Cerca de um milhão de espécies de animais e plantas estão ameaçadas de extinção, segundo relatório das Nações Unidas |
Representantes de quase 200 países abrem discussão sobre plano de proteção ambiental para os próximos dez anos. Nenhuma meta do acordo anterior foi alcançada, o que gera preocupações na ONU e em ambientalistas.
Uma cúpula das Nações Unidas com a missão de proteger a biodiversidade, a
COP15, foi aberta nesta segunda-feira (11/10) na China e está sendo realizada
majoritariamente por meio de presença online.
A sessão na cidade chinesa de Kumming foi aberta pela chefe de
biodiversidade da ONU, Elizabeth Maruma Mrema. Segundo ela, o mundo não
alcançou os avanços necessários estabelecidos para o período de 2011 a 2020 e
ainda não foi capaz de proteger os ecossistemas essenciais para o bem-estar da
espécie humana. "Chegou a hora da verdade", ressaltou Mrema.
"Embora tenha havido algum sucesso e progresso, não houve avanços
necessários para deter a perda contínua de diversidade vegetal e animal na Terra",
advertiu Mrema. "Devemos tomar medidas nesta década para deter e reverter
a perda de biodiversidade e colocar a biodiversidade num caminho de recuperação
até 2030 o mais tardar."
A cúpula online reúne as partes da Convenção sobre Diversidade Biológica
(CBD, na sigla em inglês), que discutem novas metas para proteger os
ecossistemas até 2030. Cerca de 1 milhão de espécies de animais e plantas estão
ameaçadas de extinção devido à invasão humana de habitats naturais,
superexploração, poluição, disseminação de espécies invasoras e mudanças
climáticas.
A CBD foi ratificada por 195 países – os EUA não estão entre os
signatários – e pela União Europeia, e as partes se reúnem a cada dois anos. A
reunião da COP15 deste ano era para originalmente ter sido realizada em 2020,
mas foi adiada devido à pandemia de covid-19.
A COP15 tem duas partes, com a primeira começando nesta segunda-feira e
terminando nesta sexta-feira. A parte das decisões globais acontece entre 25 de
abril e 8 de maio de 2022, presencialmente, em Kunming.
As discussões sobre a biodiversidade na COP15 transcorrem separadamente da
cúpula do clima, a COP26, marcada para o próximo mês em Glasgow, na Escócia –
essa ocorre anualmente e é atendida por países signatários da Convenção da ONU
sobre a Mudança do Clima (CQNUMC), selada em 1994.
O que está
acontecendo na COP15?
As partes representantes da CBD estão se reunindo para a primeira rodada
de negociações para definir uma estrutura de proteção da biodiversidade
pós-2020. O debate tem como base as definições anteriores, estabelecidas pelo
Plano Estratégico para a Biodiversidade 2011-2020 da CBD.
Em 2010, em Aichi, no Japão, foram aprovados 20 objetivos para
salvaguardar a biodiversidade e reduzir as pressões humanas até 2020. Nenhum
foi cumprido.
A nova estrutura definirá metas para a proteção dos ecossistemas. Em
debate está o plano "30 aos 30", que visa dar a 30% das terras e
oceanos o status de proteção até o fim desta década – uma medida apoiada por
uma ampla coalizão de nações. A CBD visa também reduzir pela metade o uso de
produtos químicos na agricultura e interromper a criação de resíduos plásticos.
É esperado que o tratado seja finalizado durante a segunda rodada. Mas
divisões acentuadas permanecem quanto às metas de ação urgente para a próxima
década e lançam dúvidas sobre se o objetivo de "viver em harmonia com a
natureza" até 2050 pode ser alcançado.
Quando alguns cientistas pediram por uma proteção mais ambiciosa para 50%
da biodiversidade da Terra, houve oposição, especialmente de Brasil e África do
Sul. Outras fontes de tensão envolvem o financiamento: as nações em
desenvolvimento pedem aos países ricos que custeiem as transições ecológicas –
um tema que será abordado em negociações em Genebra em janeiro.
Os líderes globais até agora não conseguiram atingir uma única meta para
conter a destruição da vida selvagem e dos ecossistemas na última década, de
acordo com um relatório devastador da ONU divulgado na semana passada.
Perda de
biodiversidade
Outros estudos e relatórios também dão conta da perda mundial de
biodiversidade.
Em junho passado um estudo indicava que o Mediterrâneo sofreu em 30 anos
um "colapso" da sua biodiversidade, que está gravemente ameaçada. Em
maio outro estudo alertou que apenas 17% dos rios do mundo correm livres, o que
acarreta riscos para os ecossistemas.
Em abril, outro estudo denunciou que apenas 2% a 3% da superfície
terrestre permanece intacta do ponto de vista ambiental, 10 vezes menos do que
anteriormente estimado. Outros estudos também recentes têm denunciado índices
"sem precedentes" de extinção de espécies, e o declínio acelerado da
natureza.
E, há dois anos, um relatório da Plataforma Intergovernamental sobre
Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos concluiu que cerca de 1 milhão de
espécies animais e vegetais estão ameaçadas de extinção.
Ambientalistas
estão céticos
A diretora de política global do WWF, Lin Li, declarou à DW que o atual
esboço do acordo sobre biodiversidade é "baixo em ambição" e
"fraco em várias áreas-chave, incluindo em finanças e nas causas da perda
de biodiversidade".
Lin afirmou que a Declaração de Kumming, a ser adotada na reunião, é uma
"oportunidade crítica" para os líderes enviarem um sinal de que estão
comprometidos a "garantir um resultado transformador".
Ela disse que o esboço deveria "incluir uma meta global clara e
mensurável para a natureza". Embora o WWF apoie o plano de 30% de terras e
oceanos protegidos, Lin destacou que "a falta de um marco para reduzir
pela metade a pegada ecológica de produção e consumo até 2030 é muito
preocupante."
A diretora de Conservação e Políticas na Associação Natureza Portugal
(ANP/WWF), Catarina Grilo, disse à
agência Lusa que mantém um "otimismo cauteloso" quanto à cúpula. Já
Paulo Lucas, responsável na associação Zero pela área da biodiversidade, disse
que a COP15 não vai servir para nada. "Não temos nenhuma esperança, por
ínfima que seja."
A Convenção das Nações Unidas sobre a Biodiversidade foi lançada na Cúpula
do Rio de Janeiro, em 1992, quando foram também criadas a Convenção das Nações
Unidas para o Combate à Desertificação e a Convenção-Quadro das Nações Unidas
para Alterações Climáticas (UNFCCC).
É da cúpula do clima que mais se fala, com as alterações climáticas no
centro das atenções mundiais e os cientistas alertando para os perigos reais de
sobrevivência da espécie humana caso nada se faça para interromper o
aquecimento global.
Já em relação à destruição da biodiversidade "não há na opinião
pública uma noção de urgência. A biodiversidade não vende", disse Lucas.
Ele lembra que metas anteriormente definidas têm sido "sistematicamente
não cumpridas".
(AFP, Reuters, Lusa), Deutsche Welle
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