O procurador
Deltan Dallagnol, ex-coordenador da Lava Jato em Curitiba, fala sobre o esforço
dos poderosos para destruir a operação e diz que hoje gasta grande parte de seu
tempo respondendo a processos disciplinares
Um dos
principais símbolos da Lava Jato, ex-coordenador da força-tarefa de Curitiba, o
procurador da República Deltan Dallagnol é hoje um mero espectador do processo
de implosão da maior operação de combate à corrupção da história do país. Desde
2019, ele vê o fortalecimento de um movimento cada vez mais escancarado de
políticos e de magistrados, inclusive do Supremo Tribunal Federal, que tem
ajudado não só a reconstruir o ecossistema corrupto que as investigações
colocaram em xeque, como também a perseguir os investigadores que estiveram à
frente dos casos - ele próprio é um dos principais alvos da vingança. 'A maior
parte dos políticos envolvidos nos escândalos reocupou suas posições de poder',
diz.
Nesta entrevista a Crusoé, o procurador conta no que se transformou sua vida
após os sete anos em que ficou à frente da Lava Jato - ele deixou a
força-tarefa em setembro de 2020. Dallagnol diz que, hoje, gasta grande parte
de seu tempo cuidando dos processos disciplinares aos quais responde em razão
da operação. Ele compara a situação à do procurador Antonio Di Pietro, que
conduziu a Operação Mãos Limpas, na Itália, onde o establishment político
também se reorganizou e reagiu ferozmente às investigações.
Sobre o discurso de investigados, réus e condenados que, como o ex-presidente
Lula, agora se aproveitam do processo de esfacelamento da Lava Jato para posar
como perseguidos e injustiçados, o procurador lembra que 'alegar perseguição
está na página um do manual do político que é investigado por corrupção'. 'A
anulação dos casos não apaga a história, os fatos e as provas', afirma. Eis a
entrevista.
A Lava Jato acabou?
Se a Lava Jato for definida como o conjunto de suas investigações e processos,
seguirá ainda por muitos anos. Embora a maior parte das linhas iniciais das
investigações tenha surgido entre 2014 e 2019, na fase de expansão dos
trabalhos, a investigação da consistência dessas linhas, numa fase de
aprofundamento, pode demorar muito tempo. Além disso, processos relevantes
tramitarão por mais de uma década. É um trabalho que vem sendo feito por
servidores públicos corajosos de diferentes instâncias e órgãos, num ambiente
hostil no qual, como disse o ministro Barroso recentemente, o sistema tem sede
de impunidade e vingança. Contudo, há um outro modo de olhar a Lava Jato. Ela
pode também ser compreendida como uma atitude, um grande esforço institucional
conjunto, da polícia, do Ministério Público e do Judiciário, em todas as
instâncias, para implementar a justiça penal de modo efetivo contra criminosos
que usaram a política para saquear o país. Foi esse esforço que proporcionou a
contínua expansão das investigações da macrocorrupção brasileira por alguns
anos. Se assim a entendermos, é inegável que, a partir de março de 2019, houve
uma virada com julgamentos do STF que geraram insegurança jurídica e resultaram
na anulação de casos como Pasadena e Bendine (refere-se ao caso que envolvia a
compra da refinaria de Pasadena, no Texas, e ao processo de que era alvo
Aldemir Bendine, ex-presidente da Petrobras e do Banco do Brasil). O movimento,
que alguns chamam de garantista ou revisionista, culminou com a decisão, em
novembro daquele ano, que proibiu a prisão após a condenação em segunda
instância.
Esse novo entendimento dificultou muito a possibilidade de responsabilização
dos crimes do colarinho branco, pelo tempo de duração dos processos e chances
de anulação e prescrição. Sem receio de punição, investigados e réus deixaram
de cooperar com a Justiça. Foi aí que o coração pulsante que promovia a
expansão da Lava Jato parou de bater. Por esse outro ângulo, a Lava Jato como a
conhecemos inicialmente deixou de ter condições para seguir se expandindo a
partir de novembro de 2019. A anulação de outros casos como os de Lula e
(Michel) Temer, mais recentemente, reforçou o sentimento de que a justiça penal
não está mais tendo a mesma efetividade que tinha no início da operação. A isso
se somaram iniciativas como alterações legislativas e o fim das forças-tarefas.
