O que constitui um crime
de guerra?
Tribunal Penal Internacional anunciou inquérito sobre possíveis
crimes de guerra cometidos pela Rússia em sua invasão da Ucrânia. Padrões
internacionais os distinguem de crimes contra a humanidade e genocídio.
Desde que a Rússia invadiu
a Ucrânia, em 24 de fevereiro, cada vez mais suas tropas invasoras têm atacado
localidades civis com bombardeios aéreos e artilharia. A ONG Anistia
Internacional registra "ataques indiscriminados". Coloca-se a questão
de se estariam sendo cometidos crimes de guerra.
O presidente ucraniano,
Volodimir Zelenski, descreveu como crimes de guerra os lançamentos de mísseis
russos contra áreas civis. O mais recente foi nesta terça-feira (01/03), quando
a Praça da Liberdade da cidade de Kharkiv sofreu bombardeiros aéreos.
No dia seguinte, o
Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia, Holanda, anunciou a abertura de um
inquérito por crimes de guerra ou contra a humanidade na Ucrânia. Em
comunicado, o promotor Karim Asad Ahmad Khan afirmou haver "base
razoável" para abrir uma investigação, e que começara a coleta de provas.
Quando os promotores do
TPI têm motivos para crer que foi cometido um crime de guerra, iniciam um
inquérito em busca de provas apontando para os indivíduos responsáveis. "É
o tipo de momento a que estamos nos dirigindo agora, no que diz respeito aos
crimes de guerra perpetrados na Ucrânia", explica Mark Kersten, da Munk
School of Global Affairs and Public Policy da Universidade de Toronto..
A rapidez é essencial,
pois as provas podem se deteriorar ou desaparecer. É muito difícil os
promotores investigarem com êxito possíveis crimes de guerra após o fato,
quando uma das partes do conflito possa ter adulterado provas ou as testemunhas
não estejam mais disponíveis.
"Nem toda morte civil
é ilegal"
Crimes de guerra – que não
devem ser confundidos com crimes contra a humanidade – são definidos
internacionalmente como violações às leis humanitárias durante um conflito.
Essa definição, estabelecida no Estatuto de Roma do TPI, deriva-se das
Convenções de Genebra de 1949 e se baseia no princípio de que indivíduos podem
ser responsabilizados pelas ações de um Estado ou de suas forças militares.
O Escritório das Nações
Unidas para a Prevenção do Genocídio e Responsabilidade de Proteger distingue
os crimes de guerra do genocídio e dos crimes contra a humanidade. Aqueles são
perpetrados durante um conflito interno ou entre Estados, enquanto genocídio e
os contra a humanidade podem ocorrer em tempos de paz, ou durante a agressão
unilateral de militares contra um grupo desarmado.
A longa lista de
potenciais crimes de guerra inclui tomada de reféns, homicídios intencionais,
tortura ou tratamento desumano de prisioneiros de guerra, e coerção de menores
a combater. Na prática, contudo, há uma significativa zona cinzenta. "As
leis da guerra nem sempre protegem os civis da morte", observa Kersten.
"Nem toda morte civil é necessariamente ilegal."
Ataques a cidades e
localidades, bombardeio de edifícios residenciais e escolas, até mesmo o
assassinato de grupos de civis não constituem forçosamente crime de guerra, se
a necessidade militar for justificada. O mesmo ato pode se tornar crime se
resulta em destruição desnecessária, em sofrimento e mortes que excedam a
vantagem militar proporcionada pelo ataque.
Distinção,
proporcionalidade, precaução
Para estipular se um
indivíduo ou corpo militar cometeu um crime de guerra, a lei humanitária
internacional estabelece três princípios relativos à população civil:
distinção, proporcionalidade e precaução.
"A distinção diz que
se deve constantemente tentar distinguir entre populações e objetos civis e
beligerantes", explica Kersten, acrescentando que isso pode ser difícil em
situações de conflito. "Por exemplo, atacar barracas cujos ocupantes
declararam que não participam mais do conflito, pode ser um crime de guerra. O
mesmo se aplica ao bombardeio de uma base militar onde haja geradores que
fornecem eletricidade a hospitais."
No entanto, torna-se cada
vez mais difícil distinguir entre populações civis e militares: "Há
sabotadores, oficiais à paisana, combatentes se disfarçam o tempo todo na
guerras. É uma tática comum."
A proporcionalidade proíbe
que exércitos reajam a um ataque com violência excessiva. "Se um soldado é
morto, por exemplo, não se pode bombardear uma cidade inteira em
retaliação", exemplifica o perito em assuntos globais.
De acordo com o Comitê
Internacional da Cruz Vermelha, é também ilegal visar locais em que
previsivelmente se vá "causar perda incidental de vida civil, ferir civis,
danificar alvos civis de modo excessivo em relação à vantagem militar concreta
e direta antecipada".
O princípio da precaução,
por fim, exige que as partes de um conflito evitem ou reduzam ao mínimo os
danos infligidos à população civil.
Monir
Ghaedi, DW
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