 18 mil a título de
'bolsa de projeto', entre novembro de 2012 e abril de 2013.
'A situação
caracteriza a ausência indiscutível de segregação de função pelo mencionado
docente", diz o documento.
"E por ser de
notório conhecimento de todos os conselheiros e demais membros do respectivo
departamento/setor da universidade, a conduta parece não ser reprovável pelos
seus pares no âmbito da UFPR', argumenta o relatório do TCU.
'Se assim ocorre,
outras situações semelhantes podem estar sendo encaminhadas ao arrepio do
interesse público e da regular transparência do uso do dinheiro público.
Situações essas em que processos são aprovados de forma irregular nos Conselhos
Superiores da UFPR, ensejando benefícios ilícitos àqueles que têm o poder de
decidir e/ou de influenciar decisão acerca da aprovação de determinado projeto.
Infelizmente, uma vergonha!'
Nepotismo
Os técnicos do
tribunal também indicam que houve nepotismo nos contratos. De acordo com a
denúncia, o professor da UPFR Eduardo Ratton contratou e autorizou pagamentos
para o próprio filho e filhos de dois outros professores. Ratton era
responsável por conduzir quatro dos seis projetos ligados ao Dnit na
universidade.
De acordo com o
TCU, um sócio do filho de Ratton também ganhou o dinheiro com a situação
investigada. Ele 'já vinha sendo beneficiado com recursos oriundos do Dnit
desde 2010, quando passou a integrar a folha de pagamento' de um projeto sob a
coordenação de Ratton.
Depois que abriu
uma empresa de consultoria com o filho de Ratton em maio de 2013, ele passou a
receber indevidamente 'bolsa de projeto', que normalmente seriam endereçadas
somente a docentes da universidade. Os pagamentos superam R$ 266,9 mil. Ratton
também é suspeito de contratar a empresa de consultoria de um professor da
própria UFPR. Ele recebeu ao todo R$ 259,2 mil de recursos do Dnit.
O Tribunal de
Contas também deve julgar se há irregularidade no pagamento a duas professoras
universitárias. Uma docente recebeu pagamento de R$ 12,5 mil por trabalhar como
estagiária. A outra continuou recebendo dinheiro de uma bolsa mesmo depois de
ter contrato encerrado contrato temporário. O valor chegaria a R$ 15,3 mil,
segundo o TCU.
Contratação dupla
A Corte apurou que
17 sócios de 14 empresas ganhavam dinheiro ao mesmo tempo que as próprias
companhias já eram contratadas pela Fundação da UFPR (Funpar). Em um dos casos,
por exemplo, um empresário recebeu R$ 74 mil como autônomo ao mesmo tempo que a
firma dele recebeu R$ 89,9 mil. A empresa de um funcionário da Funpar –
responsável por executar os contratos – também foi contratada.
'Em alguns casos,
os pagamentos das empresas e dos respectivos sócios ocorrem no âmbito do mesmo
projeto. O fato demonstra má-fé da coordenação dos projetos, pois inaceitável o
argumento de desconhecimento do nexo entre a pessoa jurídica contratada e
respectivos sócios e vice-versa."
"Há afronta
evidente aos princípios constitucionais da moralidade, impessoalidade,
publicidade, legalidade e eficiência', diz o órgão.
Não recomendado
Em 2012, um parecer
interno elaborado pela UFPR já alertava para o risco de a universidade
subcontratar empresas, prática proibida por lei. Membro do Conselho de
Planejamento e Administração da unversidade, o professor Ney Mattoso Filho
atentou para o fato de que dificilmente a universidade teria condição de
executar diretamente os serviços a que se propunha. Um dos motivos seria a
distância em relação aos canteiros de obras, como no contrato que previa
realização de estudos ambientais na BR-262, no Mato Grosso do Sul.