Contudo, mesmo por esse ângulo que situa a Lava Jato entre 2014 e 2019, há
muito por que lutar. Há um legado positivo de resultados, há investigações e
processos desencadeados em andamento e há o futuro do combate à corrupção.
Precisamos perseverar no esforço por mais avanços e menos retrocessos.
A declaração de suspeição do ex-juiz
Sergio Moro abre espaço para outras derrotas da operação?
Primeiro, é conveniente esclarecer que as 'derrotas' não são da Lava Jato, mas
da sociedade brasileira. Nós, os agentes públicos, apenas desenvolvemos o
trabalho, tentamos fazer da melhor forma possível e continuaremos tentando. De
qualquer forma, em relação aos resultados alcançados, há, sim, espaço para a
sua reversão, mas não em razão da suspeição. Independentemente da minha
discordância em relação ao julgamento, é difícil que a suspeição se estenda
para outros casos porque foi embasada em decisões do ex-juiz que têm especial
relação com o caso do ex-presidente Lula, como a publicização de áudios de
conversas entre autoridades, a interpretação equivocada de que teria havido a
interceptação indevida de advogados, o levantamento do sigilo de trecho da
colaboração de (Antonio) Palocci e sua ida para o governo Bolsonaro. Por outro
lado, a declaração da incompetência de Curitiba pode ser replicada para outros
casos envolvendo políticos. Seu fundamento foi o fato de que a participação do
ex-presidente no esquema envolveria outros órgãos públicos para além da
Petrobras. Um argumento idêntico foi usado recentemente para o STF retirar o
caso Temer do Rio de Janeiro, anulando-o. Há o receio de que esse mesmo
argumento seja estendido para casos envolvendo outros políticos, porque em
geral eles participavam de esquemas de corrupção mais amplos. Isso geraria uma
anulação seletiva dos casos, no sentido de que os políticos seriam os maiores
beneficiados. Além disso, em 2019, o STF criou novas regras referentes à
competência da Justiça Eleitoral e ao direito do réu delatado de falar por
último. O problema foi que permitiu a aplicação dessas novas regras para anular
investigações pretéritas, apesar de terem tramitado quando as regras não
existiam e de terem seguido todas as regras vigentes na sua época. Isso gera um
ambiente de insegurança jurídica propício para novas anulações.
No auge da força-tarefa, o sr.
considerava a possibilidade de o establishment político se reorganizar tão
rapidamente e reagir de maneira tão intensa contra as investigações?
Sim, porque foi o que aconteceu na Itália com a Operação Mãos Limpas. Lá,
depois de dois anos, narrativas enfraqueceram o apoio da opinião pública,
começou a aprovação de leis para soltar criminosos e promover sua impunidade, o
procurador que liderou a operação passou a responder a dezenas de apurações e
investigações e a pauta anticorrupção foi substituída no Parlamento pela
discussão de supostos abusos praticados pelos investigadores. Seguimos o mesmo
roteiro, mas demorou mais tempo para isso acontecer aqui, provavelmente em
razão de fatores como a maior transparência dos trabalhos por meio de processos
públicos e eletrônicos, uma imprensa mais plural, a existência das mídias
sociais e a expansão progressiva das investigações sobre os diferentes
partidos. O que as duas operações mostraram, infelizmente, é que a Justiça não
se sobrepõe à política.
Ainda vamos ver o dinheiro recuperado
sendo devolvido aos condenados por corrupção?
Espero que não. O trabalho feito é sólido, calcado em fatos, provas e na lei.
