quinta-feira, 12 de maio de 2022

Conferência da ONU busca soluções para degradação dos solos, que já atinge 40% do planeta


No continente mais afetado do mundo pela desertificação dos solos, uma cúpula internacional tenta encontrar alternativas para evitar que o fenômeno não se espalhe ainda mais – não só na África, como em todo o planeta.

 

A conferência da ONU sobre o tema acontece na Costa do Marfim durante duas semanas. Participantes de 197 países se reúnem para discutir soluções para o problema, que já atinge mais de 40% das superfícies do globo.

Se nada for feito, o que já é ruim vai ficar pior: com menos terras produtivas disponíveis, cresce a tensão para o aumento da produção alimentar nas áreas cultiváveis, levando a uma degradação de novas regiões. Em 2050, ela poderia atingir uma área equivalente a toda a América do Sul, com impacto não só na segurança alimentar e hídrica, mas também nas mudanças do clima e na biodiversidade.

"Sessenta e cinco por centro das terras cultiváveis na África foram perdidas nos últimos 70 anos. Neste período, a população africana cresceu pelo menos 600%”, disse o secretário-executivo da Convenção das Nações Unidas pela Luta contra a Desertificação, Ibrahim Thiaw, em entrevista à RFI. "Ou seja, enfrentamos uma situação em que, embora o continente não seja superpopuloso, a exploração dos recursos naturais se tornou insustentável.”

Causas naturais e humanas

Com extensas áreas secas e áridas, a África é ainda mais vulnerável ao impacto do aquecimento do planeta, já que as condições climáticas acentuam a desertificação, observa Patrice Burger, membro do painel de especialistas das Nações Unidas sobre o fenômeno e fundador da organização Cari, que atua no continente.

“Costumamos dizer que a degradação dos solos é causada por causas naturais, como a seca, mas também pelo aumento das temperaturas e outros fenômenos que até parecem paradoxais, como quando ocorre uma chuva abundante sobre a terra seca. É nesse momento que ocorrem tremendas erosões sob o solo”, explica Burger, ao programa C'est Pas du Vent, da RFI. "O problema da erosão é que quando a água vem, ela só escorre e evapora neste solo. A água não entra mais nesta terra degradada e o solo não pode mais ter o seu papel de esponja, fazendo com que a desertificação se amplifique.”

A atuação humana, porém, também é altamente responsável pela degradação dos solos, a exemplo das queimadas e do abuso de agrotóxicos no Brasil. “As causas humanas são as más práticas agrícolas, deixar o solo descoberto, revirar o solo em grandes profundidades, reduzir a biodiversidade viva no solo, o que inclui usar produtos químicos que matam a vida do solo. A base de um solo, para que ele funcione e faça circular o ar e a água, é ter micro-organismos vivos”, ressalta o especialista.

Recuperação e conservação

As soluções existem, mas demandam mudanças profundas de práticas e investimentos. Ibrahim Thiaw destaca o exemplo da Grande Muralha Verde do Sahel, projeto faraônico iniciado em 2007 em onze países africanos, para tentar restaurar 100 milhões de hectares de terras.

“É um programa extremamente ambicioso, que está em curso, com a promessa de financiamento de alguns parceiros que chega a US$ 19 bilhões, nos próximos cinco anos. Os países da África Austral querem fazer o mesmo e estão organizando um programa similar”, salienta. "E o norte da África poderia fazer parte da grande iniciativa do Oriente Médio, lançada pela Arábia Saudita e que poderia ir até o Magreb africano”, complementa o secretário-executivo da UNCCD.

Além de restaurar as áreas degradadas, outro aspecto importante das discussões na COP da Desertificação é avançar na criação de extensas áreas protegidas. O objetivo seria chegar a um total de 4 milhões de quilômetros quadrados, o equivalente aos territórios da Índia e do Paquistão.

Lúcia Müzell, RFI


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