Estudo por 148 cientistas conclui que maior parte das árvores a serem descobertas está na América do Sul, especialmente na Amazônia e no sopé das Cordilheiras dos Andes. Desconhecimento torna espécies mais vulneráveis.
Das mais de 73 mil
espécies de árvores que habitam o planeta, mais de 9 mil ainda são
desconhecidas. Esse novo número é consideravelmente maior do que o relatado até
então, exatamente 14,2% superior ao que a ciência localizou e descreveu até
agora.
As novas estimativas foram
publicadas nesta segunda-feira (31/01) na revista científica Proceedings of the
National Academy of Sciences (PNAS). "É um resultado que surpreendeu a
equipe, já que, quando começamos esse trabalho, não sabíamos exatamente o total
que encontraríamos", afirma à DW Peter Reich, da Universidade de Michigan,
primeiro autor do estudo que reuniu 148 pesquisadores de diferentes
continentes.
A maior parte desse
universo a ser ainda explorado está na América do Sul. "São árvores que
estão localizadas em hotspots de diversidade da Bacia Amazônica e na interface
Andes-Amazônia, no sopé das cordilheiras", detalha Reich. Só nessa parte
do mundo, podem existir cerca de 3.900 espécies a serem descobertas, de um
total de 31.100 estimadas.
"Seria preciso muito
trabalho para desvendar quais são. Teríamos que priorizar ir até esses lugares
pra responder isso", comenta Reich sobre os desafios logísticos e
financeiros para custear as expedições. Porém "mais importante do que
saber e dar nome a essas espécies, é protegê-las".
Espécies
raras e vulneráveis
Parte considerável dessa
riqueza planetária a ser detalhada são árvores raras, particulares de uma
determinada região (endêmicas), tropicais ou subtropicais. Essas
características as tornam mais vulneráveis ao risco de extinção.
"A contribuição de
espécies raras para os serviços ecossistêmicos pode ser relevante e é tema de
pesquisa, mas é desafiador, pois a maioria permanece mal documentada. Portanto,
estimar o número de espécies de árvores é essencial para informar, otimizar e
priorizar os esforços de conservação florestal em todo o mundo", afirmam
os cientistas.
É na América do Sul que
está o maior número de espécies raras e endêmicas (49%), enquanto a Eurásia e a
África respondem juntas por quase outros 32% das espécies únicas no mundo.
Segundo os autores, o
estudo mostra que a conservação florestal deveria ter prioridade absoluta na
América do Sul, especialmente quando se considera o ritmo de destruição das
florestas por desmatamento, incêndios e mudanças climáticas.
Garimpo
ilegal na Amazônia
O mesmo esforço deveria
ser empregado também em vegetações de outros continentes, acrescentam os
autores, segundo os quais "provavelmente há um alto número de espécies não
descobertas na América Central e no Sudeste Asiático".
Em todos os países da
Amazônia, mais de 860 mil hectares de floresta nativa foram perdidos em 2021,
conforme apontou o relatório publicado pelo Projeto de
Monitoramento da Amazônia Andina (MAAP). A maior parte foi em território
brasileiro (79%), seguido por Peru (7%) e Colômbia (6%).
No Brasil,
especificamente, o sistema de monitoramento via satélite do Instituto Nacional
de Pesquisas Espaciais (Inpe) registrou o desmatamento de 13,2 mil quilômetros
quadrados entre agosto de 2020 e julho de 2021. A taxa é 22% superior à apurada
no período anterior.
Bancos
de dados internacionais
Para chegar a essa nova
estimativa, os pesquisadores se apoiaram em dois grandes bancos de dados, o
Global Forest Biodiversity Initiative e o TreeChange. O primeiro conta com uma
plataforma que reúne informações coletadas em mais de 70 países, cobrindo 1,2
milhão de parcelas permanentes de florestas. Já o segundo, reúne dados sobre 65
mil espécies documentadas.
Dentre os colaboradores em
todo mundo, estão pesquisadores brasileiros da Universidade Federal do Acre,
Universidade Federal do Sudoeste do Bahia, Universidade Federal do Rio Grande
do Norte, Universidade Regional de Blumenau e Universidade de São Paulo.
"Nós compartilhamos
dados e ideias de como usar e interpretar as informações disponíveis. Foi um
trabalho todo feito durante a pandemia, pode ser um exemplo de como
pesquisadores de todo o mundo podem colaborar num grande estudo", diz
Reich sobre a parceria.
Futuro
em xeque
Segundo o estudo, conhecer
a extensão da diversidade das árvores é fundamental para o futuro da
humanidade. "Pode nos ajudar a inferir os mecanismos evolucionários que
geraram a diversidade, para que possamos prever como esses mesmos mecanismos
podem funcionar no futuro", argumentam os autores. "Pode também
auxiliar na avaliação de quais sistemas podem ser mais resilientes às mudanças
globais."
Como muitas dessas
espécies ainda não identificadas são raras e, portanto, mais vulneráveis, compreender
mais a fundo os números seria crucial para traçar estratégias de preservação de
toda essa biodiversidade.
"A natureza é
incrível, e a ciência está tentando aprender, responder perguntas para entender
quais são as espécies que convivem conosco. Há muitas que são mais ameaçadas do
que pensávamos. Esse é um alerta que lançamos também", destaca o ecólogo
Reich a que considera a principal mensagem do estudo.
Nádia Pontes, DW (com adaptações)
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