Foram bilhões devolvidos por criminosos confessos. Dezenas de contas secretas
recheadas de propinas foram descobertas. Contudo, eu não contava com a anulação
dos casos Bendine e Pasadena e, mais recentemente, dos casos Temer, Lula e
Guido Mantega. Não esperava também a suspensão dos casos envolvendo o
presidente da Câmara, Arthur Lira, e o trancamento da acusação contra o
ministro do TCU Vital do Rêgo. É difícil saber até
onde vai o que alguns têm chamado de movimento revisionista da Lava Jato. Os
tribunais têm independência para decidirem como bem entenderem, e isso deve ser
respeitado, mas ao mesmo tempo é legítimo discutir o mérito de cada uma dessas
decisões que, com o devido respeito, considero equivocadas.
No STF, um dos protagonistas das
decisões recentes tem sido o ministro Gilmar Mendes, que há tempos critica a
operação e foi até condenado por uma ofensa ao sr. Com tamanha animosidade, ele
poderia julgar os casos relacionados à Lava Jato?
Dentre as situações de suspeição previstas na lei, estão aquelas em que o juiz
é inimigo das partes e quando uma parte for sua credora. Como ele proferiu
ofensas que geram responsabilidade civil, seria esperado que se declarasse
suspeito. Sua condição é muito parecida com a do devedor, embora a condenação
tenha sido da União Federal, porque as ações de ressarcimento por danos
causados por funcionário público no exercício de sua função devem ser dirigidas
contra a União, que pode depois acionar o funcionário. Além disso, diversas de
suas manifestações públicas podem ser lidas como violações da Lei da
Magistratura e sinais de inimizade, a qual também é causa de suspeição. Apesar
disso, ele tem julgado não só casos da Lava Jato, mas também casos pessoais
meus. Ele foi, por exemplo, voto de desempate para ratificar minha punição pelo
Conselho do Ministério Público em razão de manifestações que fiz, no meu
entender e dos ministros (Edson) Fachin e Cármen Lúcia, no pleno exercício de
minha liberdade de expressão e crítica.
O ex-presidente Lula tem dito que a
'inocência' dele foi reconhecida e petistas têm reforçado o coro de que a Lava
Jato foi uma farsa. Como o sr. recebe essas declarações?
Esse tipo de narrativa é muito comum nos casos de corrupção política no mundo
todo. Alegar perseguição está na página um do manual do político que é
investigado por corrupção. A anulação dos casos não apaga a história, os fatos
e as provas, embora impeça que eles tenham consequências jurídicas como a
punição. Não apaga, por exemplo, o fato histórico de que quase duas dezenas de
procuradores independentes, dois juízes, quatro desembargadores e quatro
ministros reconheceram a responsabilidade do ex-presidente por crimes graves de
corrupção e lavagem de dinheiro. Ninguém discordou e a teoria da perseguição
fica ainda mais difícil quando se nota que havia ali ministros que foram
indicados pelo próprio ex-presidente e sua sucessora. Quanto ao estado de
inocência, ele é presumido para todo cidadão que não sofreu condenação
transitada em julgado.
O sr. se arrepende de algo que tenha
feito na condução da Lava Jato, expondo as investigações ao risco de nulidade?
As regras do sistema são tão frágeis que tudo pode ser discutido e anular os casos,
quer você adote um caminho ou outro. O caso do ex-presidente Lula é um bom
exemplo. O STF anulou porque no seu entender deveria ter tramitado em Brasília
e não em Curitiba. Contudo, se a investigação tivesse corrido em Brasília, o
STJ a teria anulado porque no seu entender a competência era de Curitiba. Não
daria nem para recorrer ao STF porque não cabe recurso contra concessão de
habeas corpus. É um jogo de perde-perde para a sociedade. É uma sensação de 'se
correr o bicho pega, se ficar o bicho come'. Esse é o tipo de anulação em que a
Suprema Corte deveria colocar um ponto final, por conta do decurso do tempo e
porque a justiça do julgamento depende de seu embasamento nos fatos, nas provas
e na lei, e não do lugar em que o processo corre.
