Em cinco anos dando aulas na rede estadual do Espírito Santo para alunos do ensino fundamental e médio, Wemerson Nogueira acumula prêmios regionais e estaduais |
Em cinco anos dando aulas na rede
estadual do Espírito Santo para alunos do Ensino Fundamental e Médio, ele
acumula prêmios pelos projetos educativos que desenvolveu. E agora, é um dos 50
finalistas do Global Teacher Prize, considerado o "Nobel da
educação".
É a segunda vez que brasileiros
fazem parte da lista de finalistas divulgada pela ONG Varkey Foundation.
Em 2016, além de Wemerson, o
professor amazonense Valter Pereira de Menezes também é considerado para o
prêmio de US$ 1 milhão, entregue a "um professor excepcional que tenha
feito uma contribuição extraordinária para a profissão".
O nome do vencedor será anunciado
em março, durante um evento em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.
Para Wemerson, que ensina Química
e Ciências na cidade de Boa Esperança, o segredo do sucesso está em motivar os
alunos, descobrindo como eles gostariam que o conteúdo fosse abordado na sala
de aula - ou fora dela.
"Desde 2014, a primeira
coisa que faço com meus alunos é mostrar o plano de ensino daquele ano para
eles e trocamos ideias sobre como estudar aqueles conteúdos. Por exemplo: 'Como
vocês querem aprender a tabela periódica?'", disse à BBC Brasil.
"Eles dão ideias, eu anoto tudo no quadro. Depois temos
uma roda de conversa para debater o que é viável e o que não é. Em seguida,
falo com meu diretor sobre o que quero fazer. Sempre tive apoio dos meus
diretores."
Todos os anos, no início das aulas, Wemerson ouve os alunos sobre como eles querem aprender o conteúdo da disciplina |
Rio
Doce
Wemerson ficou famoso no Estado na
primeira escola em que trabalhou, ao criar um projeto de paródias musicais para
ensinar o conteúdo de Química de todo o ano letivo. "Foram mais de 40
músicas, com samba, funk, pagode, era uma loucura na escola. Fico até
emocionado lembrando", diz.
Além de discutir conteúdos e métodos de ensino, o professor também criou músicas de paródia para facilitar o aprendizado de química |
"Tenho
uma aluna que foi aprovada em Medicina na Universidade Federal do Espírito
Santo cantando. Ela cantava os conteúdos de Química e Biologia durante a prova,
e foi aprovada em segundo lugar."
No início das aulas em 2016, em
sua consulta com os alunos da 8ª série da Escola Estadual Antônio dos Santos
Neves, ele percebeu o impacto do rompimento da barragem em Mariana, que havia
ocorrido em novembro de 2015.
"Estamos muito perto de
Colatina (MG) e de Linhares (duas das cidades atingidas pela lama que desceu o
rio Doce). Os alunos só falavam disso e queriam aulas práticas de Química.
Então pensei em levá-los para fazer uma pesquisa científica de campo, em
Regência (ES)."
"Os alunos choravam muito
ouvindo as histórias dos moradores afetados pela lama. Aí não era mais só
entender a Química, era tentar ajudar a população. Voltamos para a escola
transformados", relembra.
Após fazer parcerias com laboratórios,
os alunos fizeram análises de amostras da água do rio Doce para estudar os
elementos da tabela periódica - entre eles, os metais pesados encontrados no
rio. Um deles teve a ideia de desenvolver um filtro para purificar a água usada
pelos moradores.
"É um filtro à base de areia
que deixa a água transparente, própria para o uso doméstico e agrícola, porque
é 75% potável, com base em uma portaria do Ministério da Saúde", explica
Wemerson.
"Levamos os filtros para a
comunidade de Regência, muitos ribeirinhos que não tinham água para nada
receberam o filtro. Agora ele está sendo replicado em diversas comunidades e
ficou conhecido nacionalmente. Nós fomos a primeira escola pública a tomar uma
atitude em prol das 3 milhões de pessoas afetadas pela tragédia do Rio
Doce."
Alunos de Nogueira foram até o rio Doce recolher amostras para análise e distribuíram filtros de água para famílias ribeirinhas |
O projeto "Filtrando as lágrimas
do Rio Doce" deu ao professor seu primeiro prêmio nacional, o Educador
Nota 10, concedido aos dez melhores educadores do Brasil. A partir daí, ele
passou a sonhar com o reconhecimento internacional.
