Para entender a delação premiada da JBS é necessário compreender o
que se passou ou ainda se passa entre a companhia e as autoridades dos Estados
Unidos.
Sendo a JBS um grupo global, com cerca de 56 empresas nos Estados
Unidos, dificilmente haveria delação premiada aqui sem prévio ou potencial
acordo lá, com as autoridades americanas.
O cenário maior a ser considerado é que a globalização econômica
tem sido acompanhada por uma globalização judicial. Ou seja, há expansão
unilateral das leis e da judicialização americana. Juízes e autoridades passam
a ser globais.
Quem confere a eles esse poder é a cooperação internacional entre
autoridades e a múltipla legislação: Anti-Corruption Act, Anti-Terrorism Act e
tantas outras (…).
Para que tal jurisdição ocorra, basta que se tenha conta bancária
nos Estados Unidos. A JBS tem. Basta que se tenha empresas nos Estados Unidos.
A JBS tem. Basta que se tenha estado presente no mercado de valores
mobiliários. A JBS tem estado. Ou apenas ter transacionado em dólar em qualquer
país no mundo. A JBS fez isso.
Não é por menos, inclusive, que os irmãos Batista, donos da JBS,
escolheram um escritório de advocacia, Baker e Mckenzie, de lá. E, de lá, gerem
a negociação aqui no Brasil (…).
O ponto crucial é o desejo, necessidade mesmo, de os irmãos
Batista pretenderem morar nos Estados Unidos, com visto permanente de
residentes. Logo depois da denúncia do procurador-geral da república, Rodrigo
Janot, a família embarcou para lá. Antes, familiares, irmãos e sobrinhos,
inclusive moradores de Goiânia, já tinham ido.
Deve ter havido, ou estar ainda em andamento, negociação com o
governo americano para concretizar essa pretensão. Provavelmente pelas pessoas
físicas, os sócios.
No sistema legal dos Estados Unidos, são múltiplas as maneiras de
conseguir vistos ou algum tipo de benefício em situações dessa natureza.
A delação premiada precisa ser reconhecida por um juiz, mas pode
se manter secreta se as partes concordarem.
Dificilmente saberemos. Informações estratégicas.
O DPA, que pode ser traduzido como a Suspensão Condicional do
Inquérito, permite multa, confissão, delação e provas contra terceiros. O
investigado não é fichado como criminoso e obriga-se a delações futuras e a não
reincidir no crime. Não há também publicidade.
Direta ou indiretamente, parece inevitável, o maior grupo
empresarial do mundo em proteína animal, através de seus controladores ou de
suas empresas, deve estar agora sob controle da expansionista jurisdição
americana.
Seria esse o destino dos campeões nacionais? Ao se tornarem
campeões globais, transmudam-se em campeões americanos?
Há muito ainda o que revelar. Aqui e lá.
Por Joaquim Falcão, na Folha de S. Paulo
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