O presidente do STJ, Humberto Martins,
abriu um inquérito contra procuradores da Lava Jato e chegou a abastecê-lo com
as mensagens roubadas pelos hackers. Acredita que há mais investidas por vir?
Há um ambiente de franca reação à Lava Jato. A maior parte dos políticos
envolvidos nos escândalos não foi afastada ou punida e reocupou suas posições
de poder. Eles influenciam as indicações do procurador-geral da República, de
integrantes das cortes de Justiça, do Tribunal de Contas e do Conselho Nacional
do Ministério Público. Todas essas instituições que mencionei desempenham
relevantes papéis, são essenciais para a democracia e merecem todo respeito,
mas a escolha política dos seus integrantes na atual conjuntura, de ampla
reação do sistema político, cria evidentemente um risco para a independência do
trabalho dos procuradores contra a corrupção.
Acredita que há relação entre a
iniciativa do ministro Martins e o fato de ele ter um filho na mira da Lava
Jato?
Embora a questão levante questionamentos legítimos sobre a imparcialidade do
ministro para conduzir a investigação, não me cabe fazer essa avaliação. Sobre
esse inquérito, que foi suspenso por decisão monocrática da ministra Rosa
Weber, do STF, posso afirmar que ele foi instaurado para apurar um
comportamento que, absolutamente, não ocorreu. Partiu-se de suposições baseadas
em mensagens fora de contexto, que são provas ilícitas e manipuláveis
(refere-se às mensagens roubadas do seuTelegram), para concluir algo
completamente contrário à realidade. Sempre que nos deparamos com supostos
ilícitos praticados por pessoa com foro, e foram várias, e aí se incluem também
deputados, senadores, prefeitos, reunimos as provas que estavam em nosso poder
e as encaminhamos para a autoridade competente para investigá-los. Não houve exceção
a esse comportamento. Bastaria questionar a Receita Federal para verificar que
não procede a suspeita de que houve investigação fiscal dos ministros. Contudo,
ainda que se supusesse que os procuradores tivessem realizado uma investigação
criminal indevida de pessoas com foro privilegiado, é interessante observar que
ela nem sequer seria crime pela nossa lei. De fato, seria no máximo falta
funcional, não sendo possível instaurar inquérito para isso. Além disso tudo, a
lei determina que só o procurador-geral poderia conduzir essa investigação e
que ela deveria tramitar no tribunal de Porto Alegre (o Tribunal Regional
Federal da 4ª Região), não no STJ. Ao mesmo tempo que respeito o STJ, que tem
um papel central na proteção dos direitos em nosso sistema, vejo muitas
irregularidades nesse inquérito.
A CCJ da Câmara aprovou nesta semana um
projeto que altera a composição do Conselho Nacional do Ministério Público.
Qual é a sua opinião sobre essa iniciativa?
Essa proposta aumenta a ingerência dos políticos na escolha dos integrantes do
CNMP, que pode punir justamente os promotores e procuradores que investigam a
corrupção política. O corregedor, responsável pelas apurações disciplinares,
poderá ser, por exemplo, alguém escolhido pela Câmara ou pelo Senado por ter
uma visão alinhada com a punição de membros do Ministério Público que
trabalharam em certos processos. Além disso, essa iniciativa foi proposta por
um campeão de representações no conselho contra membros da Lava Jato (o
deputado petista Paulo Teixeira), tramitou em tempo relâmpago e se insere num
contexto maior de pressão política para que o conselho puna os procuradores que
trabalharam na operação. O Senado, por exemplo, deixou de renovar o mandato de
dois conselheiros que tinham votado favoravelmente a integrantes da Lava Jato e
há mais de ano mantém três cadeiras do conselho vazias, as quais seriam
ocupadas por dois membros oriundos do Ministério Público e por um juiz que
atuou em casos da operação. Por tudo isso, a proposta tem sido chamada pela sociedade
civil de 'PEC da Vingança'. Agora, para além da vingança, a PEC pode inibir o
trabalho de outros procuradores contra a grande corrupção política em um futuro
próximo. Ela não vai afetar catorze procuradores, mas o trabalho de 13 mil
membros do Ministério Público.
