Entre
os efeitos maléficos da corrupção para a economia nacional, os autores apontam
a redução do crescimento, a diminuição dos investimentos públicos e a gradativa
deterioração da infraestrutura
Práticas
irregulares na gestão do dinheiro público disseminaram-se pelo País, como
mostra o fato de que houve alguma forma de corrupção em pelo menos 15,65% das
ações de responsabilidade das prefeituras bancadas com recursos da União. A
constatação foi feita por uma pesquisa baseada em auditorias realizadas pela
antiga Controladoria-Geral da União (CGU), hoje Ministério da Transparência,
Fiscalização e Controle. Dada a grande dificuldade na identificação e
caracterização dos atos de corrupção, pois eles são praticados de maneira
dissimulada e de modo a não deixar vestígios, não parece exagerado supor que
deve ser ainda maior o índice de ilegalidades cometidas com o dinheiro que a
União transfere para os municípios, por imposição legal ou por decisões político-administrativas.
A pesquisa
teve como fonte as auditorias realizadas pela CGU entre 2006 e 2010 em 840
municípios. Não parece coincidência que os atos ilegais detectados tenham
ocorrido no período que começa pouco depois de vir à tona o escândalo do mensalão
e abrange aquele em que, como vem mostrando a Operação Lava Jato, o governo do
PT coordenou um imenso esquema de assalto à Petrobrás. Os exemplos criminosos
vinham de cima.
É imenso o
custo social dessa prática, que se tornou endêmica no País, como mostra a
pesquisa, cujas conclusões foram divulgadas pelo Broadcast, serviço de
informação em tempo real da Agência Estado. Os pesquisadores Olavo Venturim
Caldas, da Secretaria de Transparência e Prevenção da Corrupção da CGU;
Cristiano Machado Costa, da Unisinos (RS); e Marcelo Sanches Pagliarussi, da
Faculdade de Economia e Administração da USP de Ribeirão Preto, responsáveis
pela pesquisa, concluíram que a corrupção nos municípios se concentra nas áreas
de saúde (houve irregularidades em 19% das ordens de serviços analisadas) e
educação (17,5%). Ilegalidades foram identificadas também em 1,25% das ações da
área de assistência social e em 6,56% das demais.
Entre os
efeitos maléficos da corrupção para a economia nacional, os autores apontam a
redução do crescimento, a diminuição dos investimentos públicos e, em
consequência, a gradativa deterioração da infraestrutura. Para a população, a
corrupção tem efeitos que, embora não tão notáveis, podem ser mais perniciosos
e duradouros, como a perda da qualidade do ensino e dos serviços de saúde
oferecidos à população.
Em balanço
divulgado no início do ano, a CGU mostrou que, desde 2003, irregularidades
constatadas em 199 dos 2,7 mil municípios fiscalizados resultaram no desvio de
R$ 2 bilhões destinados à merenda e ao transporte escolar por meio de programas
federais. Há relação estreita entre a má gestão pública e o desempenho dos
estudantes. Nos municípios onde a corrupção é mais intensa o desempenho é pior.
A
corrupção tem outro aspecto particularmente nocivo, pois ela prejudica mais os
mais carentes. “Nos municípios com maior incidência de corrupção as escolas têm
infraestrutura pior, os professores recebem menos treinamento e relatam maior
preocupação com a falta de recursos”, diz o estudo.
“Infelizmente
há um ciclo viciado que impede que o povo seja mais educado e tenha mais poder
de fiscalizar”, observa Olavo Caldas, um dos autores do trabalho. No atual
ambiente institucional, diz ele, as políticas sociais não alcançam plenamente
seus objetivos, “pois o dinheiro para essas áreas é desviado”.
Além do
controle falho, também normas legais favorecem o desvio dos recursos que as
prefeituras destinam para a área social. Uma delas é a que obriga as
prefeituras a aplicarem pelo menos 25% da receita na área de educação e 15% em
saúde – ou seja, 40% da receita tem destino certo. “A obrigatoriedade de
alcançar o mínimo exigido pela legislação frequentemente resulta em gastos não
prioritários, gerando incentivos para que os agentes se engajem em atividades
consideradas corrupção”, afirmam os autores do estudo. Em outras palavras, a
vinculação das receitas, como é conhecida a obrigatoriedade de aplicação do
dinheiro em determinados setores, alimenta a ineficiência e a corrupção.
Editorial de O Estadão
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