'Todo o conjunto
probatório reunido nos autos constitui indícios de conluio entre dirigentes do
Dnit e da UFPR com o fim de direcionamentos de contratações e de pagamentos de
bolsas para docentes, sem respaldo legal, à custa de Recursos Públicos federais',
diz o tribunal. 'Assim, ante as gravíssimas irregularidades detectadas,
entendemos que esta Corte de Contas deve atuar firmemente para restabelecer a
legalidade da atuação da UFPR e estancar as irregularidades na aplicação de
Recursos Públicos.'
O G1 teve também
acesso a um parecer interno do Dnit que igualmente fez alertas sobre o
contrato. Em novembro de 2013, o procurador federal Vinícius Campos afirmou que
a Constituição expressa que "obras, serviços, compras e alienações devem
ser contratadas pelo poder público por meio de Licitação, que tem por objetivo
selecionar a proposta mais vantajosa".
"Deve,
portanto, a Diretoria Gestora demonstrar, por meio de pesquisa de mercado,
comparação com contratações anteriores ou qualquer outro meio idôneo, que a
assinatura do presente termo é mais vantajosa do que a abertura de certame
licitatório."
OUTROS LADOS
>>Universidade Federal do Paraná: A UFPR
informou que tem sido chamada junto com outras universidades nos últimos três
anos pelo Dnit por conta de sua 'excelência acadêmica'. 'Concluindo, eventuais
responsabilidades apontadas neste processo de verificação da execução dos
projetos citados serão objetos de responsabilização dentro das normas
regimentais da UFPR e da Funpar e seguindo as diretrizes do arcabouço legal da
gestão pública brasileira.'
>> Dnit: O
órgão informou que as contratações são realizadas 'estritamente dentro da
legalidade' que 'repudia qualquer ato ilegal de seus gestores e contratados'.
Sobre o fato de contratar a fundação universitária para prestar serviços que,
segundo o TCU, deveriam ser realizados por empresas, o Dnit alegou que 'existe
previsão legal na legislação vigente'.
'É preciso lembrar
que termos de cooperação, convênios e outros são previamente analisados pela
Procuradoria Federal Especializada junto ao Dnit, que verifica a questão legal,
para serem formalizados/entrarem em vigor, devem necessariamente ser aprovados
pela Diretoria Colegiada do Dnit, que é o órgão de deliberação da autarquia,
sendo composto por sete diretores.'
'O Dnit, então,
firma termos de cooperação, termos de compromisso e convênios em diversas
áreas, com várias entidades, buscando a troca de experiências e a cooperação
mútua.'
>> Aline
Figueiredo: Em nota, a ex-diretora afirmou que os valores citados pelo TCU
estão errados. 'Essa informação é fruto de uma interpretação incorreta dos
dados provenientes da base de dados do Governo Federal (Gfip), de onde os
valores foram extraídos, que consistiu na consideração indevida de um mesmo
valor por diversas vezes na somatória que resultou em um montante de
recebimento incorreto.'
Ela diz ter
prestado serviço técnico antes de assumir o cargo de chefia no Dnit, recebendo
R$ 45 mil por isso. 'Todos os meus atos durante a minha gestão sempre foram
pautados pela legalidade', afirmou.
Sobre o marido
também ter recebido dinheiro de contratos com a UFPR, Aline disse que ele é
engenheiro civil, com especialização em meio ambiente e que prestou serviço
técnico no momento em que ela também era consultora. Por isso, não há 'qualquer
tipo de impedimento legal', declarou.
>> Juliana
Karina: Ela disse desconhecer as apurações do TCU e disse que nunca foi
servidora do Dnit. "Apenas prestei serviços de consultoria para empresas
privadas e instituições, que por sua vez, possuíam contratos com o Dnit."
>> Eduardo
Ratton: Ele negou ter havido nepotismo ou ter favorecido qualquer pessoa nos
contratos. "O TCU será responsabilizado pelas falsas acusações e
leviandades das acusações. Pena não tenhamos tido a oportunidade de nos
apresentar e trazer a confirmação dos fatos reais. Sou professor Titular da
UFPR há 36 anos e participo do desenvolvimento tecnologico do país desde
então."