O projeto é de um deputado do PT, mas
quem deu andamento a ele foi a bolsonarista Bia Kicis. O que explica o fato de
o petismo e o bolsonarismo estarem hoje unidos contra as investigações?
O governo construiu alianças políticas, inclusive com o Centrão, que tem vários
investigados da operação, com a justificativa de que são necessárias para
garantir a governabilidade, ou seja, o apoio do Congresso para avançar seu
projeto de país. Não vou avaliar aqui outros aspectos desse projeto, da atuação
do governo ou dessa aliança, mas esta não deveria impactar a centralidade que o
discurso anticorrupção teve na candidatura de Bolsonaro. Como sabemos, ele e
alguns outros candidatos encamparam a bandeira da luta contra a corrupção no
discurso político eleitoral. Assim, ainda que agora ele faça alianças, seria
contraditório que essas alianças dessem munição para a vingança política contra
a Lava Jato ou minassem os esforços futuros contra a corrupção. Isso está
acontecendo no caso desse projeto e em outras situações. O fato de Moro ter
saído do governo não é desculpa para afastar o compromisso com as promessas
eleitorais relativas a uma causa muito maior. Aquilo que o governo prometeu,
com palavras, deve cumprir por meio de suas ações.
O presidente Jair Bolsonaro tem repetido
que não é necessária uma Lava Jato porque no seu governo não existe corrupção.
O que o sr. diz sobre isso?
A corrupção é um problema histórico e sistêmico, isto é, vem de longa data e
impregna diversas instituições da sociedade. É um problema que abrange, mas
ultrapassa muito, os indícios de corrupção em casos específicos como o esquema
das rachadinhas, que devem ser investigados. Não é à toa que esquemas de
compras de leis, licenças e apoio parlamentar foram identificados em diversos
governos nas áreas federal, estadual e municipal. Você não muda tudo isso com
um presidente e um governo, mas com uma agenda de reformas que incluam a
criminal e a política. Enquanto essas reformas não acontecerem, a corrupção
continuará a se renovar no Brasil, como a grama que você corta e cresce de
novo, independentemente de quem senta na cadeira de presidente. A ideia de que
um presidente pode acabar com a corrupção sem mudar as regras já foi usada na
história como uma jogada de propaganda populista que, no caso de Fernando
Collor, acabou muito mal, com o surgimento de sinais de que ele mesmo praticou
corrupção, primeiro no caso PC Farias e, depois, na Lava Jato. Ou seja, não
basta falar. É preciso fazer, lutar por mudanças mais amplas, por reformas contra
a corrupção como, por exemplo, a redução dos custos de campanhas, o fim do foro
privilegiado e a prisão em segunda instância.
As instituições estão em risco hoje no
Brasil, depois de mostrarem tanta independência ao longo da Lava Jato?
Para combater a corrupção, é preciso termos instituições fortes com
instrumentos adequados. Não adiantam instituições fortes sem instrumentos, nem
instrumentos nas mãos de instituições de joelhos. Têm havido retrocessos nesses
dois aspectos. Instrumentos como conduções coercitivas, colaborações premiadas
e o trabalho por meio de forças-tarefas foram minados. Além disso, chefes das
instituições de repressão criminal têm sido escolhidos por critérios de
afinidade pessoal e política, o que aumenta as chances de interferência. Foi
aprovada, ainda, a lei de abuso de autoridade e agora se pretende aumentar a
ingerência política no CNMP, responsável pelo controle de procuradores e
promotores. Tudo isso mina a independência do trabalho das instituições e sua
capacidade de enfrentar a corrupção política. Logo será escolhido o novo
procurador-geral da República. Seria importantíssimo o respeito à lista
tríplice.
