Nas listas de favoritos para o pódio do futebol feminino nos Jogos
Olímpicos de Tóquio, o Canadá quase não aparecia.
Um trabalho muito recente e a forte dependência do
time de sua principal estrela, Christine Sinclair, colocou baixas expectativas
sobre a campanha da seleção que já conquistou dois bronzes olímpicos
consecutivos. Mas na última sexta-feira, a jovem técnica Beverly Priestman
provou que as previsões estavam erradas, e cumpriu seu ousado objetivo de mudar
a cor da medalha do Canadá.
Com apenas 35 anos, Priestman é a treinadora mais jovem
do torneio e, após a vitória nos pênaltis sobre o forte time da Suécia, colocou
no seu currículo algo que muitos dos técnicos experientes e com o dobro da sua
idade ainda não têm: um ouro olímpico. Ela assumiu a seleção do Canadá em
outubro do ano passado, no que se tornou seu primeiro trabalho como técnica de
uma equipe principal.
Dez meses depois, ela fez sumir as dúvidas em volta de
sua nomeação, e de quebra ajudou a manter a tradição de treinadoras campeãs no
futebol feminino. Nas últimas cinco edições dos Jogos Olímpicos, todas as
equipes que levaram o ouro eram comandadas por mulheres.
A vitória na tensa disputa de pênaltis no estádio
Yokohama coroou o desempenho de ouro do Canadá, que passou por todas as fases
do mata-mata como o azarão. Desde as quartas de final, contra o Brasil, a
equipe era vista como o adversário "mais fácil" entre as
possibilidades do chaveamento. A equipe se impôs defensivamente e conseguiu
resolver a partida também nas penalidades.
Nas semi, o Canadá quebrou um jejum de 20 anos ao
vencer as favoritas dos Estados Unidos, atuais bicampeãs mundiais. Na decisão,
novamente tinha um grande desafio contra uma Suécia que fez campanha invejável.
Em nenhum desses momentos, Priestaman via seu time
como inferior, e fez o necessário para motivá-las a acreditar no mesmo.
— Quando você trabalha com jogadores que já
participaram de torneios consecutivos [como Christine Sinclair], como você
continua incentivando-as a serem melhores do que eram antes? Para mim, senti
que o grupo precisava de outro empurrão para mudar a cor da medalha. Você tem
que fazer e pedir mais coisas às pessoas que não foram feitas antes — disse a
técnica do Canadá.
Com um time que vive dificuldades na renovação, ela
soube aproveitar as principais armas para montar um sólido sistema defensivo e
de marcação. Apostando no futebol retrancado, Priestman conseguiu surpreender
as seleções favoritas jogando com os pés no chão, e sem sobrecarregar a estrela
do time, que aos 35 anos, se despede das Olimpíadas subindo no lugar mais alto
do pódio.
— Quero que meu time domine, com e sem bola — deixou
claro a técnica, em entrevista ao Guardian antes do início da Olimpíada. — Vou
pedir às jogadoras que sejam corajosas.
Trajetória longa no
futebol
Priestman se tornou ainda a primeira treinadora
inglesa em uma final olímpica de futebol em 73 anos. Aos 20 e poucos, ela
abandonou os planos para uma carreira de professora em escola e trocou a
pequena cidade de Consett por uma nova vida na Nova Zelândia e a aposta de
ganhar a vida como treinadora.
Ela começou jogando futebol nas ruas com os meninos da
vizinhança desde que ela tinha idade suficiente para chutar uma bola. Embora
Priestman tenha orgulho de suas raízes na cidade operária de Consett, ela
também reconhece que teve que deixar o lugar para conseguir realizar seus
grandes sonhos.
Depois de se formar em ciências e futebol pela
Universidade John Moores, em Liverpool, ela obteve uma licença "A" da
UEFA como treinadora e atuou como diretora de desenvolvimento do futebol
neozelandês. Ela também atuou como assistente técnica das seleções principais
do Canadá e Inglaterra (ao lado de Phill Neville), e depois se tornou
treinadora das seleções de base canadenses. Até que, no ano passado, foi
contratada para substituir Kenneth Heiner-Møller na equipe principal.
— Não me considero jovem no sentido de que estou
envolvida em tempo integral no futebol há 20 anos como profissional. Passei por
experiências muito variadas na Inglaterra, Nova Zelândia e agora no Canadá. Por
isso, embora seja jovem, trabalhei muito e fiz muitos sacrifícios — afirma ela.
Giulia Costa, em O Globo
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