"Guerra da Rússia contra a Ucrânia vai custar muito dinheiro. Putin só conseguirá manter seu domínio se transformar seu país num grande presídio" Foto: ALEXANDER ERMOCHENKO/REUTERS
Na guerra da Rússia contra a Ucrânia, não está apenas em jogo o
destino de um país. Caso o mundo não acorde, passará a valer apenas a lei do
mais forte. Paz e liberdade também exigem sacrifícios, opina Miodrag Soric.
Vladimir Putin precisa
vencer rápido a sua guerra de ofensiva contra a Ucrânia. Não porque tenha uma
consciência ou escrúpulos. A questão é, antes, que caixões de jovens russos
mortos na luta contra o povo-irmão ortodoxo suscitam dúvidas quanto à
propaganda estatal de que esta seria uma guerra defensiva.
Em breve chega no Leste
Europeu a época de jejum pré-pascoal, que o ex-homem da KGB, o serviço secreto
da União Soviética, aproveitará para se apresentar como cristão devoto, de vela
na mão. Só que isso não combina com as imagens de mulheres, crianças e homens
que, por estes dias, morrem nos ataques do exército da Rússia.
Mas essa guerra não vai
passar tão rápido. Mesmo que tenham que lutar com coquetéis molotov e com as
mãos nuas, os ucranianos não vão desistir! O povo russo provou grande
capacidade de sofrer durante a era soviética, e coragem na Segunda Guerra
Mundial, mas os ucranianos não ficam nada atrás. Além disso, têm a primazia
moral: estão defendendo seu país, suas famílias, sua vida. Os soldados russos,
em contrapartida, chegam como agressores, ocupadores, fratricidas.
Paz
e liberdade não são grátis
Para o tão reticente
Ocidente, a questão é a seguinte: até agora, não havia hostilidade em relação à
Rússia. Pelo contrário: fazíamos negócios, cooperávamos na política, cultura e
ciência. Milhões de russos vinham como turistas à Espanha, Turquia ou Grécia,
lá onde também os europeus ocidentais passam suas férias. Justamente por isso,
quase ninguém no Ocidente conseguia imaginar que Putin cometeria esse crime, e
que os russos seguiriam essa loucura.
Sim, o presidente da
Rússia tem razão: os europeus estão mal equipados, têm tomado a sua vida na
prosperidade como um fato inquestionável. Mas isso está mudando, agora mesmo.
Pois todo europeu que ame a liberdade e a paz percebe essa ofensiva contra os
ucranianos como um ataque contra si mesmo. Todo mundo está vendo que Putin
mente quando abre a boca, que não se atém a nenhum pacto nem regra
internacional.
De repente, muitos na
Alemanha compreendem, com nitidez maior do que lhes conviria, que só os Estados
Unidos garantem a sua segurança – e estão gratos por isso. Mas é justo exigir
de uma mãe do Mississipi que seus filhos se engajem pela segurança da Europa,
quando outra mãe em Berlim não está disposta a isso? A Alemanha precisa acordar
e compreender: a paz, a liberdade e a nossa democracia não são de graça.
A disposição de tornar as
Forças Armadas alemãs novamente aptas à mobilização e a fortalecer a Otan
cresce com cada foto de mulheres e crianças em prantos nos metrôs de Kiev, onde
vão buscar proteção das bombas russas. Os europeus de dispõem a fazer
sacrifícios em nome de seus valores. E vão fazer frente à declaração de guerra
da Rússia contra a ordem pacítica da Europa.
Putin
mente, China observa
As perspectivas que o
mundo civilizado tem de ganhar essa luta, são boas. Putin pode bem tentar
convencer seus compatriotas e o mundo de que a Rússia é forte, mas também isso
é uma mentira. A moral dos russos é forte quando eles sabem que estão do lado
do bem. Apesar da imprensa manipulada pelo Estado, vão cada vez mais perceber
que sua guerra contra o povo-irmão ucraniano é um crime.
Além disso, a Rússia está
economicamente fraca, pois Putin é incapaz de modernizar seu país. A atual
classe política é ainda mais corrupta do que nos tempos do líder do Soviete
Supremo Leonid Brejnev. E o presente chefe do Kremlin só suporta a seu redor
servidores submissos, que ainda por cima humilha diante das câmeras.
Sanções econômicas e
gastos de defesa significativamente mais altos não bastarão para vencer a
confrontação com o ditador. A elite criminosa da Rússia tem que ser isolada; as
relações diplomáticas, reduzidas ao mínimo.
Acima de tudo, entretanto,
o Ocidente não deve fechar suas portas aos jovens russos. A economia alemã e
americana procura desesperadamente centenas de milhares de profissionais. Quem
queira emigra da Rússia, a fim de levar uma vida normal em ambiente seguro,
deve ser bem-vindo.
Pois uma coisa é certa: a
guerra da Rússia contra a Ucrânia vai custar muito dinheiro. Putin só
conseguirá manter seu domínio se transformar seu país num grande presídio –
como a China.
O que, aliás, é mais um
motivo por que a civilização amante da liberdade deve vencer esse conflito:
Pequim está acompanhando minuciosamente o que ocorre na Ucrânia. Caso Putin
tenha sucesso, a China atacará Taiwan e, em algum momento, também outras
nações.
Aí, só o que vai valer por
todo o mundo é a lei do mais forte. A humanidade se precipitaria de volta na
barbárie. Mas a coisa não precisa ir tão longe se, a partir de já, estivermos
dispostos a também fazermos sacrifícios em nome da nossa liberdade.
Miodrag
Soric, DW
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