Como a ofensiva à Lava Jato tem
impactado sua vida, pessoalmente? O que mudou do auge da operação para cá?
Ao longo dos últimos sete anos, trabalhei inúmeras vezes até as madrugadas,
abri mão em muitos momentos do lazer e de tempo com a família e os amigos, fui
alvo de diversas notícias falsas e ofensas, vivi debaixo de riscos de segurança
pessoal e familiar, fui condenado pelo CNMP por críticas que fiz ao Supremo
Tribunal Federal e a Renan Calheiros e respondo a ações de indenização por ter
feito o meu trabalho com coragem contra pessoas poderosas. Até hoje, mesmo
depois de sair da Lava Jato há oito meses, passo grande parte do meu tempo
respondendo a reclamações disciplinares, como aconteceu com Di Pietro na Itália
(refere-se a Antonio Di Pietro, um dos principais procuradores da Mãos Limpas).
O coordenador da Mãos Limpas costumava dizer que foram necessários dois anos
para fazer a operação, mas quatro para se defender depois. Muitas vezes bate um
desânimo, mas ele é superado pelo forte senso de serviço e de propósito no
trabalho, de melhorar a vida das pessoas. O que chamamos de luta contra a
corrupção é um grande esforço movido por amor às pessoas, em busca da redução
do sofrimento humano que ela causa. É uma luta por mais saúde, educação,
segurança e um país melhor. É uma luta por justiça, integridade, estado de
direito, democracia e redução da desigualdade. Muitos policiais, procuradores e
juízes fizeram sacrifícios pessoais movidos por esses ideais.
Acredita que é possível reverter este
movimento destinado a esvaziar e comprometer as investigações?
Sim. Hoje, há um grande alinhamento de forças políticas contra a Lava Jato e o
que ela representa. É fato que muita gente quer anular condenações e impedir
que novas operações como essa aconteçam no futuro. Contudo, à medida que
alcance sucesso, esse movimento se torna um escândalo em si. Ao mesmo tempo, há
uma grande demanda reprimida por integridade e um número crescente de políticos
defende essa causa. As pesquisas mostram que a maioria da sociedade continua a
apoiar a operação. Ou seja, apesar dos sucessivos ataques, a população está
entendendo o que está acontecendo. A imprensa e as mídias sociais podem ser
meios relevantes para informar a sociedade e debater avanços e retrocessos.
Acredito no fortalecimento da cidadania e que ela pode fazer toda a diferença.
O sr. tem participado de lives e dado
declarações públicas sobre política. Pensa em ser candidato a algum cargo nas
eleições de 2022 ou mais adiante?
Não tenho hoje planos concretos de candidatura e nunca conversei sobre isso com
políticos ou partidos. Ao mesmo tempo, reconheço que a única solução para o
problema da corrupção que impregna a nossa política é por meio da democracia e
da intensificação da participação da sociedade na vida pública. Essa
participação pode ser apartidária, a título de cidadania, como quando falo nas
redes sociais sobre o combate à corrupção, assunto diretamente relacionado ao
meu trabalho. Precisamos fortalecer a cidadania. Se queremos menos corrupção,
precisamos plantar boas leis. Se queremos boas leis, precisamos plantar bons
políticos. Se queremos bons políticos, precisamos plantar bons cidadãos,
informados e participativos.
Por Luiz Vassallo, na
Crusoé Online
- - - -
No mecanismo de busca do site amazon.com.br, digite "Coleção As mais belas lendas dos índios da Amazônia” e acesse os 24 livros da coleção. Ou clique aqui.
O autor:
No mecanismo de busca do site amazon.com.br, digite "Antônio Carlos dos Santos" e acesse dezenas de obras do autor. Ou clique aqui.
-----------
|
Clique aqui para saber mais. |
|
Click here to learn more. |
|
Para saber mais, clique aqui. |