A organização não-governamental (ONG) Ação da Cidadania exibiu no dia 9,
pela primeira vez o documentário Histórias da Fome no Brasil,
dirigido por Camilo Tavares. A pré-estreia do filme ocorreu no Cine Odeon, no
centro do Rio de Janeiro, em sessão com entrada franca mediante doação de
alimento não perecível.
"É um trabalho que mostra o que aconteceu neste país. Tem cenas que
são inacreditáveis. Das secas e das fomes do início do século passado. Eu
inclusive chamo de holocausto brasileiro porque foram centenas de milhares de
pessoas que morreram", disse Daniel de Souza, atual presidente da
organização e um dos produtores associados do filme. Em sua visão, o
documentário desmistifica a ideia de que a causa da fome é oculta, como se
fosse uma vontade divina ou de forças da natureza. "Na verdade a causa é
eminentemente do homem. É a sociedade que cria a fome. E o filme mostra
isso", acrescenta.
Daniel de Souza é filho do sociólogo e ativista dos direitos humanos
Herbert de Souza, popularmente conhecido como Betinho, fundador da Ação da
Cidadania. A organização foi criada em 1993 com o objetivo de formar uma rede
de mobilização nacional para ajudar 32 milhões de brasileiros que, segundo dados
do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), estavam abaixo da linha da
pobreza naquela época.
A ideia do documentário surgiu em 2014, quando a Organização das Nações
Unidas (ONU) anunciou que o Brasil havia deixado do Mapa da Fome, levantamento que
mostra onde vivem os milhões de pessoas que ainda passam fome no mundo.
"O filme mostra que quando você tem 12 ou 14 anos de vontade
política, e isso independente de partido ou de quem trabalha para isso, é
possível superar o problema. Quer dizer, uma situação de séculos se resolve em
pouco mais de uma década com um conjunto de políticas públicas adequadas. Agora
estamos em uma crise política e econômica que piora muita a situação
principalmente da camada mais pobre e é real a possibilidade de retornarmos
para o Mapa da Fome. Então no meio do processo de produção, o documentário foi
reeditado na sua parte final justamente para mostrar os riscos", explica
Daniel.
Segundo a produtora Luciana Boal Marinho, o filme trabalha com um vasto
material de arquivo, o que demandou muito trabalho de pesquisa e de obtenção
dos direitos de imagem. Ela conta que a versão exibida na pré-estreia tem 70
minutos, mas há também versões de 50 e de 20 minutos.
"Era um filme de comemoração que virou um filme de alerta. Essa
crise pega de cara as pessoas mais fragilizadas. E a ideia é usá-lo para
debater a fome e promover mobilização. Haverá agora diversas sessões
organizadas pelos comitês do Ação da Cidadania nos estados. E vamos levar
também para escolas, universidades e comunidades sem acesso ao cinema. Daí a
estratégia de termos versões com diferentes durações", explicou Luciana.
A preocupação com a segurança alimentar no Brasil levou a Ação da
Cidadania a relançar este ano a campanha Natal Sem Fome, que não era realizada desde
2007. Até o dia 16 de dezembro, a população poderá doar alimentos não
perecíveis por meio da página oficial da campanha ou em postos de arrecadação
distribuídos em 18 estados e no Distrito Federal.
De acordo com um balanço parcial, a meta de arrecadar 500 toneladas deve
ser alcançada. O objetivo da organização é contribuir para que o país não volte
a enfrentar os problemas do passado. Dados de um estudo divulgado em setembro
pela ONU mostraram que, depois de uma década de queda, a fome aumentou no mundo
de 2015 para 2016 e alcançou 815 milhões de pessoas, o que representa 11% da
população mundial.
EBC
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