Discorrer sobre Portugal em poucas palavras é tentar em
vão erigir a síntese do épico, do lírico e do místico. Vale dizer: é pretender
êxito numa missão impossível.
De fato, muito há que explanar sobre esse país a nós, brasileiros, tão
caro, tão afeiçoado: é tema inesgotável e desafio que esta coluna ora nos
apresenta para gáudio nosso.
São múltiplas as facetas que Portugal enseja, a partir do seu próprio povo
catalisador de simpatias e profunda empatia. Basta alinhar alguns de seus
aspectos peculiares para se ter ideia da dificuldade de se descrever a riqueza
da temática lusitana: sua harmoniosa natureza nos encanta, justificando ser
reconhecido o país como o 'jardim da Europa'. E quê falar de sua arte tão
expressiva? E da ciência cultivada com esmero abrangendo diversos ângulos do
conhecimento humano? Como não nos curvarmos diante de sua literatura e seus
admiráveis cultores? Como não nos quedarmos em admiração, respeito e
reconhecimento por sua contribuição luminosa e influente nos campos férteis de
sua própria Nacionalidade, que tanto distingue seu povo, bem assim o conjunto
de benesses que advêm do Direito e da Fé cristã, ali cultivada com benéficos
reflexos no mundo inteiro?
Consciente disso optamos por deter-nos na contemplação ainda que abreviada de
três pilares da ama lusitana, a saber: o Direito, a Nacionalidade e a
Religiosidade da Nação-irmã.
Entre tantos detalhes qualitativos que entrelaçam os nossos dois países cobra
relevo a tradição do cultivo do Direito, pois é inegável a poderosa
contribuição e tão propícia atuação do Direito português ao longo da História
do Brasil. Bastaria evocar as Ordenações Afonsinas, Manuelinas e mais
especificamente as Filipinas, que dominam como fontes primaciais, ao lado do
Direito Romano, do nosso próprio ordenamento jurídico.
Fácil é verificar que persiste inequívoca influência de Portugal sobre a
formação do Estado Brasileiro, sendo despiciendo destacar-se o peso da
repercussão jusracionalista do Pombalismo, pemitindo admitir-se 'o relevante
papel que os egressos da Universidade de Coimbra desempenharam na criação de
uma nova forma mentis brasileira'[1].
E as Constituições brasileiras, desde a pioneira Carta Magna outorgada por Dom
Pedro I, em 25/3/1824, entusiasticamente saudada por Afonso Arinos de Mello
Franco como 'grande fator de consolidação da nossa Independência e da unidade
nacional', até à Lei das leis aqui vigente (1988), deixam registros das
benfazejas e 'íntimas relações entre o constitucionalismo português e o
brasileiro'. Disto está persuadido o constitucionalista português Jorge
Miranda, ao enfatizar que 'a Constituição portuguesa atual, tanto por razões de
ordem cultural quanto por razões de imediata ordem política, tenha sido uma das
fontes da nova Constituição do Brasil'.
A par dessa expressiva contribuição de Portugal para a estruturação da vida
civilizacional brasileira, vem juntar-se a relevante questão da
'nacionalidade', que diz com a população portuguesa, considerada como uma das
mais homogêneas e exemplares da Europa, pela harmonia que se observa na
convivência de diversas etnias.
Eis um povo dotado das qualidades de bravura, intrepidez, coragem, destemor,
perseverança e criatividade, cujas gerações mais recentes fazem honra à
tradição heroica dos indomáveis descobridores.
Portugal logra modernizar-se sem descurar os traços marcantes e atraentes das
eras passadas. Eis um povo audaz, de caráter forte, que, sendo de índole
pacífica, tem sabido ser resistente às investidas e agressões que a História
consigna de modo as seu favor: os Romanos que o digam!?
O terceiro pilar da alma lusitana pertine ao caráter religioso de seu povo.
Dentre outros legados preciosos que herdamos da gente portuguesa, dois se
alteiam por seu significado vital: a notável uniformidade, em todo o território
nacional, do idioma comum aos nossos dois povos, e a fidelidade religiosa à Fé
cristã.
Portugal é cristão desde a sua origem, tal como viria acontecer com o Brasil,
primeiramente considerado pelos descobridores como 'Ilha de Vera Cruz', para
depois ser batizado como 'Terra da Santa Cruz', - denominação esta assaz
coerente por ter sido o País descoberto e assinalado com uma Missa.
Um dos gênios do povo português, o insuperável orador Padre Antônio Vieira
(século XVII) nos suscita a reflexão, quando sentencia: 'O presente não é senão
o futuro do passado'[2]. Isto vale dizer que o passado, na História em comum
dos nossos dois países, está enraizado neste futuro que é o presente que
vivenciamos, a comprovar uma união que resiste à independência de uma e outra
Pátria.
Com inegável sagacidade observa o Cardeal-Patriarca de Lisboa, Dom Manuel
Clemente:
'Da Fundação ao Interregno, do Interregno à Restauração, da Restauração ao
Oitocentismo e, finalmente, em Fátima, a História portuguesa ganhou cor
religiosa, porque referida a Deus e particularmente à Santa Maria, sua Mãe,
como se os anos portugueses fossem contas de um prolongamento do Rosário. Como
se cada dezena desse Rosário - gozosa, luminosa, dolorosa ou gloriosa - se
tornasse numa época nacional.'[3]
Certo é que as 'alianças' de Portugal com Nossa Senhora se multiplicaram ao
longo da História até atingir o auge de tão esplêndidas manifestações marianas
com as 'Aparições ' de Fátima, culminando em consagração solene não só do
próprio país, mas de todo o mundo, tendo a Virgem Maria como 'presença
sacramental dos traços maternais de Deus'.
Intentamos sintetizar, a um tempo, o Portugal em si e alguns laços valiosos que
o unem ao nosso Brasil, salientando um aspecto transcendental do País-irmão,
que sabe preservar sua fidelidade histórica, honrando-nos com sua presença
amiga e tão favorável à nossa própria evolução civilizacional.
Em razão de todo o exposto, fácil é imaginar a satisfação do cidadão que tem a
felicidade de adquirir a dupla nacionalidade, tornando-se também cidadão
português, pois tem, deste modo, motivo bastante para redobrado orgulho de
partilhar os atributos que tanto engrandecem uma e outra nacionalidade.
Belo, bom e bendito é o Portugal que visitamos por reiteradas vezes,
tornando-nos, por isso mesmo, ainda mais cativos seus, pois também o são
quantos têm a ventura de conhecer-lhe a prendada tradição no âmbito do Direito,
além de sua significativa Nacionalidade, a par de uma louvável perseverança na Fé
cristã, que tanto o eleva no concerto das Nações.
[1] Rui de Figueiredo Marcos, Carlos Fernando Mathias e Ibsen Noronha:
História do Direito Brasileiro. 1 ed- Rio de Janeiro: Forense, 2014
[2] Padre Antônio Vieira. Obras completas - Sermões. Porto: Lello&Irmãos
Editores, 1959
[3] Dom Francisco José Senra Coelho . Alianças com Santa Marias: Nossa Senhora
e a História de Portugal. 3ed. Lisboa:Paulus Editores, 2018
Por Francisco de Salles Mourão Branco, em
O Estado de S. Paulo
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