A Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) publicou decisão em
que considera o Estado Brasileiro responsável pelo desrespeito a diversos
direitos do povo Xukuru, como a não demarcação de suas terras tradicionais, a
ausência de proteção legal e a falta de garantia de um processo judicial em
prazos razoáveis.
A CIDH avaliou que o processo de demarcação dos territórios tradicionais
na cidade de Pesqueira (PE) está demorando excessivamente e determinou que o
governo federal garanta o direito à propriedade dos Xukuru, realizando
procedimentos para encerrar o processo, como o pagamento das indenizações e a
retirada de fazendeiros e posseiros da área. Outra decisão foi o encerramento
dos processos judiciais ajuizados por fazendeiros envolvendo a área.
A corte deu prazo máximo de 18 meses para que as determinações sejam
cumpridas. Em um ano o governo federal deverá apresentar um relatório
detalhando o andamento das ações adotadas. Além disso, sentenciou o governo a
pagar indenização aos Xukuru por dano imaterial no valor de R$ 3,3 milhões.
O povo Xukuru é formado por cerca de 2.200 pessoas em 24 comunidades em
seu território no estado de Pernambuco, além de outras 4.000 no município de
Pesqueira, onde estão as terras cuja demarcação é pleiteada pelos indígenas.
Decisão inédita
“No tempo em que o Estado brasileiro demorou para demarcar a terra
indígena, na Serra do Ororubá, o povo Xukuru conviveu com assassinatos, ameaças
e criminalizações. Nosso direito à terra foi negado pelo Estado. As perdas são
irreparáveis, mas sentimos que alguma justiça foi feita”, comemorou o cacique
Marcos Xukuru.
Na avaliação do advogado do Conselho Indigenista Missionário (Cimi)
Adelar Cupsinski, que acompanhou o caso, a decisão foi histórica por ter sido a
primeira condenação do Estado Brasileiro em matéria de direitos indígenas.
“Isso vai refletir dentro dos órgãos públicos brasileiros para que
cumpram as determinações e acredito que vai impactar positivamente também
dentro dos tribunais brasileiros para que comecem a acolher as posições da
CIDH”, afirmou.
Histórico
O processo de demarcação teve início em 1989. Argumentando lentidão no
andamento, os indígenas começaram ações de retomada em 1990. Em 1992 um
indígena foi assassinado. Em 1995, um advogado da Funai que auxiliava os Xukuru
também foi morto. Em 1998, foi a vez do cacique Chicão e, em 2001, do cacique
Chico Quelé.
Em 2003, o filho do cacique Chicão, Marcos Xukuru, sofreu emboscada na
qual dois indígenas foram assassinados. Segundo o Cimi, a investigação do
assassinato do cacique Chicão teve cinco delegados da Polícia Federal e, no
fim, não chegou a conclusões. Em decorrência do povo e do Ministério Público
Federal, novo delegado foi nomeado e descobriu que o homicídio foi obra de um
fazendeiro.
Em 2002, o Cimi e o Gabinete de Assessoria Jurídica de Organizações
Populares (Gajop) ingressaram com ação na Comissão Interamericana de Direitos
Humanos, que foi aceita. Em 2015, a Comissão concluiu que o Estado Brasileiro
estava demorando excessivamente no processo de demarcação e enviou pra Corte
Interamericana de Direitos Humanos o processo, que promoveu audiência pública
em 2017 e proferiu sua decisão nesta semana.
EBC