"Uma amiga me marcou numa
postagem sobre o prêmio no Facebook e me disse: 'Já imaginou, Wemerson? Ser o
melhor do mundo?"
Primeiro
aluno
Segundo o Ministério da Educação,
apenas 2% dos jovens brasileiros que saem do Ensino Médio querem ser
professores. Mas Wemerson teve seu primeiro "aluno" ainda na 6ª série
do Ensino Fundamental - uma estratégia para melhorar seu comportamento em sala
de aula.
"Eu era muito hiperativo,
conversava para chamar a atenção e às vezes atrapalhava a aula. Então os
professores começaram a me colocar para trabalhar na sala sendo monitor dos
colegas. Mas isso foi uma coisa tão dinâmica e tão gostosa, porque eles me
colocavam em aulas de Ciências, de Química, que eram as que tinham mais
experiências", conta.
Ao monitorar um colega de classe ainda na 6ª série do ensino fundamental, Wemerson diz ter se apaixonado pela profissão de educador |
"Tinha um aluno, Tiago, que
tinha muitas dificuldades na escola, por conta de problemas com a família:
drogas, violência doméstica, problemas financeiros. Nós éramos próximos e os
professores me colocaram para ajudá-lo. Comecei a pegar um amor em fazer algo
pelo próximo, a entender a importância de estudar e o sentido de estar em sala
de aula."
A experiência como monitor do amigo
desde a 6ª série até o Ensino Médio é o que Wemerson considera seu primeiro
triunfo na educação e sua inspiração para fazer com que outros jovens queiram seguir
a profissão.
A história dos dois é mencionada
diversas vezes na conversa com a reportagem e foi relatada pelo professor na
inscrição para o Global Teacher Prize.
"As notas dele melhoraram, meu
comportamento melhorou. Ele também acabou virando professor, de Educação
Física, e está super feliz com a minha indicação para finalista do prêmio.
Ficou muito emocionado."
'Guerreiro'
O capixaba já sonha alto com o prêmio
de US$ 1 milhão, caso seja selecionado. A Fundação Nogueira, que ele pretende
criar, vai oferecer bolsas a alunos do Ensino Médio que queiram tornar-se
professores - um incentivo para uma carreira em que baixos salários e pouca
infraestrutura são citadas como motivos para não seguir.
Se ganhar o prêmio global, professor quer ensinar outros docentes a trabalhar o conteúdo das disciplinas por meio de projetos |
"Quero
investir com a orientação pedagógica de especialistas aos professores para
transformar a nossa educação. Eles vão orientar os professores sobre como
desenvolver projetos, como dar sentido à vida dos alunos dentro da escola.
Quero mostrar a eles que projetos dão certo. Desde 2012 eu só ensino assim e
tenho resultado muito positivo", afirma.
Nos planos está também um
laboratório de Ciências e Tecnologia em sua cidade natal, Nova Venécia, que
possa ser utilizado por professores de todas as escolas do município para aulas
práticas fora do ambiente escolar.
Com o dinheiro restante, Wemerson
quer investir na própria formação, e conhecer as experiências de outros países.
"Quero conhecer a educação precária, difícil e batalhadora em países da
África e também a educação avançada, da Finlândia."
Sua chegada aos 50 melhores do
mundo, diz ele, deveria ser exemplo para o país. "Eu me sinto um guerreiro
sendo professor. A educação está vivendo um momento muito difícil com a
aprovação dessa PEC (55, que determina que os gastos com políticas sociais, em
especial educação e saúde, sejam apenas corrigidos pela inflação do ano
anterior dentro dos próximos 20 anos, não recebendo aumento conforme previsto
na Constituição de 1988)."
"Os professores de escola
pública precisam de investimento dobrado e merecem uma boa estrutura. A educação
não pode ser paralisada para que futuramente venha a ter investimentos
melhores. O investimento precisa ser priorizado agora, nesse momento",
afirma.
"Quero poder dizer ao país:
'Olha, o Brasil tem professor de escola pública que acredita na educação e quer
inovar'."
Experiência de sair da sala de aula e conhecer famílias afetadas pelo rompimento da barragem em Mariana foi transformadora, diz professor |
Por
Camilla Costa, da BBC Brasil
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