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Da BBC
Pense no Vale do Silício – a região do Estado americano da Califórnia em que estão concentradas algumas das empresas de tecnologia mais famosas do mundo –, e a imagem que vem à cabeça é a de uma população jovem e "descolada".
Daí a surpresa com a história de Barbara Knickerbocker-Beskind. Aos 91 anos, ela trabalha como designer e é uma referência no campo da terapia ocupacional. Ela conversou com a BBC sobre sua paixão por invenções e explicou o segredo de sua longevidade profissional.
"Durante a Grande Depressão, não tínhamos dinheiro para coisa alguma, então tínhamos que atuar como solucionadores de problemas desde o início. Não havia outra alternativa. As únicas coisas que não fabricamos foram sapatos e óculos.
Criatividade
Meu pai foi um dos primeiros 100 agentes do FBI (a Polícia Federal americana), mas quando eu tinha um ano ele perdeu o emprego e ficou sem trabalhar por sete anos. Tivemos que nos mudar para a casa de minha avó. Mas meu pai era um grande observador e herdei isso dele. E minha mãe sempre foi muito criativa.
Não tínhamos dinheiro para brinquedos, por exemplo, então fazíamos os nossos. Eu, por exemplo, usei dois pneus para fazer um cavalinho – e com ele aprendi muito sobre a gravidade, pois caí várias vezes.
Aos 10 anos, já sabia que queria ser inventora, mas o orientador vocacional em minha escola disse que mulheres não seriam aceitas em faculdades de engenharia. Fui então cursar economia do lar, pensando que talvez pudesse desenhar alguns novos abridores de latas.
Mas, em 1945, quando me formei pela Universidade de Syracuse, tive a sorte de ser aceita pelo programa de terapia ocupacional do Exército Americano. Foi o que realmente lançou minha carreira.
Naquela época, a terapia ocupacional usava o artesanato, bem como trabalhos em carpintaria, por exemplo, para ativar as pernas e braços de pacientes voltando da Segunda Guerra Mundial. Minha missão era fazer com que os pacientes ganhassem o máximo de independência possível – que conseguissem segurar uma colher ou um garfo, por exemplo.
Carta
Em 1966, aos 42 anos, aposentei-me do Exército e abri um consultório particular – fui a primeira pessoa a fazer isso nos EUA. Desde então, já tentei parar de trabalhar cinco vezes. Nunca consegui. Voltei a estudar e, em 1997, formei-me em Belas Artes, o que me ajudou muito a desenhar minhas invenções.
Em 2013, quando vi uma entrevista na TV com David Keely, fundador da empresa de design IDEO, pensei que minha experiência pudesse ser útil. Ele aceitava e respeitava pessoas de várias origens. Eu tinha 89 anos. Sofro de um problema nos olhos que me impede de usar computadores, então escrevi uma carta.
Uma semana depois, recebi a resposta: a firma precisava de alguém para coordenar o design de produtos voltados para idosos. Fui convidada para uma conversa na sede da empresa e, de repente, vi-me dando uma palestra para mais de 30 pessoas. Tornei-me consultora para produtos e serviços voltados a idosos e pessoas com problemas de visão.
Trabalho uma vez por semana. Caminho três quarteirões até a estação de trem para chegar aos escritórios da IDEO às 10h. Sento-me no mesmo sofá para que todo mundo saiba onde estou. Logo chegam pessoas para marcar hora para conversas sobre seus produtos – é um ambiente extremamente colaborativo.
Adoro trabalhar neste ambiente. Posso ser seis ou sete décadas mais velha que alguns de meus colegas de trabalho, alguns deles com mestrados e doutorados, mas sou aceita como uma igual. Sou respeitada por minha experiência e meusinsights.
Ninguém jovem pode pensar como uma pessoa idosa se sente.
Mesmo eu preciso conversar bastante com meus vizinhos numa comunidade para idosos. Sempre recebo deles ideias sobre produtos. Um deles, por exemplo, inspirou-me a criar uma espécie de espelho retrovisor para que ele possa sair às ruas com mais confiança em seu andador.
Os idosos são uma fonte de ideias que precisa ser melhor utilizada.
Não espero que todo mundo goste de trabalhar como eu. Mas trabalhar é minha identidade."