A formiguinha revolve a terra
remexe os grãos
tira daqui leva pracolá
Na labuta e na luta
brinca, sorve, se embriaga
com a mágica poeira que tece e edifica sonhos
que sopra e conduz cacos, ciscos e vidas
E se cobre
se farta
lambuza-se de prazer a diminuta formiga
Inquieto e ensimesmado o esquálido Joãozinho assunta ... assunta ... assunta
empina o corpo tísico para só então perguntar
- Qui gostu tem essa terra daí, formiguinha?
- Sabor de framboesa, sim sinhô.
- Cunheçu não, sô.
- Humm ... umbu, açaí, cupuaçu, pequi, manga, caju ...
- Virge em cruz, gostoso toda vida, gosto de vida.
A formiguinha se enamora da terra
trabalho e construção
casa, coberta, abrigo de turmalina
lazer, pirraça e diversão
mel, comida, barriga cheia, água pura cristalina
Cada grãozinho de terra que a formiga amiga move, é o éden que revolve
Todo grão cintila ouro, exala prata
regurgita safira e diamante
Cada minúsculo pozinho tem trejeitos de mulher amante
Para a formiguinha que tem a terra
tudo é vida
tudo é trabalho tudo é ócio
tudo é mistério, aventura, tudo é só riso
Pobre Joãozinho
Criança miserável e travessa desdenhada por Deus e pelos homens
Só o anjo-pirralho não tem a terra para brincar, para plantar, para colher e para sonhar
Nesse mundão de valha-me-deus
Joãozinho não tem lugar ... qualquer lugar ... um único lugar
No gigante planeta Terra
descomunal santuário, templo sagrado dos espaços mais largos
a vida é estreita porque a gente simples não tem lugar
Não permitem existir na terra uma terra para amar.
Antônio Carlos dos Santos
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