No iate e na mansão
Em meados do ano
passado, a Lava-Jato já havia deflagrado três dezenas de operações. As empresas
do grupo J&F, dos irmãos Joesley e Wesley Batista, ainda não haviam caído
na teia, mas já eram alvo de investigações que apuravam suspeitas de pagamento
de propina para obter financiamentos no BNDES e na Caixa Econômica Federal. Na
época, longe de Brasília, no píer de uma mansão em Mangaratiba, no Rio de
Janeiro, uma pequena lancha aportou para apanhar um grupo que havia chegado
para um fim de semana de lazer. Todos a bordo, a embarcação rumou mar adentro,
até encontrar o iate Why Not. Para os ministros Vital do Rêgo e Bruno Dantas,
ambos do Tribunal de Contas da União (TCU), era o começo de um animado dia de
mordomias, com boa comida, champanhe e vinho da melhor qualidade, tudo diante
de uma paisagem deslumbrante.
Joesley Batista já
confessou ter habilidades especiais para corromper. Quando não pagava propina
para atingir seus objetivos, usava outras artimanhas para capturar a simpatia
de figuras importantes do poder. Não foi por outra razão que o empresário
convidou os ministros para o passeio no sábado 11 de junho de 2016, quando o
TCU já analisava os empréstimos suspeitos dos Batista. Combinar o encontro com
Bruno Dantas e Vital do Rêgo foi relativamente fácil. O empresário ficara
sabendo que os dois estavam no Rio, onde haviam participado, na véspera, de um
seminário. O convite foi feito — e aceito.
No iate de 10
milhões de dólares, o grupo foi recebido pelo próprio Joesley. Antes de eles se
reunirem em torno de uma mesa de queijos, o dono da JBS, hoje preso, apresentou
a embarcação, de 30 metros de comprimento, três andares, quatro quartos
(incluindo uma suíte de 20 metros quadrados), cozinha, sala de estar e um amplo
deque com jacuzzi. Em pouco mais de uma hora, o Why Not chegou à casa de
Joesley em Angra dos Reis, um château al mare construído em uma ilha, que o empresário
comprara do apresentador Luciano Huck. A festa prosseguiu até o fim da noite.
Só acabou depois de um jantar com camarões, lagostas e, claro, carnes
especiais.
Só por
financiamentos e aportes suspeitos do BNDES que somam mais de 10 bilhões de reais,
a J&F e sócios são alvo de quatro processos no TCU. As ações apuram o
tamanho do prejuízo, o nome dos responsáveis e, demonstradas as
irregularidades, tentarão recuperar o dinheiro. Em apenas uma das transações, o
TCU já identificou um prejuízo de mais de 300 milhões de reais aos cofres
públicos.
Procurado por VEJA,
Dantas — cujo nome já havia aparecido nos documentos da delação da JBS por ter
voado em um jatinho da companhia entre o Recife e Brasília — negou que o
encontro tenha servido para tentar cooptá-lo. Ele ressalta que, ainda no ano
passado, chegou a votar a favor do prosseguimento de uma investigação sobre a
companhia.
O ministro Vital do
Rêgo — citado na delação por ter recebido 8 milhões de reais das empresas de
Joesley Batista durante sua campanha ao governo da Paraíba, em 2014 — não quis
falar com VEJA. Na quarta-feira 18, ele participou, no plenário do tribunal, de
uma sessão que aprovou a abertura de mais uma investigação sobre os empréstimos
concedidos pelo BNDES às empresas dos Batista. Sentado ao lado do relator,
acompanhou com atenção a leitura dos detalhes do caso, mas não se pronunciou.
Dantas, seu colega, não estava presente — ficará afastado do tribunal até o fim
do ano, para participar de um curso no grãoducado de Luxemburgo.
Em tempo, aquele
seminário no Rio que antecedeu o passeio em Angra foi promovido pelo IDP,
instituto do ministro Gilmar Mendes, do STF. O tema do seminário era o
seguinte: mecanismos de defesa do interesse público.
Por Rodrigo Rangel, na Veja Online
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