Os relatos de alunos de escolas públicas paulistas sobre o bullying vivenciado
por eles nas redes sociais resultaram na publicação de uma revista em quadrinhos e na
criação dos 10 Mandamentos contra o Cyberbullying. A iniciativa,
que é do projeto Liga Acadêmica de Prevenção e Intervenção a Violência (Lapiv),
da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), foi lançada nesta semana.
O cyberbullying é a agressão por meios virtuais, como
redes sociais, muito comum na vida dos adolescentes. A revista em quadrinhos
“Segredos do Meta – a verdade por trás das redes”, traz à tona os perigos
decorrentes da prática a fim de conscientizá-los sobre os limites entre uma
brincadeira e o cyberbullying, além de alertá-los sobre segurança
na internet.
No projeto do Lapiv, estudantes de enfermagem e medicina, coordenados
por profissionais da universidade, realizaram atividades com alunos de escolas
públicas, a partir de 11 anos, sobre o problema. O projeto surgiu em 2013, por
iniciativa da médica psiquiatra da Unifesp Sara Bottino, quando teve
conhecimento do número de suicídios e tentativas de suicídio que estavam
associadas a fenômenos de agressão nas redes sociais. Entre as atividades do
projeto, há rodas de conversa sobre as vantagens e desvantagens do uso das
redes sociais e dicas de como os estudantes podem se proteger na rede.
“Percebemos que os adolescentes usam as redes sociais e eles não têm
nenhum mecanismo de controle sobre o que eles postam, sobre as pessoas com as
quais eles compartilham notícias pessoais e, às vezes, até informações sobre
endereço e sobre o que fazem. Então temos um roteiro de discussão que começa a
partir daí”, disse Sara.
Nas conversas, os estudantes também são levados a refletir sobre os
riscos de uma aparente brincadeira entre colegas virar um problema grave. “Às
vezes, eles começam com uma brincadeira na rede, que eles chamam de 'zoação', e
muitas vezes não sabem o impacto que isso tem para quem está sendo 'zoado'. O
limite entre o que é uma brincadeira e como esta pode ser vivenciada pela
vítima pode ser muito diferente”, explicou.
A estudante de enfermagem da Unifesp, Victoria Nery, que participa do
projeto, ressaltou que o objetivo das atividades é reduzir a violência nas
redes sociais dos adolescentes em geral, não apenas daqueles que frequentam as
escolas integrantes do projeto. Segundo ela, a publicação da revista em
quadrinhos é um meio para que essa conscientização continue para além dos muros
dessas escolas.
Uma atividade importante do projeto é o encontro em que os adolescentes
falam sobre seus gostos, rotinas e preferências em diversas áreas. “Mesmo sendo
diferentes, eles percebem que têm coisas em comum. Eles concluem 'por que vou
fazer bullying com essa pessoa, se tem um pouco de mim nela e
um pouco dela em mim?'”, disse Victoria.
Além disso, ela ressaltou que muitas pessoas não têm noção de que a rede
não é um ambiente totalmente seguro. “Eles ficam bem impressionados quando
falamos que já houve vários casos de suicídio, que as pessoas param de ir para
a aula, têm decréscimo em relação a notas, perdem amigos, então eles começam a
ver realmente o que isso causa”, disse.
Mandamentos
O grupo da Unifesp desenvolveu os “10 Mandamentos contra o
Cyberbullying”, presentes na revista em quadrinhos. Entre as recomendações
estão não responder quando estiver com raiva, guardar evidências de agressões,
evitar compartilhar informações pessoais com desconhecidos, pedir ajuda a
pessoas de confiança e bloquear o agressor, por exemplo. O último deles é “não
se torne um agressor”.
Segundo Sara, que coordena o grupo, o projeto tem dado ênfase à figura
do espectador. “Porque é ele quem vai dar visibilidade para a vítima e para o
agressor na forma de 'likes', na forma de 'curtir'. Então temos trabalhado
muito para que esse espectador, que não é vítima nem agressor, denuncie. Em vez
de curtir, que fale 'isso não tem nada a ver, isso não é legal'. Se eles [casos
de cyberbullying] têm um reforço negativo, certamente aquilo ali
para. Mas se tem várias curtidas, então fica muito difícil [combater a
situação]”, disse.
A coordenadora de uma das escolas em que o projeto foi implantado, Marli
de Almeida, confirmou que as situações de cyberbullying se
refletem dentro do ambiente escolar. Na Escola Municipal de Ensino Fundamental
Armando de Arruda Pereira, onde trabalha, muitas brigas já ocorreram devido a
agressões nas redes sociais, disseminação de notícias falsas e até a polícia
precisou ser chamada.
“O que eles [grupo da Unifesp] fazem é despertar a conscientização sobre
a responsabilidade que os alunos tem que ter quando escrevem qualquer coisa no
Facebook, por exemplo, e que tudo isso tem um retorno. É um processo muito
lento, mas acredito que a base eles estão tendo e, depois disso, tem que ser
desenvolvido aos poucos. Esperamos que a sementinha tenha sido plantada. Depois
os professores e as famílias têm que fazer com que essa sementinha floresça e
que essa responsabilidade e essa conscientização comece a aparecer no futuro”,
disse a coordenadora.
Agência Brasil
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