quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Devassa na Ordem dos Músicos do Brasil


Gérson Tajes e o antecessor, Roberto Bueno: ação permitiu que profissionais atuem sem pagar a anuidade
No mês em que se comemora o Dia do Músico, a categoria está às voltas com uma mega auditoria, promovida pela atual diretoria, para averiguar as contas anteriores da Ordem dos Músicos do Brasil (OMB) e de suas regionais em todo o país. Segundo o presidente da entidade, Gérson Tajes, nos últimos 48 anos a autarquia federal foi comandada pela 'ditadura'. Tajes, que assumiu o comando em abril, disse ao Correio que há todo tipo de fraudes e suspeitas e determinou a auditoria por ordem do Tribunal de Contas da União (TCU), que defendeu maior transparências nas contas da entidade.
O levantamento começa em São Paulo, onde fica a maior seccional da entidade a qual, há dois anos, não responde um pedido, feito por um conselheiro do órgão, para exibir suas contas. Os antigos presidentes da OMB nacional e paulista estão fora dos cargos. Decisão do TCU ordenou, em 2014, que a entidade publicasse seus balanços na internet, o que não está acontecendo como se esperava. As cinco maiores regionais arrecadaram R$ 29,1 milhões entre 2008 e 2012, segundo o tribunal, sendo R$ 11 milhões apenas com taxas cobradas de shows internacionais no país.
'A Ordem nunca fez o papel que deferia fazer', afirmou Tajes, ritmista e cantor de samba. 'Tem muito desvio, dilapidação de patrimônio, enriquecimento ilícito', prosseguiu. Ele espera ver o trabalho concluído, para prestar mais informações. 'Após a auditoria feita, vamos mencionar os estados que têm problemas e os que não têm.' Tajes pediu, em 25 de outubro, que a Polícia Federal abrisse inquérito em São Paulo e narrou que integrantes da entidade venderam um carro por R$ 10 mil e ficaram com o dinheiro, além de se apropriarem das senhas de acesso dos e-mails da regional paulista.
Outros músicos ouvidos pelo jornal também criticam a falta de transparência e afirmam que os benefícios da OMB não são compatíveis com o que ela arrecada. No STF, uma ação que se arrastou por sete anos autorizou os profissionais a atuar sem a obrigatoriedade de pagarem anuidade e ou de usarem a carteirinha da entidade.
O maestro de coral e conselheiro da OMB de São Paulo Eduardo Roz pediu três vezes, em 2014, inclusive por escrito, que o então presidente da regional paulista, Roberto Bueno, exibisse as contas do órgão. Nunca foi atendido. 'A partir do momento em que não há esclarecimentos, você dá margem para especulação', disse ele ao Correio.
No site da OMB, até hoje, há apenas um balancete daquele ano, que, sem detalhar as despesas, diz que R$ 3,2 milhões é a soma do ativo, do passivo e do patrimônio líquido. A regional está sob intervenção. O presidente da comissão provisória em São Paulo, o baterista Márcio Teixeira, confirma que a transparência está devendo. 'Há muito o que se apurar, assim como há muito o que se fazer para que a OMB, a nível nacional, se ajuste à legislação atinente, de forma eficiente, e responsável, inclusive em cumprimento da transparência.'
Bueno fez acusações contra Tajes, que as nega: 'São 48 anos de ditadura. O que está acontecendo é que estão chamando a gente de bandido e dizendo que a gente não é músico. Isso tudo é para a gente não mostrar a transparência do que está acontecendo'. Bueno negou as suspeitas e disse que a auditoria foi iniciativa dele. O ex-presidente da OMB Nacional Tony Maranhão não foi localizado.
A cantora de baile e jornalista Cláudia Souza publicou em seu site uma série de documentos noticiando o que ela classifica uma briga de dois grupos pelo poder na entidade. Para ela, a OMB 'é um órgão arcaico, cuja receita arrecadada ainda é recolhida através de acordos judiciais com advogados, ao invés de métodos fiscalizáveis, como boletos bancários e DARFs'. O gaitista da Engels Espíritos, do Movimento de Valorização do Músico, diz que a Ordem não trabalha pelos profissionais, mas 'pelos interesses de seus diretores, conselheiros e presidentes'. Ele afirma que, pelo que sabe, 'nenhum' real foi investido em assistência à saúde e à qualificação profissional dos músicos, o que seria uma obrigação da entidade.
Um relatório do ministro do TCU Augusto Shermann apontou que existem 'mudanças conturbadas nas diretorias' das regionais, além de 'disputas internas', que atrapalham o controle e a fiscalização das contas.
'A Ordem nunca fez o papel que deferia fazer. Tem muito desvio, dilapidação de patrimônio, enriquecimento ilícito', Gérson Tajes, presidente da Ordem dos Músicos
Duas perguntas para Roberto Bueno, ex-presidente da OMB em São Paulo
O sr. acusa dirigentes da OMB, mas as contas de sua gestão também são criticadas…
Eu mandei fazer essa auditoria e está sub judice. Assim que terminar a auditoria, eu dou entrevista. Enquanto não terminar, eu não posso falar nada. Quem pediu a auditoria foi o maestro Godoy, e eu que atendi a solicitação dele.
É que levantam suspeitas de que o senhor…
O que disserem não me interessa. O que me interessa é preto no branco, o que está no papel. Assim que tiver uma solução do caso, eu dou entrevista. Eu não devo nada pra ninguém. Fiquei sete anos lá dentro e só fiz bem para os músicos.
R$ 29,1 milhões Total arrecadado por cinco regionais da OMB entre 2008 e 2012. 

Por EDUARDO MILITÃO, no Correio Braziliense
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