sábado, 8 de julho de 2023

Imoralidade ‘dentro da lei’

 


O Estadão revelou um escândalo. O Tribunal de Justiça de Goiás (TJ-GO) proporciona a seus juízes os maiores salários do País, com valores que ultrapassam em muito o teto constitucional.

Por força de penduricalhos e regras específicas, os 450 magistrados do TJ-GO têm remuneração média líquida de R$ 78,5 mil. Segundo levantamento do jornal, trata-se da maior média de todos os 84 tribunais que já apresentaram dados ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) neste ano.

No entanto, escândalo ainda maior foi a resposta do TJ-GO ao Estadão. Em nota, o tribunal disse que “cumpre rigorosamente a lei”, sempre observando “a normatização vigente para o pagamento de seus magistrados, servidores e colaboradores”. Ou seja, a obtenção de toda a mamata – por exemplo, em maio deste ano, quase 200 juízes goianos receberam mais de R$ 100 mil – não foi fruto de uma manobra oculta, operada longe dos olhos do público. O descaramento foi de tal ordem que usaram a própria lei para incluir privilégios.

Uma das regalias foi aprovada em março deste ano. A pedido do presidente do TJ-GO, Carlos Alberto França, a Assembleia Legislativa do Estado de Goiás (Alego) aprovou um projeto de lei que transforma gratificações de cargos e funções comissionadas em verbas indenizatórias, permitindo que os valores sejam pagos acima do teto remuneratório e estejam livres de Imposto de Renda. A lei foi sancionada pelo governador Ronaldo Caiado.


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Os resultados da nova legislação são visíveis. Em maio do ano passado, por força do teto constitucional, foram retidos R$ 458,8 mil. Neste ano, já com a nova lei vigente, foram retidos com base na regra do abate-teto apenas R$ 61 mil da folha salarial de todos os magistrados. Ou seja, o TJ-GO conseguiu burlar escancaradamente a regra constitucional.

Segundo a Constituição de 1988, o valor do salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) – atualmente em R$ 41.650,92 – deve servir como um teto para a remuneração de toda a administração pública. Nenhum servidor pode ganhar mais que um ministro do STF. A regra constitucional não deixa margens a dúvida. Não poderão exceder o subsídio mensal dos ministros do Supremo “os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza”, diz o art. 37, inciso XI. No entanto, a lei de Goiás criou um atalho, dizendo que os valores adicionais não são remuneratórios, mas indenizatórios. Trata-se de um acinte com a moralidade e com a Constituição.

A Procuradoria-Geral da República (PGR) ajuizou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo contra as regras do TJ-GO. Cabe ao STF, de forma célere e efetiva, acabar com essa indecência em Goiás. Uma lei imoral e inconstitucional não pode continuar vigente. E o mesmo deve ser aplicado em todo o País. O caso em Goiás não é o único. Muitos juízes e procuradores recebem acima do teto, por força de penduricalhos pretensamente “indenizatórios” que são escandalosamente remuneratórios.

O Estadão


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