Polícia de Moscou prende manifestantes, em 2 de março de 2022 — Foto: Natalia Kolesnikova / AFP |
Em meio à repressão de protestos nas ruas, os jovens ainda estão se arriscando para se manifestar contra o conflito na Ucrânia.
Em 24 de fevereiro, quando a
Rússia lançou sua invasão da Ucrânia, uma imagem começou a se espalhar nas
mídias sociais — uma foto do poeta russo Pushkin, o número sete e várias linhas
apenas com o emoji da "pessoa caminhando".
Para quem conhece esses
símbolos, o significado era claro: um local (Pushkin Square, em Moscou), um
horário (sete horas) e uma convocação para um protesto contra o governo.
Os emojis faziam referência
a um código usado há anos na Rússia para convocar a protestos — um código tão
conhecido pelas autoridades que ele nem funciona direito como forma de
despistar, segundo o grupo de direitos humanos OVD-Info.
Por que usar código?
Protestos são proibidos no
país desde 2014 e as violações dessa lei podem levar a até 15 dias de detenção
no caso de uma primeira infração. Os reincidentes podem receber penas de prisão
de até cinco anos.
Desde então, tem sido comum
os ativistas usarem várias frases codificadas para se organizarem online.
"É como, 'Vamos dar um
passeio até o centro', ou 'O clima está ótimo para uma caminhada'", diz
Maria. É com uma mensagem assim que ela informa seus amigos que planeja
participar de um protesto.
O que começou como uma forma
de escapar da censura do governo quase se tornou uma piada interna ou um meme,
disse Maria à BBC News.
No entanto, as consequências
de não usar essa linguagem em código podem ser graves.
Quais são as possíveis
consequências?
Alexander participou de um
protesto em Moscou e postou sobre isso nas redes sociais.
Na manhã seguinte, policiais
à paisana o pegaram do lado de fora do prédio de sua namorada e o levaram para
o departamento de polícia local. Ele foi detido por vários dias e obrigado a
assinar um documento listando o que as autoridades disseram que ele havia
feito.
Não podemos ter certeza de
que sua participação no protesto ou sua atividade nas mídias sociais levaram à
detenção de Alexander. Mais tarde, ele foi preso pela segunda vez, enquanto
usava o metrô de Moscou, em um dia em que não estava participando de um
protesto.
A BBC News soube de outras
detenções baseadas apenas em atividades de mídia social, incluindo uma mulher
presa por causa de uma mensagem no Twitter.
Em 24 de fevereiro, ela
postou: "Faz muito tempo que não ando no centro" e citou o tuíte de
outra conta contendo um apelo mais explícito à manifestação.
Cinco dias depois, ela foi
presa enquanto pegava um trem.
Ela acredita que foi
detectada por um software de reconhecimento facial ativo no sistema de metrô de
Moscou — e em sua audiência no tribunal, um documento contendo seu tuíte foi
apresentado, mostrando que as autoridades fizeram uma captura de tela quase imediatamente
após ela postá-lo.
Em outro caso, Niki, um
blogueiro, descreveu como o irmão de um amigo próximo foi detido duas vezes —
uma delas por apenas horas depois de participar de um protesto; e outra vez por
uma semana inteira por compartilhar os detalhes com seus amigos no VK, um site
russo semelhante ao Facebook.
Quase 14 mil pessoas foram
detidas em toda a Rússia desde que o conflito começou há duas semanas,
principalmente por participação em protestos, de acordo com a OVD-Info — que
fornece aconselhamento jurídico.
Até agora, a maioria foi
detida por horas ou dias.
A situação está mudando?
Uma lei foi introduzida na
Rússia em 4 de março com o objetivo de combater "notícias falsas"
sobre os militares. Mas acredita-se que a lei será usada para reprimir ainda
mais os protestos contra a guerra — incluindo penas de prisão de até 15 anos,
muito maiores do que as sentenças anteriores.
Para jovens como Maria, isso
"já mudou as coisas, porque agora tenho medo de sair para protestar e
também tenho medo de postar sobre essa 'operação especial' [invasão russa da
Ucrânia]".
E há indicações claras de
que as prisões aumentaram desde que a nova lei foi introduzida, diz OVD-Info.
Onde os russos estão
postando agora?
O fechamento de meios de
comunicação independentes, o bloqueio do Facebook e as restrições às postagens
de russos no TikTok eliminaram as principais rotas de acesso a informações, diz
o coordenador da OVD-Info, Leonid Drabkin. Ele acredita que as próprias pessoas
vão se autocensurar, com medo das autoridades.
"Agora, se você navega
no Instagram, vai perceber que há 10 vezes menos postagens", diz ele.
Muitos de seus contatos
apagaram completamente seus perfis de mídia social.
Isso já afetou o número de
pessoas "com coragem o suficiente para protestar".
Os nomes de alguns
colaboradores foram alterados para proteger suas identidades.
BBC
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