quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

"Ninguém faz ciência com a Wikipédia"

Enciclopédia online completa 15 anos, entre os sites mais visitados em vários países. Mas o cientista da comunicação Rudolf Stöber vê limitações no projeto, desenvolvido de forma colaborativa.

Wikipédia completa 15 anos
Rudolf Stöber é professor de Ciências da Comunicação na Universidade de Bamberg e tem como seus principais campos de pesquisa as transformações das áreas de comunicação, publicidade e mídia. Por ocasião dos 15 anos da Wikipédia, ele conversou com a Deutsche Welle sobre as vantagens e limitações da enciclopédia online. O especialista considera a obra, desenvolvida de forma colaborativa na internet, uma boa fonte de conhecimento, mas ressalta que ela não substitui o conhecimento encontrado na literatura científica convencional.
DWComo o senhor usa a Wikipédia enquanto cientista da comunicação?
Rudolf Stöber: Uso a Wikipédia principalmente como uma extensão da investigação e para pegar ideias sobre coisas em que posso me aprofundar.
Quais as reservas que o senhor tem quanto a ela, em termos de padrão de qualidade e confiabilidade?
Isso é algo que não consigo responder genericamente, pois isso depende muito do contexto temático. Artigos que se encontram dentro do discurso político geral – como "crise de refugiados", por exemplo –, devem ser lidos com cautela. Mas é possível ver o histórico de versões. Basicamente, a Wikipédia se tornou uma enciclopédia muito boa. Minha principal reserva, de uma perspectiva científica, é que alguns alunos e até mesmo alguns colegas meus acreditam que, nela, estão fazendo ciência, o que é um grande mal-entendido.

Rudolf Stöber: "rapidez é uma qualidade e também um defeito da Wikipédia"
Isso significa, então, que a fonte Wikipédia deve ser sustentada por outras fontes?

Tem que ser assim. Isto também está ligado ao fato de a Wikipédia ser uma enciclopédia. Uma enciclopédia tem que reproduzir certa quantidade de conhecimento condensado. E a Wikipédia faz isso muito bem, com certas limitações. Pois a tendência é que os artigos dela inchem com o tempo. Comparando às enciclopédias tradicionais, como Brockhaus ou a Encyclopedia Britannica, eu gostaria que houvesse informações mais precisas e mais curtas. Em geral, enciclopédias oferecem conhecimento condensado de coisas sobre as quais as pessoas já têm, bem ou mal, alguma informação – elas não têm nada a ver com a tarefa principal da ciência, que é levantar questões e problemas. Ela responde perguntas segundo o conhecimento factual (o que é algo), mas não segundo um conhecimento de metodologia científica, orientado pelo problema (como algo ocorre).
Quais são os maiores pontos fracos da Wikipédia?
Eu posso dizer que o meu próprio campo, a ciência da comunicação, está muito mal representado. Meus colegas sentem falta, nos procedimentos de gestão de qualidade, do mesmo nível que em publicações científicas. Nós nos sentimos, em parte, julgados por pessoas que não são especialistas. Por isso, muitos colegas meus preferem não se intrometer, e acho que isso ocorre de forma semelhante em outros campos. E isso me legitima para lembrar aos estudantes que também existem enciclopédias, revistas e livros especializados.
A Wikipédia não é apenas uma plataforma de conhecimento, mas, por vezes, também um campo de batalha em que são travadas disputas sobre interpretações e explicações corretas. Como o senhor avalia esta luta em torno da verdade?

Nesse ponto, a Wikipédia tem uma vantagem incrível, por publicar o histórico de versões. Esta transparência é positiva e faz da Wikipédia quase em um objeto do meu próprio campo de pesquisa. Mas, em princípio, a atualidade diária é algo impróprio para uma enciclopédia. Uma qualidade dessa enciclopédia, que é a de reagir a fatos muito atuais, também um motivo para seu defeito, que é o de ir além da tarefa verdadeira de uma enciclopédia e apresentar mais do que conhecimento factual condensado. Mas nesse ponto não há como, estruturalmente, fazer mudanças.

Enciclopédias tradicionais, como a alemã Brockhaus, estão desaparecendo
Segundo a própria Wikipédia, ela já possui 37 milhões de artigos em quase 300 idiomas. Nos EUA, a enciclopédia online está em sexto lugar e, na Alemanha, em sétimo lugar entre os sites mais visitados. No entanto, a Wikipédia tem sido repetidamente acusada de ser uma plataforma vulnerável ao vandalismo e à influência de empresas e organizações sobre seu conteúdo. Há alguma verdade nessa crítica?
Eu não avaliei isso estatisticamente, mas é um problema que não pode ser resolvido, essa influência de escritores ​​que escondem sua verdadeira identidade. Devido à sofisticação com que certas mensagens publicitárias são lançadas, muitas vezes não conseguimos nos dar conta disso tão rapidamente. Eu acho que isso, necessariamente, tem relação com esta estrutura de comunidade aberta, sendo algo que não pode ser solucionado.
Mas isso, sem dúvida, é muito grave. Basta observar os verbetes de certos políticos, em torno dos quais houve as chamadas "guerras de edição" ou verbetes na Wikipédia em inglês sobre o conflito Ucrânia-Rússia. Você sabe do que estamos falando. Só é preciso ver os números dando conta da alta frequência de mudanças, para lá e para cá, e aí você percebe que o verbete é problemático.
Na Alemanha, a Wikipédia registra mais de um bilhão de visitas por mês. Enquanto a Wikipédia navega através da internet, as enciclopédias emblemáticas alemãs, como a boa e velha Brockhaus, vão afundando lentamente...
De certa forma, sim, por causa do rigor e da precisão das enciclopédias antigas. É lamentável que a Brockhaus e a Encyclopedia Britannica tenham sumido. Estas enciclopédias tinham um sistema finamente graduado de duração variável, dependendo da importância. Claro que podemos também argumentar que, por outro lado, a relevância da comunidade da internet não deve ser desprezada.
Por  Klaus Krämer , na  Deutsche Welle
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Pré lançamento do livro "Tiradentes, o mazombo: 20 contos dramáticos":

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