“(...)Sarah é o primeiro caso documentado da
personalização de uma técnica chamada estimulação cerebral profunda para tratar
com sucesso a depressão. (...)”
Há cinco anos, voltando para casa do trabalho, uma mulher jovem da
Califórnia, nos EUA, estava tão sobrecarregada pela depressão que tudo que
conseguia pensar era em acabar com sua vida.
— Não conseguia parar de chorar. O pensamento que me consumia durante todo
o caminho de casa era apenas dirigir meu carro para o pântano para me afogar —
relembra Sarah, agora com 38 anos.
Ela conseguiu chegar em casa, mas pouco depois foi morar com os pais
porque os médicos não consideraram seguro ela viver sozinha. Sem conseguir
trabalhar, Sarah se demitiu do emprego na área de tecnologia em saúde.
E tentou quase todos os tipos de tratamentos: cerca de 20 medicamentos
diferentes, meses em um programa diurno no hospital, terapia eletroconvulsiva,
estimulação magnética transcraniana... Mas, assim como em quase um terço de
mais de 250 milhões de pessoas com depressão no mundo, os sintomas persistiram.
Então, Sarah se tornou a primeira participante de um estudo para uma
terapia experimental. No momento, sua depressão está tão controlada que ela
cursa aulas de análise de dados, voltou a morar sozinha e ajuda a cuidar da
mãe, que sofreu uma queda.
— Em poucas semanas, os pensamentos suicidas simplesmente desapareceram.
Depois, foi apenas um processo gradual em que era como se as minhas lentes para
o mundo tivessem mudado — disse Sarah, que é identificada apenas pelo primeiro
nome para proteger sua privacidade.
Pesquisadores da Universidade da Califórnia, nos EUA, implantaram, no
cérebro de Sarah, de forma cirúrgica, um aparelho do tamanho de uma caixa de
fósforos e operado por bateria — um “marca-passo para o cérebro”, alguns chamam
—, calibrado para detectar a atividade neural que ocorre quando ela está
ficando deprimida. Então, ele emite pulsos de estimulação elétrica para evitar
os sintomas.
Doze dias depois que o aparelho de Sarah estava completamente operacional,
em agosto de 2020, seu nível em uma escala que mede o padrão da depressão caiu
de 33 para 14, e, alguns meses depois, foi para menos de 10, essencialmente
sinalizando uma remissão da doença, relataram os pesquisadores.
Sarah é o primeiro caso documentado da personalização de uma técnica
chamada estimulação cerebral profunda para tratar com sucesso a depressão.
Diversas pesquisas ainda são necessárias antes de ficar claro o quão efetiva
pode ser a abordagem e para quantos pacientes. Mas muitas equipes de cientistas
estão trabalhando agora em maneiras para combinar a estimulação elétrica ao que
acontece dentro do cérebro de cada paciente.
Alívio nos
sintomas para ter vida normal
Para identificar o padrão de atividade cerebral específico ligado à
depressão da Sarah, os pesquisadores fizeram uma exploração intensiva de dez
dias em seu cérebro, colocando vários eletrodos e perguntando sobre seus
sentimentos enquanto aplicavam estimulações em diferentes locais e em doses
variadas.
Sarah se lembra de quando ela se sentiu como o “Pillsbury Doughboy”
(mascote publicitário famoso nos EUA), emitindo uma “gargalhada gigante” que
ela disse ser a primeira vez que riu e sorriu espontaneamente em cinco anos.
Outra sensação a lembrou “estar em frente a uma lareira quente lendo um livro
reconfortante”, enquanto um sentimento negativo parecia o arranhar de “unhas no
quadro-negro”.
A fase exploratória guiou os pesquisadores a implantar o aparelho
estimulador no hemisfério direito do cérebro da Sarah e ligado a eletrodos em
duas regiões.
O objetivo, disse Dougherty, é que a estimulação interrompa ou mude a
atividade neural para produzir um padrão mais saudável que amenize os sintomas
da depressão.
Sarah continuou tomando seus medicamentos psiquiátricos, e a estimulação
não eliminou a atividade que causa a depressão em seu cérebro. Mas ela consegue
controlar sua doença de forma muito melhor, em vez de ficar incapaz de tomar
até mesmo decisões como o que comer.
Cerca de 30%
não respondem a tratamento padrão
Cerca de 30% das pessoas com depressão não respondem a tratamentos padrão
ou não conseguem tolerar os efeitos colaterais. A estimulação cerebral profunda
não seria apropriada para todos porque custa muito caro e a cirurgia para
implantar o aparelho oferece diversos riscos, como infecção. Mas, se funcionar,
pode ajudar muitas pessoas, garantem os especialistas.
— Nosso trabalho agora é de fato entender o que é que identifica quem
precisa desse tipo de intervenção — disse Helen Mayberg, diretora do Centro de
Terapêuticas de Circuitos Avançados da Escola de Medicina Icahn, em Nova York,
instituição pioneira na estimulação cerebral profunda para combater a
depressão, há quase 20 anos.
Mayberg utiliza um método diferente de individualização. Com o exame de
imagem, ela localiza onde quatro partes de substância branca se cruzam perto de
uma região chave relacionada à depressão no cérebro de cada pessoa. Depois de
implantar eletrodos e um aparelho para provocar os estímulos, “nós praticamente
o configuramos e o esquecemos”, fornecendo estimulação contínua, ao mesmo tempo
ajudando os pacientes com terapia convencional.
Os pesquisadores dizem que ainda levará anos para aprenderem se as
abordagens individualizadas são eficazes o suficiente. Métodos diferentes podem
funcionar para a depressão de pessoas diferentes, e a estimulação
individualizada pode eventualmente ajudar outros transtornos psiquiátricos,
concluem os cientista.
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