Há 25 anos, último fugitivo era morto ao
tentar pular o Muro de Berlim
Do Deutsche Welle
Chris
Gueffroy tinha apenas 20 anos quando tentou escapar do regime comunista alemão
de uma maneira extremamente arriscada: atravessando a fronteira vigiada que
dividia Berlim. Nove meses depois, o Muro caía.
Os dois
têm a informação – que depois se verificou falsa – de que a ordem para matar
quem tentasse fugir pelo Muro teria sido revogada. Ela foi obtida junto a uma
fonte que consideram confiável: um guarda de fronteira que trabalha na
Turíngia.
Bravamente,
eles pulam a primeira barreira de mais de três metros – o chamado "muro
interior" – e tentam passar por uma cerca. Sem querer, um deles aciona o
alarme, e holofotes rapidamente se acendem, iluminando toda a área.
Correndo,
os dois chegam ao último obstáculo, uma cerca de quase três metros de altura.
Desesperados, eles tentam se ajudar mutuamente a vencer também aquela barreira.
Mas guardas de fronteira descobrem os dois fugitivos e abrem fogo. Chris
Gueffroy morre com um tiro no coração, e Christian Gaudian é gravemente ferido
e, depois, preso.
O barulho
de tiros chega a ser ouvido por Karin Gueffroy, mãe de Chris. Só dias depois,
ela soube que seu filho tinha morrido naquela noite. Ele foi a última vítima da
ordem de disparo obedecida pelos guardas de fronteira do antigo Muro de Berlim.
Cifras incertas
Chris Gueffroy é considerado o último morto a
tiros no Muro de Berlim
Não
existem cifras precisas sobre o número de mortos pela polícia de fronteira da
Alemanha Oriental. Além da área do Muro propriamente dito, os guardas vigiavam
também os 1.400 quilômetros que separavam as duas Alemanhas. Mas uma rede de
pesquisa ligada à Universidade Livre de Berlim quer, agora, detalhar os
números.
"Atualmente,
estamos analisando 1.036 casos de pessoas que são conhecidas nominalmente. Há
também 192 casos de pessoas desconhecidas", diz o pesquisador Jan Kostka.
O historiador
explica que as autoridades da Alemanha Oriental não costumavam listar as
pessoas mortas na fronteira. Pelo contrário, elas procuravam esconder essas
mortes. As famílias das vítimas eram forçadas ao silêncio pela Stasi, a polícia
secreta dos comunistas.
A própria
família de Chris Gueffroy recebeu uma informação vaga de que o rapaz havia
morrido quando, segundo a versão oficial, atacou uma zona militar interditada.
Mas a mãe levantou dúvidas, pois havia ouvido tiros naquela noite. Duas semanas
mais tarde, a família colocou um comunicado de morte no jornal Berliner
Zeitung, mencionando um "acidente", uma expressão então
indicada para tais casos.
Caso foi exceção
Guardas tinham ordens para atirar em quem
tentasse fugir do país
Vários
jornalistas ocidentais compareceram ao enterro. A Rias, antiga estação de rádio
de Berlim Ocidental, relatou: "A formulação vaga sobre a maneira trágica
que Chris fechou seus olhos para sempre foi repetida no discurso do orador
profissional do funeral.
Não foi
possível saber mais nada de oficial sobre a causa da morte. Um grande
contingente de forças da Stasi se espalhou desde cedo pelo cemitério."
A atenção
tornou o caso Gueffroy uma exceção. Na maioria das mortes, a intimidação das
famílias e a ocultação por meio da Stasi tinham sucesso pleno, com efeitos que
podem ser sentidos até hoje.
"Este
trabalho de pesquisa é muito detalhista e outras informações têm que ser sempre
acrescentadas ao processo", explica Kostka. "Avaliamos relatórios
mensais ou mesmo diários de instituições que foram envolvidas nos
acontecimentos na fronteira para saber se havia relatos de mortes."
Sistema desumano
Até agora foram contabilizadas 138 mortes no
Muro de Berlim. O número é baseado nas mais recentes descobertas da rede de
pesquisa da Universidade Livre de Berlim e complementa um projeto do Memorial
do Muro de Berlim e do Centro de Investigação Histórica de Potsdam.
Fronteira entre as Alemanhas, fora de Berlim,
tinha 1.400 quilômetros
As
pesquisas levaram em conta apenas as mortes em que houve uma conexão direta com
o regime da fronteira, incluindo pessoas baleadas que não tinham intenção de
atravessar a divisa ou de guardas que foram mortos ao tentar fugir da Alemanha
Oriental. No entanto, não estão incluídos aqueles se suicidaram por não
suportarem viver presos num país cercado por um muro.
A
vice-diretora do Memorial do Muro de Berlim, Maria Nooke, diz que as histórias
de vida dessas pessoas é mais importante que o número de mortos na fronteira:
"A questão decisiva é saber o que essas pessoas viveram, porque assumiram
tal risco e quais foram seus motivos."
Chris
Gueffroy tinha apenas 20 anos quando foi morto. Ele deveria se apresentar ao
serviço militar, mas preferia viver em liberdade e viajar o mundo a servir à
Alemanha Oriental. Nove meses depois de seu assassinato, em 9 de novembro de
1989, o Muro de Berlim caiu.