Chico Remeiro, fotografia de 2015 de Marcela Bonfim, que faz parte da exposição da Caixa CulturalMarcela Bonfim/Divulgação/Direitos Reservados |
As comunidades negras da Amazônia são
o foco do trabalho da fotógrafa Marcela Bonfim que estará exposto a partir de
hoje (7) na Caixa Cultural, na Praça da Sé, centro da capital paulista. As 55
imagens vêm de um trabalho de quatro anos na região da floresta em uma
investigação que faz parte da própria trajetória de vida da artista.
“É
uma pesquisa de vida mesmo. Ela vem da observação, da sensação, do sentimento,
do estranhamento, da crise. É um projeto em que trabalho com o existencial. Ele
não tem um compromisso com a academia”, conta Marcela.
A
fotógrafa foi viver em Rondônia e começou a produzir imagens por circunstâncias
da vida. Quando tinha pouco tempo de formada em economia pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo, Marcela teve dificuldades para encontrar
emprego na área, então aceitou uma proposta de trabalho no Norte.
Histórias desconhecidas
A
partir da convivência na região, começou a descobrir histórias que não
conhecia. “Comecei a me interessar, a perguntar e a buscar. Aí eu descobri o
fluxo da borracha, do ouro, que [os imigrantes] vieram majoritariamente do
Maranhão, do Pará e do Nordeste”, contou, sobre alguns dos processos de
formação de comunidades negras dentro da selva.
A
fotografia também foi algo que surgiu de forma quase acidental. Marcela diz que
comprou uma câmera “simples” e começou a fazer as imagens sem uma proposta
definida, mas por uma afinidade intuitiva com o tema. Aos poucos, foi mostrando
os resultados para amigos e fotógrafos profissionais. “Os olhares foram
temperando mais o processo”, ressalta. Com o retorno dos conhecidos, foi
ganhando confiança e fazendo diversas viagens pela região, aproveitando férias
e feriados para conhecer novos lugares.
Teve
contato ainda com os chamados barbadianos, descendentes dos trabalhadores que
vieram do Caribe entre 1873 e 1912 para construir a Estrada de Ferro
Madeira-Mamoré. “A colonização deles foi completamente diferente do negro que
saiu da Bahia, do Maranhão”, compara. Passou por concentrações de imigrantes
haitianos e conheceu a Festa do Divino Pimenteiras, uma celebração de 123 anos
que acontece em povoados entre o Brasil e a Bolívia.
Autorreflexão
Ao
mesmo tempo, passou a refletir sobre própria negritude. “É um absurdo pensar
nisso. A gente tem que se colocar como ser humano. A minha vida inteira foi
assim. Até o meu processo aqui em São Paulo foi ressignificado com essas
imagens. Foi dali daquele processo que eu descobri que poxa, por que eu não fui
contratada? Uma economista formada pela PUC de São Paulo, tinha tudo para ser e
não foi”, relata a fotógrafa, que passou a entender a própria trajetória com
marcas do racismo.
A
partir do trabalho, ela passou a repensar a sua identidade e as relações
familiares. “Tem umas imagens que eu acho que são a minha cara, a cara da minha
mãe, do meu pai. Então, tem todo esse processo correndo ao redor dessa
exposição”, conta, acrescentando que as identificações a levaram a refletir
politicamente sobre as questões raciais. “Eu era uma negra muito embranquecida,
me baseava na meritocracia”, completa.
Da Agência Brasil
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